Jornal Estado de Minas

Conheça as histórias das montanhas de Minas e saiba como elas moldaram a identidade dos mineiros

Escarpas e montes precisaram ser domados para erguer casas e igrejas. Nas encostas longínquas, a escavação de minas de ouro, diamantes e ferro exigiu o plantio e o pastoreio nos vales do sertão. Para viajar por essas terras, abriram-se trilhas em serras tão elevadas que receberam a denominação de alterosas. Um dos territórios brasileiros mais acidentados e inóspitos, Minas Gerais nasceu como destino de aventureiros buscando riquezas minerais. Se por um lado essas cadeias intrincadas de serras e morros impuseram extrema dificuldade de circulação, por outro, foram responsáveis por preservar a arte, a culinária, a arquitetura e os modos do povo que floresceu no seio das íngremes formações.

E é do alto, da perspectiva delineada pelos picos, vales e cordilheiras, que o Estado de Minas remonta a saga dos mineiros pela série “Montanhas de Histórias”. A cada mês, como parte das comemorações dos 90 anos de fundação do EM, a identidade do estado será retratada a partir de suas montanhas e do povo que as escolheu como lar.

Minas é um estado facetado pelas cadeias montanhosas. Basta destacar aquela que é considerada a sua espinha dorsal.
Senhora das maiores jazidas produtoras de minério de ferro do Brasil, a Serra do Espinhaço é a única cordilheira brasileira e assim foi denominada por lembrar uma colossal coluna vertebral. Barreira que impediu a entrada dos europeus por mais de 100 anos, a Serra da Mantiqueira, segundo a tradução do tupi para o português, significa “serra que chora água”. Uma referência aos mananciais que desses altos fluem, como o Rio Paraíba do Sul, responsável por abastecer o Rio de Janeiro e áreas de São Paulo, e também o Rio Grande, detentor do maior complexo de barramentos geradores de eletricidade do país.

As montanhas tiveram importância fundamental na preservação da cultura mineira, segundo o professor Alex Bohrer, do IFMG - Foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press

Berçário de nascentes

Logo no batismo a Serra do Caparaó foi marcada como um centro de batalhas, seu nome sendo traduzido do tupi como “cabana de folhas grandes” por causa das habitações dos índios botocudos bravios que ali resistiram por séculos. Foi palco também da Guerra do Contestado (Minas Gerais contra o Espírito Santo, entre 1912 e 1916) e da Guerrilha do Caparaó (1966 a 1967). Ali está a mais alta montanha do Sudeste brasileiro e o terceiro ponto culminante do país, o Pico da Bandeira (2.891 metros). Como um baú, a Serra da Canastra guarda as nascentes que se fundem no rio da integração nacional, o São Francisco, um leito de prosperidade e cultura próprias, que de Minas leva alento ao Nordeste.



“Já no século 18, Minas Gerais era conhecido como o estado montanhês”, diz o professor de História da Arte e Iconografia do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG), Alex Bohrer. “As montanhas são parte essencial de Minas.
Porque eram onde estavam o ouro e os diamantes. Sem essas jazidas, não existiriam cidades como Diamantina, Mariana, Ouro Preto, São João Del-Rei ou Serro. As montanhas foram, ainda, responsáveis pelo isolamento dos mineiros. Isso se traduziu numa cultura muito própria e rica, ainda hoje presente em nossas tradições”, considera Bohrer.



As formações montanhosas de Minas Gerais são muito antigas em termos geológicos, com centenas de milhões de anos. “As montanhas e serras que vemos hoje estavam aprofundadas e foram expostas após milhões de anos de ação erosiva do meio ambiente”, afirma o geólogo e diretor do Museu de História Natural da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Antônio Gilberto Costa. “Uma das características de Minas Gerais é o considerável número de serras. É o estado mais montanhoso do Brasil”, define o professor.

As montanhas, de certa forma, isolaram Minas Gerais, preservando a sua cultura. “Isso é muito nítido, por exemplo, na linguagem mineira.
Temos muitas evidências de que o português de Portugal, no século 18, era muito mais semelhante ao que se fala em regiões rurais de Minas, hoje, do que aquele que se fala em Portugal atualmente”, aponta o professor do IFMG, Alex Bohrer.
 

Reflexos no comportamento

Características conservadas e que ainda são visíveis nos hábitos do estado. “No interior de Minas é tradicional a formação de grandes quintais onde se planta couve. A couve é uma hortaliça de consciência sobrevivente, que os portugueses cultivavam para combater grandes crises e fomes. Você retira as folhas para o consumo e não mata o pé. E isso proliferou na culinária mineira. O mesmo se agregou aos pratos a base de carne suína. Porcos também são animais de lida fácil em áreas de sobrevivência difícil, pois eram criados soltos nas ruas da região das minas. Por isso, ainda se observam portinholas na porta das casas antigas, que eram feitas para que os porcos não entrassem nas residências”, conta Bohrer.

“A arquitetura do estado, as formas construtivas, as artes: tudo se moldou ao relevo desafiador das montanhas. Boa parte disso se deve à chegada de imigrantes vindos da região portuguesa do Rio Minho. Eram acostumados aos rigores de um território montanhês e se sentiram em casa aqui em Minas Gerais”, afirma Bohrer.
(A LOJA ROTA PERDIDA/ROTA EXTREMA - www.rotaperdida.com.br - forneceu parte dos equipamentos usados nas expedições)

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