Jornal Estado de Minas

Morre professor emérito da UFMG, Edson Durão Júdice

“Meus amigos, vocês não vibram com isso?”, dizia ele depois de demonstrar o teorema à plateia vidrada. Após solucionar as equações em terceiro grau, ele sorria: “Como podem ver é de uma simplicidade franciscana”. Com paixão, ministrava as aulas. “Tive alunos fantásticos. Nunca tive discussão com nenhum que pudesse deixá-lo magoado ou sentido. Colecionei amigos”, costumava dizer. No ensino da matemática, alcançava a felicidade, uma das dimensões espirituais que, por paradoxal que seja, brincava: “Esta não se mede em números”. Não à toa, bordava a arte de ensinar em livros, destinados a facilitar a vida dos estudantes.

Assim escreveu Elementos de geometria analítica (1971), Elementos de álgebra vetorial (1976) e O teorema de Sard e suas aplicações (2011).

Este foi Edson Durão Júdice, professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), professor da PUC Minas, um homem que por 65 anos dedicou a vida ao ensino. Faleceu aos 92 anos, no domingo. “Ser professor é pura vocação, tem que juntar gosto e dedicação, adquirir conhecimento e transmiti-lo. O mais importante, no entanto, é saber estimular a turma, fazer o aluno vibrar com o assunto. Se não for assim, o aprendizado se torna impossível”, declarou em dezembro de 2014 ao Estado de Minas, após ser homenageado com o título de Engenheiro do Ano 2014 e a Medalha Sociedade Mineira de Engenheiros (SME).

“Ele foi o maior professor de engenharia do estado, fundamental na formação dos engenheiros mais eminentes de Minas Gerais”, afirmou o diretor-presidente do Estado de Minas, Álvaro Teixeira da Costa.

Na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) onde se graduou em engenharia civil e ministrou aulas por 39 anos – entre 1948 e 1987 – o sentimento é de pesar. “Ele foi extremamente dedicado, generoso e íntegro. A ele devemos a estruturação do Instituto de Ciências Exatas (ICEx), declara a professora do Departamento de Matemática da UFMG Maria Cristina Costa Ferreira, pesquisadora no campo da formação de professores de matemática e desenvolvendo, atualmente trabalhando sobre “Memórias do Departamento de Matemática”.
Edson Durão Júdice foi o primeiro chefe de departamento do ICEx. “Estamos hoje fazendo 50 anos da reforma universitária, que criou todos os institutos, inclusive o ICEx. O professor Edson era catedrático da Escola de Engenharia e foi convidado. Estruturou todo o departamento, fez os primeiros contatos para a implantação do mestrado e para a formação dos professores em nível de pós-graduação”, afirma Maria Cristina.

Edson Durão Júdice graduou-se em engenharia civil pela UFMG em 1948 e especializou-se em matemática no Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), no Rio de Janeiro, em 1953. Dois anos mais tarde, concluiu estudos de doutoramento em economia na UFMG; tornou-se doutor em matemática também pela UFMG. Ingressou no quadro docente da universidade em 1949. Ministrou aulas nos cursos de arquitetura, economia, engenharia civil e administração e no Programa de Pós-graduação em Economia do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional de Minas Gerais (Cedeplar). Também foi professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), onde lecionou entre 1968 e 2013, nos cursos de administração, engenharia e arquitetura e urbanismo.
Na PUC, também coordenou o curso de engenharia civil e foi diretor do Instituto Politécnico. Entrou pela última vez em sala de aula aos 88 anos.

Nascido à Rua Tupinambás, a um quarteirão da Praça Sete, esse belo-horizontino foi casado por 63 anos com a professora de português Maria Helena, pai de cinco filhas e avô. Fez dos números não apenas a disciplina em sala de aula, mas também muitas das brincadeiras com que declarava o seu afeto à esposa e à família. “Amo-te”, foi a mensagem que certa vez ofereceu à esposa, por meio de sucessivas equações. “Matemática não é difícil, mas exigente. Trata-se de matéria sequencial, tudo está encadeado, é método dedutivo. Não se pode saber o conteúdo de um ano letivo se não tiver aprendido o do ano anterior”, explicava.

Profissionais liberais que passaram por sua sala, tristes com a perda, se manifestaram nas redes sociais. “Grande perda! Professor Edson Durão Judice, um dos meus gurus em minha formação profissional. Descanse em paz”, registrou Castro Júnior, graduado em Administração e Engenharia Metalúrgica na UFMG. “Gratidão por ter tido a oportunidade de aprender um pouco com ele.
Pessoa linda, sábia, humilde, elegante e gentil. Uma vez o encontrei com sua esposa e elogiei a beleza de vê-los juntos. Casal ternura. E eu o chamava de Nelson Gonçalves quando o encontrava nos ensaios do coral da PUC. Descanse em paz”, escreveu a arquiteta e urbanista Lúcia Karine Almeida, professora da PUC. “Morreu um dos maiores matemáticos da UFMG.  Fica aqui a minha gratidão pelo grande mestre que lotava a sala de aula como num show, que falava com intimidade da geometria não euclidiana. Que o infinito te acolha, você foi grande!”, assinalou a professora Laudieme Horta Nassif..