Com oito ataques a bancos e caixas eletrônicos em seis dias no estado, o medo não dá trégua à população mineira. Moradores de mais duas cidades se tornaram reféns de assaltantes que mais uma vez agiram com extrema violência, usando inclusive em um dos casos uma metralhadora .50, arma capaz de derrubar aeronaves e furar a blindagem de carros-fortes. Diferentemente do que ocorre na maior parte das ações de quadrilhas especializadas, a madrugada de ontem não veio com ataques apenas em cidades pequenas, com baixos efetivos da Polícia Militar e pouca chance de resposta. Ao invadirem Passos, no Sul de Minas, ladrões desafiaram a resistência de uma cidade com mais de 100 mil habitantes, que inclusive é sede de um batalhão da PM e por isso tem uma tropa maior para agir em situações desse tipo.
Além de Passos, ladrões atacaram um banco da cidade de Ipiaçu, no Triângulo Mineiro, que mesmo isolada por uma única rota de acesso terrestre não impôs barreiras no momento da fuga dos criminosos, que não chegaram a ser interceptados pelas forças de segurança. A Polícia Militar sustenta que de 1º de janeiro até ontem, incluindo os dois últimos casos, são 38 ocorrências desse tipo em Minas. A média é de dois assaltos a instituição financeira a cada cinco dias em 2018, índice que, embora alto, é menor que o do ano passado, quando ocorreram 50 roubos no mesmo período, de acordo com a PM. Este ano, oito ladrões foram presos e três, mortos em confrontos.
A primeira ocorrência da madrugada de ontem foi registrada em Passos, cidade às margens da MG-050, próximo à divisa com São Paulo. Informações da Polícia Civil dão conta da extrema sofisticação e poder de fogo do grupo, estimado em 20 assaltantes transportados em quatro caminhonetes. Os investigadores recolheram uma espécie de compressor de ar, que, segundo o delegado Marcos Pimenta, foi usado para sugar a fumaça gerada pelas explosões nas agências do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal e possibilitar ação mais rápida dos ladrões. Além disso, a polícia recolheu cápsulas de metralhadora calibre .50, arma normalmente usada em situação de guerra, e que a própria polícia é proibida de usar no Brasil, conforme o policial. Esse tipo de armamento tem capacidade para furar a blindagem de carros-fortes e até derrubar aeronaves.
Marcos Pimenta explica que no momento da ação dos criminosos, que ocorreu na Avenida Arouca, Centro da cidade, quatro policiais militares se aproximaram do local e dispararam contra os assaltantes, mas a desproporção de forças não possibilitou muitas opções. Eles teriam se deslocado até um prédio e, na companhia também de um delegado, continuaram atirando. “Nesse momento, eles atingiram um dos ladrões na perna. Ele foi socorrido pelos comparsas e colocado em uma das caminhonetes usadas pelo bando”, acrescenta o policial. Esse teria sido o motivo, segundo ele, para que uma grande quantia em dinheiro que tinha sido subtraída do Banco do Brasil ficasse para trás.
O planejamento da quadrilha também contou com a queima de um ônibus na saída para Belo Horizonte na MG-050 e de outro veículo na saída para São Paulo, para dificultar a reação das forças policiais. “É uma ação que choca a sociedade, mas nesse momento não tem muito o que fazer. Quando você está chegando para ver o que está acontecendo, os criminosos já estão esperando. Com a equipe pronta para o combate é uma coisa, mas mobilizando na hora não tem as mesmas condições”, afirma o policial. Marcos Pimenta disse que um homem, apontado como dono do ônibus que foi queimado, foi encontrado pela PM e levado para prestar depoimento.
Chegou-se a cogitar inclusive o uso de drones pelos criminosos na ação em Passos, mas a Polícia Civil não confirmou a informação. Pode ter havido confusão pelo fato de funcionários do Banco Santander terem feito um trabalho com esse tipo de equipamento na noite anterior, o que pode ter gerado boatos entre a população local.
IPIAÇU Cerca de quatro horas depois do ataque em Passos, um grupo menor, estimado em oito assaltantes, ocupando dois carros e uma moto, invadiu a cidade de Ipiaçu, município com cerca de 4 mil habitantes, no Triângulo Mineiro, e explodiram o único caixa eletrônico do Banco Bradesco. A única ligação terrestre possível conecta Ipiaçu com Capinópolis em 43 quilômetros de asfalto, pois os acessos para Santa Vitória (também no Triângulo) e Inaciolândia (GO) demandam o uso de balsas para transpor a represa no Rio Paranaíba.
Mesmo assim, quando os criminosos fugiram ainda não havia cerco montado nas imediações de Capinópolis. O coronel Cláudio Vítor Rodrigues Rocha, comandante da 9ª Região da PM, disse que houve um problema no acionamento do reforço via rede de rádio, o que pode ter dado tempo para os ladrões. A PM suspeita que os integrantes façam parte de uma quadrilha de Uberlândia e que tenham fugido para Goiás a partir da BR-153. A polícia trabalha também com a informação de que há pessoas das cidades de Capinópolis ou Ipiaçu envolvidas com a quadrilha.
Segundo o coronel Cláudio Rocha, entre 2016 e 2017 houve redução de 59% desse tipo de caso na 9ª Região da PM, com sede em Uberlândia e responsável por 18 municípios. “Foram sete ocorrências no ano passado e este ano é a segunda. Antes de Ipiaçu tivemos uma explosão em um caixa eletrônico da UFU, em Uberlândia, em que os bandidos não levaram nada”, afirma o oficial, que destacou o uso de um helicóptero para sobrevoar a região e fazer varredura em vários sítios próximos à cidade atacada. Até o fechamento desta edição, ninguém tinha sido preso.
REAÇÃO Em nota, a Polícia Civil informou que deslocou grande efetivo para atuar na ocorrência de Passos, que teve “crimes gravíssimos contra o patrimônio”. Há 120 policiais civis engajados no caso, sendo quatro aeronaves com agentes da Coordenação Aerotática e equipes do Departamento Estadual de Crimes contra o Patrimônio (Depatri) e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core). A corporação deslocou para a região delegados de sua cúpula, como o superintendente de Investigação e Polícia Judiciária, Carlos Capistrano, entre outros policiais.
“Foram apreendidos explosivos e demais materiais que estão sendo periciados. Os trabalhos de inteligência investigativa estão utilizando alta tecnologia para apuração e prisão dos envolvidos. Além disso, há envolvimento das demais forças de segurança e troca de informações para dar maior celeridade às investigações”, informou a corporação. A Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) destacou a redução de casos entre 2016 (237) e 2017 (162), que chega à casa dos 31%, como resultado de um trabalho integrado entre diferentes agências de segurança. “De forma integrada, as apurações da inteligência se transformam em operações repressivas e preventivas, com foco no interior do estado. Um exemplo disso é o cerco policial que está em andamento nos ataques registrados hoje (ontem)”, diz texto enviado pela pasta.