Buenópolis e Diamantina – A caverna esculpida pela erosão das águas na Serra da Tromba D'Anta, em Diamantina, não é conhecida por pesquisadores nem registrada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o guardião legal de formações com sítios arqueológicos. Quem conhece como poucos a Lapa dos Caboclos é o aposentado José Balbino Pereira, de 76 anos. Um senhor calmo, de olhos apertados atrás dos óculos e fala aos solavancos, típica dos caboclos dessas montanhas mineiras. Até a idade de 9 anos, morou no interior da cavidade natural com a família. Sempre admirou os desenhos riscados na pedra, feitos há cerca de 11 mil anos.
“Meu avô e meus tios moravam na caverna. Como os antigos eram caboclos, colocaram o nome de Lapa dos Caboclos. Pensavam que os desenhos foram feitos por índios e esse é um dos lugares que têm mais pinturas em Diamantina. E olhe que conheço bem a região”, garante o homem, que se orgulha de ter trabalhado na vasta área rural do município do Alto Jequitinhonha, onde percorreu muitos sítios arqueológicos. Ele se nega a levar “qualquer um” até a caverna, devido às depredações do passado e porque o terreno é de um parente.
No passado, as lapas eram encaradas de forma diferente. “Algumas pessoas moravam nelas. Outras pousavam quando montavam armadilhas ou caçavam”, lembra. O fascínio do caboclo pelas formações rochosas e suas pinturas rupestres foi incentivado, em parte, por ele ter nascido na região, ao longo da MG-220, que é a maior concentração de sítios arqueológicos de Diamantina. Num raio de um quilômetro em torno de sua atual residência, por exemplo, há 10 sítios de pinturas de várias tradições de homens pré-históricos registrados pelo Iphan. Há, numa área distante, até um sítio denominado Lapa do Caboclo, cuja localização, entretanto, não coincide com a moradia dos ancestrais de José Balbino.
Da residência do senhor José Balbino até a caverna são quatro quilômetros de estradas de chão, passando casarões de telhas antigas e barracões de pau a pique nas fazendas, córregos com pontes de madeira rústica, lagos e plantações de capim. Passada a última porteira, o aposentado desce do carro e procura seu parente numa área de pasto e depois num casarão comprido. Daquela baixada se avista de frente a formação rochosa que domina o horizonte, o Pico da Tromba D'Anta. É uma pedra cinza e pontiaguda, que pende inclinada a 1.360 metros de altitude.
A demora para o caboclo retornar dá a impressão de que a visita à lapa seria proibida. Mas o seu retorno, sorridente, após alguns minutos, mostrou que a permissão foi concedida. “Ô, gente, vocês desculpem. Meu primo está mexendo leite no tacho para fazer doce de leite. Se parar, queima tudo. Ele pediu para não reparar e para levar (a reportagem até) lá”, disse, cordial.
A caminhada é curta, passando por plantações rasteiras de feijão e ervas, depois seguindo o curso de um córrego, até que se abre a Lapa dos Caboclos. Uma formação natural de equilíbrio intrigante, já que a sua abertura de acesso toma quase toda a extensão horizontal da rocha, parecendo não haver pilares suficientes para sustentar o teto de pedras de oito metros de altura. De lá do alto, como se fossem cordas de montanhistas, as raízes finas de algumas plantas descem até o solo da trilha, onde se fixam.
A aproximação com a boca da caverna torna visíveis parte dos desenhos pré-históricos. São traços enfileirados que os arqueólogos supõem se tratar de contagens, provavelmente de tempo ou de animais abatidos pelos caçadores primitivos.
O primeiro salão é o mais amplo. Permite a entrada plena da luz do dia, destacando a tinta vermelha de milhares de anos usada em inscrições que retratam veados, tatus, pacas, aves e peixes. No teto, figuras humanas em posições que sugerem movimento indicam atividades como coreografias rituais que podem ter ocorrido sob aquela mesma laje. Boa parte do teto, no entanto, foi densamente recoberta por fuligem negra.
A fonte dessa destruição está nos fundos. Apoiado nos patamares rochosos, um fogão a lenha, de barro e tijolos de adobe e com mais de 100 anos, completamente recoberto por excrementos de morcegos. “Aqui era a cozinha”, aponta o aposentado José Balbino. Os olhos dele percorrem as outras três câmaras e parecem transportá-lo de volta ao tempo em que viveu ali com os caboclos da montanha pré-histórica. “O espaço maior era onde dormia meu avô e meus parentes. A gente ficava junto, em família. Ali, naquele menor, a gente fazia fogueiras e tocava violão a noite toda”, indicou.
A fuligem não é a única marca de destruição neste tesouro arqueológico. Riscos modernos de carvão com assinaturas de invasores e formações rochosas destruídas no interior das câmaras mostram a vulnerabilidade da Lapa dos Caboclos. “Antes, as pessoas moravam aqui e o fogo destruiu muita coisa. Depois teve gente vindo para acampar e fazer arruaça. Por isso não deixamos mais ninguém entrar, porque senão acaba”, disse José Balbino.
“Meu avô e meus tios moravam na caverna. Como os antigos eram caboclos, colocaram o nome de Lapa dos Caboclos. Pensavam que os desenhos foram feitos por índios e esse é um dos lugares que têm mais pinturas em Diamantina. E olhe que conheço bem a região”, garante o homem, que se orgulha de ter trabalhado na vasta área rural do município do Alto Jequitinhonha, onde percorreu muitos sítios arqueológicos. Ele se nega a levar “qualquer um” até a caverna, devido às depredações do passado e porque o terreno é de um parente.
No passado, as lapas eram encaradas de forma diferente. “Algumas pessoas moravam nelas. Outras pousavam quando montavam armadilhas ou caçavam”, lembra. O fascínio do caboclo pelas formações rochosas e suas pinturas rupestres foi incentivado, em parte, por ele ter nascido na região, ao longo da MG-220, que é a maior concentração de sítios arqueológicos de Diamantina. Num raio de um quilômetro em torno de sua atual residência, por exemplo, há 10 sítios de pinturas de várias tradições de homens pré-históricos registrados pelo Iphan. Há, numa área distante, até um sítio denominado Lapa do Caboclo, cuja localização, entretanto, não coincide com a moradia dos ancestrais de José Balbino.
Da residência do senhor José Balbino até a caverna são quatro quilômetros de estradas de chão, passando casarões de telhas antigas e barracões de pau a pique nas fazendas, córregos com pontes de madeira rústica, lagos e plantações de capim. Passada a última porteira, o aposentado desce do carro e procura seu parente numa área de pasto e depois num casarão comprido. Daquela baixada se avista de frente a formação rochosa que domina o horizonte, o Pico da Tromba D'Anta. É uma pedra cinza e pontiaguda, que pende inclinada a 1.360 metros de altitude.
A demora para o caboclo retornar dá a impressão de que a visita à lapa seria proibida. Mas o seu retorno, sorridente, após alguns minutos, mostrou que a permissão foi concedida. “Ô, gente, vocês desculpem. Meu primo está mexendo leite no tacho para fazer doce de leite. Se parar, queima tudo. Ele pediu para não reparar e para levar (a reportagem até) lá”, disse, cordial.
A caminhada é curta, passando por plantações rasteiras de feijão e ervas, depois seguindo o curso de um córrego, até que se abre a Lapa dos Caboclos. Uma formação natural de equilíbrio intrigante, já que a sua abertura de acesso toma quase toda a extensão horizontal da rocha, parecendo não haver pilares suficientes para sustentar o teto de pedras de oito metros de altura. De lá do alto, como se fossem cordas de montanhistas, as raízes finas de algumas plantas descem até o solo da trilha, onde se fixam.
A aproximação com a boca da caverna torna visíveis parte dos desenhos pré-históricos. São traços enfileirados que os arqueólogos supõem se tratar de contagens, provavelmente de tempo ou de animais abatidos pelos caçadores primitivos.
O primeiro salão é o mais amplo. Permite a entrada plena da luz do dia, destacando a tinta vermelha de milhares de anos usada em inscrições que retratam veados, tatus, pacas, aves e peixes. No teto, figuras humanas em posições que sugerem movimento indicam atividades como coreografias rituais que podem ter ocorrido sob aquela mesma laje. Boa parte do teto, no entanto, foi densamente recoberta por fuligem negra.
A fonte dessa destruição está nos fundos. Apoiado nos patamares rochosos, um fogão a lenha, de barro e tijolos de adobe e com mais de 100 anos, completamente recoberto por excrementos de morcegos. “Aqui era a cozinha”, aponta o aposentado José Balbino. Os olhos dele percorrem as outras três câmaras e parecem transportá-lo de volta ao tempo em que viveu ali com os caboclos da montanha pré-histórica. “O espaço maior era onde dormia meu avô e meus parentes. A gente ficava junto, em família. Ali, naquele menor, a gente fazia fogueiras e tocava violão a noite toda”, indicou.
A fuligem não é a única marca de destruição neste tesouro arqueológico. Riscos modernos de carvão com assinaturas de invasores e formações rochosas destruídas no interior das câmaras mostram a vulnerabilidade da Lapa dos Caboclos. “Antes, as pessoas moravam aqui e o fogo destruiu muita coisa. Depois teve gente vindo para acampar e fazer arruaça. Por isso não deixamos mais ninguém entrar, porque senão acaba”, disse José Balbino.
(A LOJA ROTA PERDIDA/ROTA EXTREMA – www.rotaperdida.com.br – forneceu parte dos equipamentos usados nas expedições)