Eletrodomésticos velhos e estragados, sofás rasgados, armários quebrados, restos de pneus, garrafas de plástico, latas de alumínio, pedaços de papelão, lixo doméstico e até hospitalar. Apesar de a descrição parecer um relato de um lixão, todos esses materiais são retirados diariamente de pelo menos quatro rodovias que cortam Minas Gerais e que estão concedidas à iniciativa privada no estado. De janeiro a março deste ano, as concessionárias que operam 1.784 quilômetros das BRs 262, 153, 040 e 050 retiraram mais de 150 toneladas de lixo das pistas de circulação de veículos e também de suas faixas de domínio, o que significa 84 quilos por quilômetro levando em consideração apenas os trechos dessas quatro estradas administrados pela iniciativa privada. É quase um quilo retirado por quilômetro por dia, o que revela, segundo as empresas, a falta de consciência da população e aumenta risco de acidentes.
A reportagem do Estado de Minas percorreu mais de 80 quilômetros nas BRs 262, em Betim e Juatuba, e 040, em Contagem e Ribeirão das Neves, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, e viu de perto o problema. O rastro de sujeira apresenta diferentes perfis e exige trabalho praticamente ininterrupto das concessionárias, sob pena de montanhas de lixo se multiplicarem rapidamente se o trabalho não for feito todos os dias. Por um lado, há o perfil do despejo pontual de lixo, já que muitos motoristas insistem em atirar das janelas dos carros objetos como garrafas de plástico, latas vazias, pedaços de papel, entre outros. Esse desrespeito exige uma dedicação grande por parte dos trabalhadores que vasculham cada palmo de terreno das faixas de domínio em busca dos resíduos.
Por outro lado, um segundo perfil desafia ainda mais as concessionárias, pois expõe na beira das rodovias e muitas vezes até no próprio asfalto o lixo doméstico descartado por moradores de áreas lindeiras às estradas. Essa situação é bem comum na BR-040 na região de Contagem, Ribeirão das Neves e Esmeraldas, na Grande BH, região bastante ocupada por moradias, onde já estão consolidados vários pontos de bota-fora clandestino.
Em um dos pontos flagrados logo após o Ceasa, uma poltrona foi abandonada ao lado do acostamento, em meio a outros resíduos deixados na beira da pista. Nesse caso, o trabalho exige estrutura maior para recolher o lixo, que muitas vezes se configura em montanhas na beira da pista. A reportagem também encontrou um sofá descartado na BR-262, em Juatuba, revirado em meio a mais lixo acumulado. Ao olhar atentamente as beiradas das estradas se multiplicam os objetos que normalmente são jogados pelos condutores. Inúmeras garrafas plásticas, latas, pacotes de plástico, pedaços de papelões e outros materiais ficam escondidos no meio do mato. Quando as equipes de manutenção passam fazendo a roçada, normalmente esse serviço também revela grande quantidade de lixo.
Por fim, um terceiro perfil do trabalho de limpeza das rodovias foca exclusivamente em ressolagens de pneus, que se soltam de caminhões e carros e acabam no meio da pista. O lixo recolhido nas estradas concedidas vai inicialmente para depósitos nos pontos de apoio ao usuário e depois segue para destinação final nos lugares mais apropriados. Tanto na BR-040 quanto na BR-262 o EM encontrou esses locais repletos de lixo, dando a dimensão do problema. Funcionários ouvidos pela reportagem também relatam sujeira provocada por caminhões carregados com resíduos diversos, que muitas vezes transitam nas BRs sem a cobertura adequada das carrocerias. Com isso, vários objetos caem na estrada e espalham o rastro de sujeira. Também é comum maior acúmulo de resíduos no entorno de pontos de ônibus.
PERDAS E DANOS A gerente de Meio Ambiente e Qualidade da Triunfo Concebra, concessionária responsável em Minas Gerais pelo trecho da BR-262 entre Betim e Campo Florido, no Triângulo Mineiro, e também pela BR-153 (entre as divisas com Goiás e São Paulo), Sinara Lopes Vilela, diz que é comum encontrar todo tipo de utensílios e eletrodomésticos, além de entulho da construção civil. “Na região de Araxá (Alto Paranaíba) até lixo hospitalar já foi depositado na nossa rodovia, o que gera perigo para nossos colaboradores”, afirma. Sinara Vilela ainda acredita que as deposições clandestinas de maiores quantidades são um problema que aumenta bastante o custo com a limpeza e demanda parcerias com as prefeituras para ser mitigado.
A gerente também chama a atenção para o lixo orgânico descartado na beira da pista ou atirado da janela dos carros no asfalto. “Esse lixo pode ser atrativo para a fauna do entorno, que corre o risco de ser atropelada e trazer um dano ainda maior. Também temos problemas com entupimento de drenagem, o que causa alagamentos e aquaplanagem. O descarte de lixo só traz prejuízo para todo mundo. Se as pessoas tivessem mais consciência, certamente caminharíamos bastante para resolver o problema”, afirma.
Além dos problemas já mencionados, o inspetor Aristides Júnior, que é chefe do Núcleo de Comunicação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) em Minas Gerais, destaca o risco de acidentes quando algum objeto é descartado como lixo de um veículo em movimento. “Se o objeto atirado atinge um motociclista ou o carro que vem logo atrás, o risco de acidentes é grande. A moto pode perder equilíbrio, o motorista do carro pode se assustar, virar o volante, frear bruscamente ou ter a sua visão prejudicada caso o objeto atinja o para-brisa, por exemplo”, afirma.
A concessionária Via-040, responsável pela BR-040 entre Juiz de Fora e Brasília, declarou que empenha esforços diários para a garantir a limpeza e a integridade das margens e canteiros centrais do trecho sob concessão em Minas Gerais. “Somente em 2017, foram recolhidos mais de 400 toneladas de resíduos, entre eles borracha, plástico, papel e material de construção civil. Os resíduos recicláveis, por exemplo papel e borracha, são encaminhados para cooperativas, enquanto os demais são destinados para aterros ambientalmente regularizados”, diz a nota. A empresa disse ainda que busca conscientizar a população e os motoristas sobre a proibição de descarte na área da rodovia. “Para isso instalou placas de sinalização com advertência ao longo do trecho, além de realizar reuniões com comunidades e poder público dos municípios ao longo da rodovia”, finaliza.
Já a MGO Rodovias, que é responsável pela operação da BR-050 em Minas, informou que os resíduos são recolhidos diariamente nas pistas e faixa de domínio da BR-050 por equipes responsáveis e levados para caçambas disponíveis nas 9 unidades operacionais e de atendimento ao usuário ao longo da rodovia. De lá, o lixo é destinado a aterros industriais devidamente licenciados para a destinação correta.
EM viu morte de animais
Em meio aos trabalhos de remoção de lixo nas rodovias concedidas do estado, funcionários das concessionárias também se deparam constantemente com animais mortos atropelados. Um cachorro foi encontrado nessas condições na sexta-feira na BR-040, no Bairro Califórnia, Noroeste de Belo Horizonte (foto). Após o recolhimento, o animal foi enterrado em um local ao lado da rodovia.
O que diz a lei
O artigo 172 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) considera infração média o ato de atirar do veículo ou abandonar na via objetos ou substâncias. Esse tipo de conduta é punida com a perda de quatro pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) além do pagamento de multa de R$ 130,16.