Depois de seis meses sem qualquer atividade de prevenção ou instrução à população que vive sob a área de ameaça da Barragem de Casa de Pedra, em Congonhas, na Região Central do estado, dois simulados de salvamento finalmente foram marcados, envolvendo a prefeitura local, a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec) e a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que opera o reservatório de rejeitos. Porém, enquanto ações de acionamento de alarmes e de procedimentos para evacuação em caso de desastre são acertados na cidade histórica, na Grande BH as atividades de três minas trazem grande preocupação para ambientalistas e vizinhos dos empreendimentos. Uma delas é a Mina de Corumi, sob a Serra do Curral, em BH. As demais se encontram na área de amortecimento do Parque Estadual da Serra do Rola-Moça, entre Nova Lima e Ibirité. No caso desta última, a população local promete presença em massa na próxima reunião do conselho consultivo da unidade de conservação, no dia 28, para alertar os conselheiros de que o retorno das atividades minerárias ameaça, sobretudo, nascentes da reserva ambiental que abastecem a Grande BH.
Já na Região Metropolitana de BH, a comunidade de Casa Branca, um distrito de Brumadinho, e ambientalistas se mobilizam para tentar barrar a reativação de atividades mineradoras em áreas de amortecimento da unidade de conservação. A antiga Mina de Casa Branca, da Mineração Geral do Brasil (MGB), no território de Nova Lima, e a Santa Paulina, em Ibirité, estão desativadas desde a década de 2000, mas há planos para que voltem a operar. De acordo com o gerente da MGB, Geraldo Magalhães, o plano da companhia é descomissionar (desativar definitivamente) duas barragens e tampar suas cavas. Porém, para isso seria preciso, segundo a empresa, remover material de novos pontos. “O minério encontrado nesse material removido será vendido, em um processo que deve durar de seis a sete anos. O movimento será mínimo, pois estamos querendo usar uma estrada dentro do terreno da (mineradora) Vale”, disse.
LICENCIAMENTO Segundo a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad), a MGB tem em análise um pedido de licença prévia para a retomada da mina. “O projeto de retomada consiste na extração de minério de ferro de duas antigas frentes de lavra do empreendimento, bem como o descomissionamento de duas antigas barragens de rejeitos”, informou o órgão ambiental. A análise encontra-se em fase inicial para elaboração de parecer técnico. “Dentro da análise do processo de licenciamento serão necessárias anuências do Ibama, em função da supressão de vegetação nativa de campo rupestre, bem como dos órgãos gestores das unidades de conservação Parque Estadual da Serra do Rola-Moca e Apa (área de proteção ambiental) Sul”, afirma a Semad.
Ambientalistas não confiam na intenção da mineradora e dizem que há formas de menor impacto para desativar a mina. “Outros passivos ambientais que essa mesma mineradora prometeu equacionar foram ampliados. Há outras soluções de engenharia para fechar a mina, e isso é uma obrigação da empresa. Minerar no parque pode comprometer a segurança hídrica dessa região, que tem nascentes que abastecem a Grande BH. Isso porque, quando se aprofundam as cavas, se rebaixa o lençol, com secamento dessas minas”, afirma Maira Nascimento, do Movimento Águas e Serras de Casa Branca.
A Mineração Santa Paulina, em Ibirité, também quer voltar a operar na área de amortecimento do parque, mas ninguém que a represente foi localizado para falar sobre o assunto. Segundo a Semad, a empresa obteve liminar na Justiça que permitiu o retorno das operações minerárias que estavam suspensas desde a década de 1990. Foi então assinado um termo de ajustamento de conduta (TAC) entre estado e empresa, para assegurar que “a operação ocorra considerando os padrões ambientais corretos”, segundo informou a Semad. “A empresa solicitou uma Licença de Operação Corretiva (LOC) à secretaria e o processo está em análise técnica. Assim que concluído, será levado para votação no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam)”, acrescentou a secretaria.
O histórico da Casa de Pedra
» Novembro de 2013
CSN e Ministério Público assinam termo de ajustamento de conduta após problemas serem detectados na obra de alteamento da Barragem
» Novembro de 2016
Infiltrações são detectadas em parte da represa voltada para três bairros de Congonhas onde vivem 4.800 pessoas
» 17 de maio de 2017
Portaria do DNPM estabelece a necessidade de um plano de segurança para empreendimentos como Casa de Pedra
» Outubro de 2017
Em fiscalização da Feam foram detectadas infiltrações no corpo da barragem do Dique de Sela. Semad e DNPM são informados
» 14 de outubro de 2017
Ministério Público do Trabalho determina paralisação das atividades da Mina Casa de Pedra por entender que não há garantias de segurança para os trabalhadores
» 9 de novembro de 2017
O Estado de Minas obtém documentos que comprovam que governo estadual não quer esperar que a CSN implante seu plano de emergência e cria força-tarefa para traçar um plano próprio de evacuação em caso de rompimento do Dique de Sela
» 26 de novembro de 2017
CSN e Defesa Civil de Congonhas anunciam simulado do plano de segurança de barragens, mas tudo praticamente se reduz ao teste público de duas sirenes. Uma delas falhou. Placas para rotas de fuga são instaladas e locais de encontro são demarcados
» 30 de novembro de 2017
CSN protocola laudo de segurança da barragem de Casa de Pedra no Ministério Público, garantindo que estruturas questionadas superaram o fator de segurança mínimo
» 13 de abril de 2018
Enfim, laudo do MP atesta estabilidade da barragem e sustenta que procedimentos de emergência avançaram, mas prefeitura, moradores do entorno e ambientalistas cobram treinamento de evacuação
Cava na Serra do Curral preocupa
A mineração não afeta apenas cidades da Grande BH, mas se aproxima até mesmo das montanhas que deram nome à capital. Na direção do Pico Belo Horizonte, um dos marcos do relevo panorâmico da cidade, com 1.390 metros, o solo montanhoso vai sendo continuamente rompido para a abertura de cavas de extração de minério de ferro que chegam a ter mais de 40 metros de profundidade. Essas marcas entre a Serra do Curral, a Serra do Taquaril e a Mata da Baleia deixaram estarrecidos vereadores da Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana da Câmara Municipal, que vistoriaram a Mina de Corumi, da empresa Pau Branco (Empabra), há uma semana. Os trabalhos da mineradora estão amparados por um termo de ajustamento de conduta firmado entre a empresa, o Ministério Público e a Semad. Ainda assim, o impacto ambiental que o grupo parlamentar testemunhou em sua vistoria foi considerado tão impressionante que uma audiência pública será agendada para tentar frear as atividades.
“Encontramos um quadro de calamidade. Uma situação gravíssima. Temos informações de que essa mineração não tem autorização para minerar. Deveria recuperar a área degradada para gerar um condomínio mas, em vez disso, abriu novas frentes de mineração e uma cava excepcionalmente grande, de 40 a 50 metros de profundidade, na soleira da Serra do Curral”, descreveu o vereador Gilson Reis (PcdoB), integrante da comissão e que requisitou a vistoria. “Nosso receio é de que a montanha mais próxima, o Pico Belo Horizonte, possa até desmoronar. Nós denunciamos a situação e vamos programar uma audiência pública. Vamos reunir todos os responsáveis, com o objetivo de suspender imediatamente a exploração minerária porque ali é um patrimônio. É a mesma coisa de alguém querer escavar o Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro”, compara.
A empresa se defende, e informa que seus trabalhos seguem o que foi estabelecido pelo acordo com o MP e o estado. “A atividade de mineração nesse local ocorre desde 1959, tendo sido paralisada em 1991. A Empabra retomou as atividades em 2008, implantando o Plano de Recuperação da Área Degradada em áreas adjacentes e, desde 2015, procede a regularização ambiental de atividade minerária”, informou, por meio de nota. Ainda segundo a empresa, o termo de ajuste de conduta permite a atividade de lavra limitada, bem como, a comercialização de 1,5 milhão de toneladas de minério de ferro por ano. “A Empabra cumpre regularmente todas as condicionantes ambientais, bem como adota todas as medidas de controle ambiental para evitar, mitigar, controlar e compensar os impactos inerentes à atividade minerária”, acrescenta a companhia.
De acordo com a Semad, a “Empresa de Mineração Pau Branco foi licenciada pela Prefeitura de BH e Semad, por orientação do Ministério Público”. Em 19 de outubro de 2015 a empresa protocolou pedido para Licença de Operação Corretiva junto à secretaria estadual. Naquele mesmo ano, a empresa assinou junto ao MP e à Semad o termo de ajustamento de conduta que a permite operar enquanto o pedido é analisado.
O acordo também exige obrigações do empreendedor para que não ocorra degradação ambiental. “Atualmente, a empresa se encontra regularizada, tendo em vista que o TAC foi renovado em 14 de dezembro de 2017, por mais um ano. Com relação ao tombamento da Serra do Curral, importante observar que se trata de mina antiga, anterior ao tombamento. À época do licenciamento no município, o empreendimento obteve as anuências do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha/MG)”, informa a Semad.