Foram dois dias de revolta e queixas entre os passageiros do metrô de Belo Horizonte, indignados com o fato de a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU-BH) manter a cobrança da passagem em R$ 3,40, apesar de decisão judicial que suspendeu o aumento. Ontem, depois que quase R$ 600 mil deixaram os bolsos de usuários do transporte e foram para os cofres da empresa devido ao reajuste de 88,9%, barrado por liminar na sexta-feira, o preço finalmente voltou a R$ 1,80. A justificativa para a demora foi o atraso na notificação sobre o despacho do juiz. A empresa ainda não informou se pretende recorrer.
Também por meio de nota, a Subsecretaria de Regulação de Transportes, ligada à Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas (Setop), sustentou ter sido informada oficialmente da suspensão na manhã de ontem pela CBTU. Diante disso, solicitou a mudança nos valores que têm impacto sobre usuários que usam o cartão Ótimo na integração do ônibus com o trem metropolitano. “A subsecretaria já comunicou as empresas para adotarem providências necessárias para o retorno do valor da tarifa integrada de R$ 1,53”, informou o texto. Ressaltou, ainda, que o ajuste de valores para adequação da tarifa não é automático e precisa ser feito ônibus a ônibus.
De sexta-feira até domingo, usuários que tiveram que desembolsar R$ 3,40 nas viagens, apesar da decisão liminar suspendendo o aumento, somaram aproximadamente 370 mil pessoas nas estações da capital e de Contagem, na Grande BH. O aumento de 88,9% na tarifa entrou em vigor na sexta-feira. No mesmo dia, porém, o juiz Mauro Pena Rocha, da 4ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte, concedeu a liminar suspendendo o reajuste.
A decisão foi tomada em ação popular proposta pelo deputado Fábio Ramalho (MDB/MG). No pedido, o autor sustenta que o aumento é ilegal e não observa a parte mais vulnerável da relação, o consumidor, que suportará o desembolso de quase o dobro do valor diário da passagem. O pedido aponta ainda ilegalidade no ato, uma vez que a legislação “não autoriza o somatório de inflações reprimidas e o consequente repasse ao consumidor”.
No texto da liminar, o juiz Mauro Rocha estipula multa de R$ 250 mil por dia em caso de descumprimento. “A moralidade administrativa é um dos princípios que devem ser observados pela administração, e, numa primeira análise, repassar de uma única vez ao consumidor reajuste acumulado nos últimos 12 anos se mostra desarrazoado e não condizente com o princípio da moralidade administrativa”, escreveu o magistrado, referindo-se ao prazo em que a tarifa do serviço não foi recomposta.
Mesmo com a decisão, o valor reajustado continuou a ser cobrado até o meio da manhã de ontem, quando a CBTU informou ter sido oficialmente notificada pela Justiça sobre a liminar. Os valores nas bilheterias foram alterados, o que garantiu alívio para parte dos usuários. Ao voltar para casa, às 17h, o cobrador Pedro Henrique de Oliveira respirava mais tranquilo. Na fila para comprar o bilhete, ele disse que, se fosse mantida a tarifa de R$ 3,40, teria que gastar mais R$ 6, incluindo ônibus e metrô. “Vi agora na internet que o preço voltou a ser R$ 1,80. Já é uma ajuda boa, né?”, afirmou o morador do Bairro Tupi, na Região Norte de Belo Horizonte.
PRESSÃO POLÍTICA Antes de a briga chegar à Justiça, na quarta-feira deputados federais mineiros tentaram uma saída negociada com o governo federal, para o escalonamento da recomposição da tarifa em quatro anos, com elevação somente no segundo semestre de 2018. Sem sinalização do Planalto, o deputado Fábio Ramalho optou por ingressar com a ação popular, além de propor que a bancada mineira no Congresso passasse a obstruir votações de interesse do Executivo até que houvesse recuo sobre a decisão de aumento de quase 90% da passagem do trem metropolitano da capital.
Em outra movimentação política, a bancada do PSOL na Câmara dos Deputados protocolou projeto de decreto legislativo contra o aumento das passagens do metrô, não só em Belo Horizonte, mas também em Recife, Maceió, João Pessoa e Natal, capitais onde a CBTU opera o serviço de transporte sobre trilhos. O PDC 928/2018, assinado pelo líder Chico Alencar (PSOL/RJ), suspende os aumentos tarifários, mas a proposição depende de aprovação no Plenário da Câmara, depois de passar em comissões. Em nota, a bancada do partido se posicionou contra o aumento e considerou a medida abusiva.
Como mostrou o Estado de Minas em sua edição de sábado, a principal afetada pelo possível reajuste de 88,9%, o maior da história do transporte coletivo de BH, seria a população mais pobre. Dados da pesquisa Origem e Destino de 2012, principal ferramenta para medir a mobilidade urbana na Grande BH, compilados pelo economista André Veloso, integrante do movimento Tarifa Zero, indicam que 74% das pessoas que usam o metrô recebem até dois salários-mínimos.
Uma novela sobre trilhos
Confira o dia a dia do tarifaço no metrô de BH
» 7 de maio
A Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) anuncia aumento das passagens do metrô de BH, de R$ 1,80 para R$ 3,40 (88,9%). Também houve reajuste nos metrôs de Recife, João Pessoa e Maceió. A empresa alega que na capital mineira os preços estavam congelados havia 12 anos. O Estado de Minas mostra que é o maior tarifaço já praticado no transporte público da cidade
» 9 de maio
Deputado federal Fábio Ramalho (MDB-MG) afirma que o presidente Michel Temer aceitou o escalonamento do aumento, efetivando neste ano apenas 30% de recomposição
» 10 de maio
Aumento da tarifa, previsto para o dia 11, faz com que a BHTrans reforce as linhas do BRT/Move. CBTU limita a venda de passagens a 10 unidades por consumidor, para que passageiros não façam reservas de bilhetes mais baratos
» 11 de maio
Promessa de escalonamento do aumento não se concretiza e o metrô passa a circular com a passagem a R$ 3,40. Juiz da 4ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias do TJMG, Mauro Pena Rocha, concede liminar interrompendo a cobrança até que ação popular movida pelo deputado Fábio Ramalho seja julgada
» 12 e 13 de maio
Alegando não ter sido notificada da decisão judicial, CBTU mantém o preço da tarifa a R$ 3,40, revoltando passageiros. Houve até quem chamasse a polícia para denunciar o descumprimento da liminar em vigor, mas todos tiveram que desembolsar o valor reajustado
» 14 de maio
Depois que cerca de 370 mil usuários pagaram a passagem reajustada, deixando cerca de R$ 600 mil a mais nas bilheterias do metrô, a CBTU informou ter sido notificada sobre a liminar que suspendeu o reajuste. A tarifa voltou a custar R$ 1,80 no meio da manhã, mas usuários da integração ainda tiveram que esperar pela atualização do sistema e muitos não foram beneficiados imediatamente