O conflito de interesses em meio à paralisação nacional dos caminhoneiros fez a Polícia Militar mudar de estratégia em Minas Gerais. Enquanto um grupo de transportadores vem abandonando a mobilização nas rodovias e quer seguir viagem, outros motoristas seguem parados e há relatos, inclusive, de episódios de ameaça e violência contra quem pretende voltar a rodar. O desbastecimento prossegue. Ontem, levantamento feito pelo Estado de Minas em 28 postos de Belo Horizonte, em um trajeto de 36 quilômetros, mostrava que só havia gasolina em 10. O resultado novamente apareceu em longas filas, que desafiavam a paciência dos consumidores.
Em virtude dessa situação, o comandante-geral da PM em Minas, coronel Helbert Figueiró de Lourdes, disse que, além de continuar garantindo escoltas para caminhões-tanque e outros, haverá presença ostensiva da PM nos pontos onde ainda há concentração de caminhoneiros, com o objetivo de garantir a movimentação de condutores que queiram retomar as atividades e de regularizar o fluxo de produtos no estado. Enquanto isso não ocorre, a crise no transporte de carga vem espalhando conflitos em pontos de venda e de bloqueio em várias regiões de Minas.
Na prática, o coronel diz que militares vão atuar de forma prévia para que a dissolução dos pontos persistentes de bloqueio ocorra mais rápido. “O que nós fizemos foi passar a colocar a presença física da PM direto nesses pontos, com a finalidade de não permitir que haja coação pela parada de caminhoneiros que passarem e também para permitir a saída daqueles que estão retidos contra vontade”, afirma o coronel.
"Foi expedida recomendação para os comandos para alterar a estratégia de atuação, mantendo as escoltas, mas passando a atuar presencialmente em todos os pontos de interceptação"
Coronel Helbert Figueiró de Lourdes, comandante-geral da PM
Figueiró diz que chegaram à PM relatos de que caminhoneiros que queriam deixar os protestos estavam sendo impedidos, o que caracteriza crime. Mas também há casos de pessoas tentando usar a força para liberar passagem de caminhões, como aconteceu em Além Paraíba, na Zona da Mata. Segundo o comando da PM, cinco policiais militares do Rio de janeiro foram abordados no Posto Faisão, no km 816 da BR-116, pois estariam tentando retirar, com uso de arma de fogo, dois caminhões carregados com camarão que seguiriam para o Rio de Janeiro. Os caminhoneiros acionaram a PM de Minas, que impediu a ação do grupo e descobriu que se tratavam de policiais cariocas fora de serviço. Como os motoristas não quiseram representar contra os militares do Rio de Janeiro, eles foram entregues ao comando da corporação fluminense e o assunto será tratado pelas cúpulas das duas instituições. O Estado de Minas tentou contato com PMRJ, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.
Durante a madrugada de ontem, em Nova Lima, na Grande BH, motoristas registraram em vídeo um conflito entre policiais militares rodoviários e pessoas que aguardavam em uma fila para abastecer na MG-030. A Polícia Militar não informou detalhes da ocorrência nem confirmou se alguém foi detido. Porém, o major Flávio Santiago, chefe da Sala de Imprensa, destacou que, pelas imagens, fica evidente que houve “claro desacato à autoridade policial”. No vídeo, um motorista indignado com o fato de o agente da PMRv anotar as placas dos veículos na fila, o chama de “babacão”.
Outra ocorrência envolvendo militar em fila de posto foi registrada em Santa Luzia, também na Região Metropolitana de BH. Um soldado foi preso depois de abastecer seu carro e se passar por seu irmão, também policial, para reabastecer na fila de prioridade para agentes de segurança. A corporação informou que está apurando o caso e não deu detalhes da ocorrência.
"Ontem meu carro entrou na reserva e, se eu sair daqui, acabou. Cheguei às 14h (de terça-feira) e preciso da gasolina para trabalhar atendendo aos clientes pelo menos na Grande BH"
Matheus dos Santos Ferreira, motorista, após mais de 12 horas de fila
INCERTEZA NOS POSTOS O embate entre caminhoneiros que querem deixar a mobilização e os que pressionam para mantê-la contribui para manter caótica a situação do abastecimento, principalmente de combustíveis. A reportagem do Estado de Minas percorreu ontem 36 quilômetros, passando por 28 postos nas avenidas do Contorno, Andradas, Silviano Brandão, Cristiano Machado e Via Expressa, contabilizando apenas 10 abastecidos. Dezoito seguiam sem funcionar por falta de etanol, gasolina e óleo diesel.
O analista Matheus dos Santos Ferreira, de 23 anos, já encarava mais de 12 horas na fila para tentar abastecer em um posto na Cristiano Machado, mesmo com a informação de que não havia gasolina nas bombas. “Ontem meu carro entrou na reserva e, se eu sair daqui, acabou. Cheguei às 14h (de terça-feira) e preciso da gasolina para trabalhar atendendo aos clientes pelo menos aqui na Grande BH”, disse ele, por volta das 9h30 de ontem.
O coronel Helbert Figueiró acredita que o fluxo de etanol, gasolina e óleo diesel deva se normalizar até segunda-feira, mas a previsão do comandante-geral da PM é de que a regularização do abastecimento de mercadorias em geral e o trânsito normal dos produtos deverá levar de 10 a 15 dias. (Com Landercy Hemerson)
Estradas devem ficar mais vazias
Com fornecimento intermitente de gasolina nos postos, a previsão do comandante-geral da PM em Minas, coronel Helbert Figueiró de Lourdes, é de que o movimento nas estradas do estado caia cerca de 70% durante o recesso de Corpus Christi. Nas rodovias federais, por exemplo, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) anunciou que não haverá operação especial de fiscalização, como seria comum no feriadão. Como o efetivo está concentrado na solução da greve dos caminhoneiros, a quantidade de agentes não é suficiente para manter uma operação especial.