A maior greve da história do ensino infantil e uma das mais longas do fundamental na rede pública de Belo Horizonte tem hoje um dia decisivo. À mesa, prefeitura, Ministério Público de Minas Gerais e professores se reúnem para tentar um acordo e, definitivamente, pôr fim à paralisação. Ontem, quando as educadoras completaram 51 dias de braços cruzados, a categoria decidiu em assembleia feita na porta da sede da PBH dar uma trégua na busca de uma conciliação. O movimento foi suspenso por um dia, bem como o acampamento, organizado há 20 dias em plena Avenida Afonso Pena, no coração da capital. Amanhã, em nova assembleia, os servidores definem se aceitam a proposta que deve sair do encontro de hoje.
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Há oito dias, o prefeito Alexandre Kalil (PHS) declarou encerradas as negociações, ao anunciar que retiraria a proposta feita à categoria caso não houvesse volta às aulas.
Diante do aceno, as professoras optaram pela suspensão, em assembleia tensa e de resultado difícil de prever, já que a categoria se mostrava dividida. Enquanto algumas pediam um voto de confiança, outras invocavam o direito constitucional de negociar ainda em greve. Outro ponto discutido foi a reposição. “Com o corte dos dias parados de abril, que representa um terço do salário, podemos optar por não repor. Se, por outro lado, a prefeitura pagar esses dias e não trabalharmos, teremos de devolver o dinheiro, descontando paulatinamente no salário referente aos dias não repostos”, entende a professora Thaís Tavares Lacerda, da Umei São Gabriel, no bairro homônimo, na Região Nordeste da capital, integrante do comando de greve.
Além de aumento salarial, a categoria reivindica a equiparação salarial dos professores do ensino infantil que têm formação em nível superior com os do ensino fundamental. Atualmente, o salário bruto da educação infantil é de R$ 1.451,93 e o do nível fundamental, de R$ 2,2 mil.
No Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado em 2014, a meta de número 17 estabelece a valorização dos profissionais do magistério das redes públicas de educação básica, de forma a equiparar seu rendimento médio ao dos demais profissionais com escolaridade equivalente, até 2020. Pelas contas da prefeitura, 70% das professoras do infantil são graduadas. No município, a carreira de professor tem 24 níveis, sendo o 1º para quem inicia na educação infantil e o 10º para quem começa no ensino fundamental. A partir disso, as mudanças vão ocorrendo conforme tempo de serviço e níveis de formação.
Na última proposta, a PBH chegou a sinalizar com até 20% de reajuste, o que significaria passar automaticamente servidores do nível 1 para o 4, além de retomar na Câmara Municipal a tramitação do substitutivo ao Projeto de Lei 442, que estabelece as mudanças, mas apenas caso a greve fosse encerrada. A proposta não foi aceita, sob argumento de que os 20% não contemplariam todos os professores, e que, na prática, o reajuste seria inferior a dois dígitos na maioria dos casos. O sindicato alega ainda que a proposta não resolve a questão, que é a equiparação.
A Secretaria Municipal de Educação foi procurada para se manifestar sobre as negociações, mas não retornou os contatos.
AS GREVES MAIS LONGAS DA EDUCAÇÃO EM BH
» Educação infantil
2012 – 45 dias
2018 – 51 dias (até ontem)
» Ensino fundamental
2001 – 56 dias
20 dias sem água e encarando o frio
Do gás lacrimogênio e água do primeiro dia até ontem, foram 20 dias no acampamento montado em plena avenida Afonsso Pena, o mais longo da história das greves na capital. Durante esse tempo, professoras revezam-se em 13 barracas, usando uma cozinha improvisada, banheiros químicos e recebendo doação de mantimentos.
Cerca de 100 pessoas fizeram turnos nas barracas. Bem-humoradas, contam que a intenção era estar sempre a postos, caso o prefeito decidisse recebê-las.
Questionada sobre os perigos, a professora Thaís Tavares Lacerda, da Umei São Gabriel, no bairro homônimo, na Região Nordeste da capital, não titubeou: “As mulheres que estão aqui são mais guerreiras e fortes que muitos homens”. Se sobrava comida, moradores de rua eram servidos. Difícil foi enfrentar o frio – embora a lona colocada embaixo das barracas cumprisse um papel térmico – e a falta de água corrente.
Professora na Umei Vila Maria, no Bairro Jardim Vitória, também na Região Nordeste, Suely Regina Silva Santos, de 51, trabalha há três anos na educação infantil e há 16 na rede municipal. Antes, foi auxiliar de biblioteca. Ela dormiu no acampamento na terça-feira da semana passada. “Foi muito tranquilo, porque meus filhos me conhecem nessa luta há muito tempo. Sempre estive nos movimentos, lutando por condições melhores de trabalho, desde os tempos de biblioteca”, afirma. Ela relata que a noite não teve sustos.
Suely diz que gostaria de completar 20 anos de rede municipal sem abrir mão de direitos trabalhistas. “Hoje, somos só 30% paradas, e quem desistiu teve seus motivos, que devem ser respeitados. Mas, se fôssemos os 85% de antes, essa greve já teria acabado. A prefeitura adotou a estratégia de nos cansar”, avaliou.