Responsável pela queda na arrecadação municipal de R$ 60 milhões dos R$ 350 milhões regulares e por impulsionar um desemprego que bate os 22% da população economicamente ativa de Mariana – antes, girava em torno de 7% -, a inatividade da mineradora Samarco desde o rompimento da Barragem do Fundão, em 2015, seria hoje uma opção de mercado de uma de suas controladoras, a Vale. A denúncia é do prefeito da cidade da Região Central de Minas Gerais, Duarte Junior (PPS), que entende já caber uma cassação das licenças por abandono. A Vale nega. De acordo com Junior, todo o trâmite para que a Samarco possa voltar a operar no município já foi cumprido, mas os trabalhos não são iniciados. “Todos os licenciamentos para que a cava de Alegria Sul possa ser preparada estão concedidos, mas a empresa (Samarco) vem protelando isso, dizendo que precisa de nove meses. Enquanto isso, Mariana passa por uma crise social muito grande, pois dependia dos empregos gerados direta e indiretamente pela Samarco”, disse o prefeito.
Para Duarte Junior, o motivo de a interrupção ser mantida seria uma melhora no preço do minério de ferro, sobretudo das pelotas desse produto, que era a forma comercializada pela Samarco. “O preço atingiu um bom patamar no mercado e segurar a oferta parece mais interessante para a empresa do que retomar os empregos e a geração de renda em Mariana”, disse. O prefeito acredita que a intenção final dessa manutenção da inatividade da Samarco é também possibilitar uma melhor negociação para a Vale assumir a parte da Samarco que pertence à BHP Billiton.
Caso a Samarco não se comprometa a retomar suas atividades, o prefeito pretende tomar medidas duras e pedir apoio político em diversas instâncias. “Vamos enviar documentos para a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), para o Congresso e o Senado. Queremos, também, acionar o ministro das Minas e Energia, Moreira Franco, para que exerça o que diz o artigo 67 do Código de Minas (Lei 227/67), que prevê a perda de licenças para quem abandona jazida ou mina”, ameaça.
Segundo o prefeito de Mariana, o grande número de desempregados na cidade histórica trouxe sobrecarga para vários setores, como o de assistência social, saúde e educação. Além disso, trouxe grande rivalidade entre a população urbana e os cerca de 600 atingidos que vivem de aluguel pago pela Fundação Renova, enquanto a construção do novo distrito de Bento Rodrigues e de Paracatu de Baixo é finalizada. “A população tinha gerado uma mágoa dessas pessoas atingidas, que só querem ter suas vidas de volta, longe da área urbana. Achavam que eram eles que vinham impedindo o retorno das atividades da Samarco, quando, na verdade, isso era a intenção das controladoras”, disse Junior, acrescentando que tal sentimento também degradou a imagem do Ministério Público e da Justiça perante os marianenses.
A retomada das atividades da usina de pelotização em Itaqui-Bacanga, em São Luís, no Maranhão, teria suprido a produção desse material e ajudado as intenções da Vale de manter a Samarco como uma forma de reserva, na opinião do prefeito. “Por que retomar uma produção lá, se aqui existe um discurso de responsabilidade social depois do acidente. Onde está essa responsabilidade? Isso ficou só no discurso. Nós, do poder público, fomos usados e agora a empresa virou as costas para Mariana”, disse Junior.
EM DIA Segundo informações da prefeitura, as ações da Fundação Renova, por outro lado, estão em dia. “Dentro do que é razoável, estão em dia. A entrega do novo distrito de Bento Rodrigues atrasou, não sai mais no primeiro semestre do ano que vem. Pode ser que saia até em 2020. Mas já até conseguimos publicar a lei que concede o terreno, que tinha sido considerado de utilidade pública. Falta apenas o estado dar a anuência”, disse.
A Vale negou, por meio de nota, “que haja qualquer negociação em curso ou que tenha chegado a um entendimento para a compra da participação da BHP Billiton Brasil Ltda. (BHPB) na Samarco. Vale e BHPB seguem focadas priorizando o suporte à Samarco para a retomada de suas operações, bem como à Fundação Renova nos programas de reparação e compensação das áreas e comunidades afetadas pelo rompimento da barragem”.
A Samarco também informou que, “com o apoio de seus acionistas, tem trabalhado para voltar suas operações de forma responsável, com máxima segurança e apoio das comunidades”. “A expectativa é que as licenças necessárias para viabilizar o retorno das atividades sejam obtidas ao longo de 2019”, acrescentou. Já a BHP Billiton disse não que se pronuncia sobre “especulações”.
Procurado pela reportagem, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) disse, em nome do Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente (Caoma) e da força-tarefa que atua frente ao desastre, que não vai comentar essa questão.