Moradores e comerciantes da Avenida Cristiano Machado e seu entorno acompanham com expectativa o desdobramento da licitação de uma obra importante para evitar enchentes na avenida. O anúncio da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) da reabertura do edital, que promete resolver parte dos problemas trazidos pela chuva, anima a população, que coleciona prejuízos com alagamentos históricos na avenida onde é formado o Ribeirão do Onça, um dos principais cursos d’água de BH. A prefeitura espera construir, em um ano e meio a partir da assinatura da primeira ordem de serviço, um novo canal para o manancial ao lado do que já existe entre o cruzamento com a Avenida Risoleta Neves, no Bairro Primeiro de Maio, e a Estação São Gabriel do Move, aumentando, dessa forma, a capacidade de drenagem de água. A obra pode alcançar o teto de R$ 45 milhões, com recursos do Fundo Municipal de Saneamento e de financiamento via Ministério das Cidades, além de R$ 25 milhões já licitados para desapropriações.
A junção do Córrego Cachoeirinha e do Ribeirão Pampulha, formando o Ribeirão do Onça, produziu, nos últimos 10 anos, vários alagamentos que, quando acontecem, têm potencial para transformar a Avenida Cristiano Machado em um rio. Sem vazão para o volume de água em chuvas fortes, o canal inicial do Onça enche e a água volta ao longo dos dois afluentes, causando um efeito cascata na Cristiano Machado, onde corre parte do curso do Ribeirão Pampulha, e Bernardo Vasconcelos, via por onde passa o canal aberto do Córrego Cachoeirinha. Para resolver completamente o problema, a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) prevê cinco intervenções.
A primeira delas prevê a atuação direta no Onça. Segundo a Sudecap, será construído um canal paralelo à canalização existente, iniciando nas proximidades do cruzamento da avenida Cristiano Machado com avenida Risoleta Neves até a divisa com a faixa de domínio da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) dentro da Estação São Gabriel, numa extensão de 286,96 metros. No trecho final, próximo à faixa de domínio da CBTU, esta nova estrutura se interligará ao canal já existente no Ribeirão do Onça, informou a Sudecap. O modelo da construção é conhecido como parede diafragma. A obra ainda prevê a junção do novo canal com a estrutura já existente. A data final para encaminhamento de propostas de empresas interessadas em tocar a primeira etapa das obras é 9 de agosto. O superintendente da Sudecap, Henrique Castilho, destaca que essa obra seguirá os trâmites do Regime de Contratação Diferenciado (RDC), que permite à administração municipal analisar a documentação apenas da empresa que apresentou o melhor preço, acelerando os trâmites. “Isso facilita para abrirmos as obras ainda esse ano”, pontua o superintendente, caso o procedimento não sofra interrupções judiciais. Ainda segundo Castilho, essa parte não vai exigir fechamento do acesso à Avenida Risoleta Neves e por isso o impacto será bem menor, com maior concentração de intervenções em uma área interna da CBTU.
A interferência no trânsito deve chegar para valer a partir da segunda fase, que de acordo com Castilho deverá ter a licitação de obras lançada ainda esse ano. Essa parte contempla a ampliação do canal do Ribeirão Pampulha, que vai das imediações da Estação São Gabriel até o cruzamento da Cristiano Machado com a Avenida Sebastião de Brito, no Dona Clara, e tem perspectiva de durar dois anos. O trajeto de cerca de 1,30 quilômetro está praticamente todo dentro da Cristiano Machado. “Para essa parte já existem discussões com a BHTrans para a situação do trânsito”, acrescenta Castilho. A terceira etapa prevê a construção de um canal paralelo ao Córrego Cachoeirinha em um trecho de 1,10 quilômetro, mas essa parte ainda não tem recursos assegurados. Por fim restarão intervenções no Córrego Suzana, que também é contribuinte da bacia do Onça, e a construção do Parque Linear do Onça, que vai remover residências de uma mancha de inundação entre a cachoeira existente no curso d’água e a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) da Copasa. Henrique Castilho destaca que os prazos estipulados pela prefeitura para conclusão das obras dependem também da emissão das devidas licenças ambientais necessárias, pois a prefeitura não pode passar por cima das regras para acelerar os procedimentos.
INUNDAÇÕES Há cinco anos como donos de uma loja de locação de equipamentos para construção civil na Rua Gilson Bretas, Bairro Suzana, Região da Pampulha, os irmãos Vinícius Jopetipe, 34, e Mateus da Silva Jopetipe, 31, tiveram um prejuízo de quase R$ 30 mil em dezembro do ano passado, quando a loja foi invadida pela água de um temporal na região. “Aqui a gente monta uma estrutura de cavalete de novembro a abril para levantar as máquinas caso comece a chover. Nesse período, quando estamos em casa e começa a cair a água a gente fica sem saber se vai encontrar as máquinas boiando”, diz Vinícius. Mateus acrescenta que a obra será importante, mas vem tarde. “Já deveria ter sido feita, toda vez que chove forte tem alagamento”, diz ele.
O preparador automotivo Artur Lima da Silva, 26, trabalha em uma oficina na Avenida Risoleta Neves há três anos e está bastante acostumado com a rotina de alagamentos da região. “A água vem por esse canal e quando chega na boca ela não entra, acumulando para todo lado e enchendo a Cristiano Machado. Teve uma situação que a água entrou na oficina e algumas peças como macaco e compressor ficaram boiando. Se a obra sair e parar de alagar vai melhor demais para nós”, diz ele.
Crateras seguem sem solução
As obras no início do leito do Ribeirão do Onça, nas imediações da Avenida Cristiano Machado, prometem começar a solucionar problemas que tiram o sono de moradores e comerciantes não só da via que liga o Centro às regiões Norte, Nordeste, Pampulha e Venda Nova, mas ao longo dos bairros cortados pelo curso d’água. Acostumada a conviver com o risco quando chove forte, a população do Bairro Ribeiro de Abreu, Nordeste da cidade, vivenciou de forma violenta os efeitos das cheias do Onça em março deste ano. Parte da Rua Antônio Ribeiro de Abreu foi levada pela chuva, abrindo uma cratera na região que segue sem solução até hoje. Com as obras que podem começar ainda esse ano e as demais etapas de toda a bacia de macrodrenagem dos ribeirões Pampulha, do Onça e Córrego Cachoeirinha, a expectativa é que esse tipo de problema não ameace mais os moradores.
Um dos mais impactados com o desmoronamento de quase toda a Rua Antônio Ribeiro de Abreu é o empresário Lucas de Souza Reis, dono de uma fábrica de calhas na via. Sem a infraestrutura urbana na porta de sua loja, ele viu o movimento cair e ainda perdeu todos os inquilinos nos apartamentos que alugava na parte de cima da fábrica. “Os clientes chegam na esquina, olham a falta da rua e voltam. Chegou a cair 90% o movimento. Não sobrou nenhum inquilino em cada um dos nove apartamentos que me rendiam R$ 4 mil por mês”, afirma ele. Segundo o empresário, em 10 anos de atuação naquela região o problema de desabamento da rua já aconteceu três vezes.
De acordo com a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), a Defesa Civil e a BHTrans isolaram e sinalizaram a área em março deste ano. “A Rua Antônio Ribeiro de Abreu está localizada em área inundável margeando o Ribeirão do Onça, na qual será implantando o Parque Linear do Onça”, que faz parte do conjunto de obras de macrodrenagem da região, conforme a Sudecap. Essa área terá a função de preservar a várzea do manancial, “com foco no restabelecimento da mata ciliar, recuperação de margens e recuperação da área de preservação permanente”, acrescenta a superintendência. Dessa forma a prefeitura espera que a população deixe de habitar as áreas com risco de inundação. No primeiro momento, estão previstos o cercamento da área destinada ao parque, remoção das famílias e a demolição dos imóveis existentes no local.
A remoção das famílias da Rua Antônio Ribeiro de Abreu já estava prevista e, graças ao desmoronamento de março, a Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel) está antecipando o cronograma e priorizando os procedimentos de remoção no local. “As 12 edificações localizadas na Rua Antônio Ribeiro de Abreu já estão em processo de negociação para a saída do local”, finaliza a Sudecap.