Passa Quatro e Itamonte – Inóspito, nas concepções geográfica e do Dicionário Aurélio, define um local que não reúne “condições para ser habitado ou onde não se consegue viver”. E um dos lugares mais hostis do planeta se encontra em Minas Gerais, paradoxalmente partilhando a divisa com os estados de São Paulo e do Rio de Janeiro, na região mais habitada do Brasil. A porção sudoeste da Serra da Mantiqueira, a Serra Fina, entre Passa Quatro e Itamonte, no Sul de Minas, reúne condições climáticas imprevisíveis, árduos acidentes geográficos, vegetação selvagem e escassez de água. Ali, se erguem a quarta mais alta montanha do Brasil, a Pedra da Mina, com 2.798 metros, o Pico dos Três Estados (10ª), com 2.665 metros, e outras 18 elevações acima de 2 mil metros. Obstáculos que fizeram muitos montanhistas considerarem a travessia como a mais dura do Brasil. Para desvendar as ravinas, abismos e elevações desse perigoso rincão, a reportagem do Estado de Minas cruzou a Serra Fina em quatro dias e traz o relato de sua natureza imponente dentro da série Montanhas de histórias, publicação que mensalmente mostra como as serras e montes do estado se tornaram o berço do povo mineiro e de sua cultura.
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A matemática da aventura: como equacionar bagagem e seguir caminhoVentania dificulta ainda mais a travessia na Serra FinaCaminho dos bandeirantes, Garganta do Embaú é trajeto de romeiros para AparecidaTúnel na Serra da Mantiqueira guarda marcas da Revolução de 1932Incêndio mata idoso de 96 anos e deixa cinco feridos em BHSeparadas por 33 quilômetros, as extremidades da Serra Fina eram acessos usados por séculos no desbravamento e desenvolvimento do Brasil. A Garganta do Embaú (MG/SP) permitia a passagem dos paulistas pela Serra da Mantiqueira até a região das minas, nos séculos 17 e 18, enquanto a Garganta do Registro (MG/RJ) se tornou, no século 19, um dos caminhos dessa região até o Rio de Janeiro. Mesmo um fluxo crescente, que foi impulsionado ao longo das décadas pelo emprego de linhas férreas e do automóvel, não foi suficiente para incentivar o desbravamento da Serra Fina.
A primeira exploração da região foi documentada em 1955. Quatro imigrantes alemães que eram alpinistas, chamados Henning Bobrik, Gunther Engels, Felix Bernhard Hacker e Theodor Reimar Hacker, avistaram o pico da Pedra da Mina a partir do Parque Nacional de Itatiaia e decidiram conquistar aquele cume.
Somente em 2000, uma expedição da Universidade de São Paulo (USP) comprovou que a Pedra da Mina era o quarto mais alto pico do Brasil, tomando, por oito metros, a posição do Pico das Agulhas Negras (2.790 metros), o que foi ratificado pelo IBGE apenas em 2004. Os próprios relatos dos integrantes da expedição do IBGE mostraram o quanto a Serra Fina é inóspita. Em maio de 2004, após escalar a formação de montanhas, o coordenador dos agentes federais que fizeram as medições, Edmundo Cecílio, declarou: “A expedição à Serra Fina era, na verdade, preparativo para a expedição aos picos da Neblina (mais alto do Brasil) e 31 de Março (segundo mais alto). Pois bem, acreditem: tirando um calorzinho a mais na parte inicial, a Amazônia foi bem mais fácil. Diga-se de passagem, nem conseguimos completar a Serra Fina”.
Os perigos e também a descoberta de tantos picos tão altos aumentaram a curiosidade e, por isso, o turismo na região cresceu consideravelmente. “As montanhas e a travessia da Serra Fina são hoje um dos mais importantes componentes turísticos de Passa Quatro”, afirma o secretário de Turismo da cidade, Luís Gustavo Franco da Rosa. De acordo com Rosa, o município já conta com 1,5 mil leitos para todos os perfis de turistas, de hostels a hotéis, além de uma estrutura de mais de 20 guias, que ganharão treinamento e abrigo no Centro de Educação Ambiental da prefeitura.
Pelas trilhas de Minas
O EM publica desde março a série Montanhas de histórias, que busca resgatar as origens do povo montanhês que fez de Minas Gerais seu refúgio e sua morada.
(A LOJA ROTA PERDIDA/ROTA EXTREMA - www.rotaperdida.com.br - forneceu parte dos equipamentos usados nas expedições)
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