Um treinamento atrasado, de alcance restrito e com o agravante de baixíssima adesão da população. Ontem, o primeiro simulado de evacuação de emergência envolvendo moradores da área de influência da Barragem Casa de Pedra, administrada pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) em Congonhas, na Região Central de Minas Gerais, já alcançaria somente 381 pessoas, ou apenas 8% dos 4,8 mil moradores das áreas consideradas mais vulneráveis em caso de eventual colapso da represa de rejeitos de minério. Mas o exercício sensibilizou apenas 19 habitantes, que saíram de suas casas, no Bairro Residencial Gualter Monteiro, para participar da dinâmica.
Apesar de o Ministério Público ter garantido a estabilidade da barragem, em laudo divulgado em abril, o treinamento compõe os primeiros passos definidos pelo Plano de Emergência de Barragens, exigência do Departamento Nacional de Produção Mineral e elaborado após a detecção – há 21 meses – de infiltrações no Dique de Sela, uma das estruturas do barramento da CSN. O público-alvo da movimentação de ontem eram moradores das ruas José Morais Silva, Carlota Cordeiro, Santinha Teixeira Matos, Maria de Castro e Crispim Francisco Mendes, todas no bairro.
Um dos poucos que se interessaram pelo exercício, o morador Vanderlei Batista lamentou a falta de participação dos vizinhos. “A gente precisa comparecer a uma atividade como esta, para ficarmos cientes do que precisamos fazer. O pessoal pensa: ‘É uma simulação, então não estou nem aí’, mas se acontecer a eventualidade, a pessoa fica sem saber para onde correr”, afirma.
O treinamento começou às 10h05 e foi finalizado 16 minutos e 25 segundos depois, às 10h21, horário em que a última pessoa interessada chegou ao local combinado. Houve acionamento de sirenes, uma das preocupações dos órgãos públicos e da mineradora, já que os dispositivos não haviam atingido o nível ideal nas duas primeiras atividades, que não contaram com a participação de moradores. Desta vez, o sinal sonoro foi classificado como suficiente
Uma caminhonete também circulou pelas ruas com equipamento sonoro, anunciando instruções. Depois disso, a população próxima ao local de risco se deslocou até um ponto de encontro, onde foram repassadas orientações da equipe técnica. Em caso de desastre, o local deve operar como área de salvamento, a 800 metros do ponto mais extremo das cinco ruas participantes do exercício de ontem.
No perímetro dessas ruas estão dois focos de preocupação: uma creche e uma escola. De acordo com diretor de Saúde e Meio Ambiente da União das Associações Comunitárias de Congonhas (Unaccon), as instituições de educação deveriam ser prioridade, mas não foram convocadas, já que o treinamento aconteceu em um domingo, e durante as férias escolares. “Se essas crianças se salvarem em um simulado, as outras pessoas também vão se salvar. Elas deveriam ser prioridade, porque têm limitações para locomoção”, avaliou o líder comunitário.
Para preparar a população antes da atividade, a CSN e a prefeitura organizaram uma reunião, na terça-feira, quando apresentaram detalhes do treinamento. Além disso, profissionais responsáveis por instruir os moradores passaram de porta em porta entregando um folheto com sete dicas em caso de desastres e telefones de órgãos de segurança. Entretanto, moradores como José das Graças Pereira,dono de um ponto comercial no bairro contemplado pelo simulado, se queixaram de falta de informação antes do treino. “Eles (representantes do poder público e da mineradora) me procuraram (no estabelecimento), mas, quando eu disse que não morava aqui, não me entregaram o folheto. Deveriam ter me dado, porque passo mais tempo na venda do que em casa”, afirmou.
PRÓXIMOS PASSOS Com a aproximação do período de chuvas, quando os riscos podem ser ampliados, a CSN admite que está “encurtando” os prazos para que os treinamentos estejam na cultura da população de Congonhas nos próximos meses. Contudo, ainda não há uma data definida para a próxima atividade. “Não estamos estabelecendo datas fixas, porque é importante avaliar o que ocorreu neste simulado, para que possamos planejar o próximo”, disse o gerente-geral de Sustentabilidade da CSN, Eduardo Sanches. Segundo ele, a tendência é de que o próximo teste contemple outro bairro, assim como um número mais elevado de pessoas. O foco em pontos de comércio e pessoas com mobilidade reduzida também vai ser considerado.
Ainda de acordo com o gerente, o processo de treinamento fragmentado entre bairros tem a meta de criar aos poucos uma cultura de emergência na população. Segundo ele, é preciso cuidado para não “banalizar” os treinamentos. O executivo também pediu apoio da população, para que as atividades sejam cada vez mais efetivas.