Templo neogótico com 146 torres, casa da padroeira de Belo Horizonte e ponto importante de peregrinação de moradores e romeiros de outras cidades. Após quase quatro anos de obras, a capela dedicada a Nossa Senhora da Boa Viagem, no interior da igreja homônima, será reinaugurada hoje, data consagrada à padroeira e feriado municipal na capital mineira (confira abaixo o que abre e o que fecha), durante a celebração da missa solene, presidida pelo arcebispo belo-horizontino dom Walmor Oliveira, às 18h. Na cerimônia também será apresentada a imagem de Nossa Senhora da Boa Viagem, do século 18, completamente restaurada.
Durante as obras da capela, especialistas removeram sete camadas de tinta e descobriram os tons originais do interior do santuário – verde, amarelo, azul e branco – referência à bandeira nacional. Segundo o titular da paróquia e reitor, padre Marcelo Carlos da Silva, a partir de uma pesquisa histórica foi concluído que o santuário, inaugurado em 1922, é também um monumento ao centenário da independência do Brasil. “É preciso lembrar que a história da capital surgiu com a imagem que estava na capela original, em torno da qual nasceu o arraial, formou-se a vila e cresceu a capital. São mais 300 anos de história”, afirmou o pároco.
As obras integram os trabalhos de restauro do Santuário Arquidiocesano de Adoração Perpétua – Paróquia Nossa Senhora da Boa Viagem, que estão sendo feitos em etapas. As intervenções começaram em 2013 com a reforma do telhado. Em seguida, veio a parte de infraestrutura, com as obras na rede elétrica, iluminação, sonorização e segurança. O pároco Marcelo ressaltou que a igreja permaneceu aberta para as missas e demais celebrações religiosas mesmo durante a reforma. Para receber os fiéis, o padre fez adequações nos espaços que compõem o templo. “Teve momento em que precisamos fechar a igreja durante a semana, mas mantínhamos as celebrações aos sábados e domingos”, conta.
A igreja em estilo neogótico não está muito longe de completar o centenário de inauguração, que ocorrerá em 8 dezembro de 2023. Outro detalhe da capela é um vitral com 15 metros de comprimento, considerado pela Arquidiocese de Belo Horizonte o maior da capital mineira, também revitalizado. O padre Marcelo lembra que, além da ajuda da comunidade por meio da campanha “Juntos pelo Restauro” e de atividades da paróquia, há recursos provenientes de emenda parlamentar, e ele busca parceiros no setor privado, via Lei Rouanet, para levar adiante a reforma. Até agora, já foram investidos mais de R$ 700 mil nas obras da igreja.
Com tombamento municipal e estadual, além de elementos sob proteção federal e que pertenceram ao templo antigo – incluindo a imagem, altar, pia, chafariz e outras peças do século 18, as obras na igreja ainda não foram concluídas. Segundo o pároco, a reforma ainda vai contemplar a nave, termo referente à ala central de uma igreja, e outros elementos arquitetônicos. Ele adianta que a fachada voltará à cor original – ouro colonial – semelhante à dos prédios históricos da Praça da Liberdade, na Região Centro-Sul, como o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB).
RESTAURAÇÃO O restauro da imagem de Nossa Senhora da Boa Viagem, que chegou aqui em 1714, pelas mãos de Francisco Homem Del Rey e tem 80 centímetros de altura, 40cm de largura e 26cm de profundidade, demorou cerca de um ano, segundo o pároco Marcelo. As especialistas da Relíquia Ateliê de Restauração Artística (Rara) Luzia Marta Gonçalves e Jussara Maria Alves removeram cerca de quatro camadas de tinta sobre a peça sacra policromada e esculpida em madeira de lei.
Cada dia de trabalho reservava uma nova descoberta. Jussara conta que dois dedos da mão esquerda da peça quebraram e foram substituídos por resina epóxi em vez de madeira. Para restaurar adequadamente a imagem, o escultor Guilherme Marques foi responsável por refazer os dedos e também o nariz de um anjo querubim da base, que estava quebrado. “É uma imagem muito antiga. O processo é demorado, porque envolve uma decisão em conjunto com Iepha (Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais) e o pároco”, conta Luzia.
No manto da santa, sob as camadas de tinta, descobriu-se um azul mais claro. “Acreditamos que a imagem recebeu o manto azul de estrelas na inauguração da igreja gótica, em 1922, por isso, recuperamos essa pintura”, comenta. Por baixo do manto, as especialistas ainda encontraram vestígios da pintura original. “Por ser apenas resquícios, não foi possível restaurar”, conta Luzia.
Conforme noticiou o Estado de Minas em março, os olhos da peça também mereceram criteriosa intervenção e as restauradoras revelam uma história surpreendente, em que talvez nem todos os fiéis tenham reparado ao longo dos anos. É que, no lugar dos olhos de vidro originais, Luzia e Jussara encontraram “massa pintada” que deixava a imagem estrábica. “Sempre fazemos as intervenções com a decisão tomada em conjunto com o Iepha e o pároco”, conta Luzia. A solução veio da especialista em prótese ocular para humanos Elizabeth Souza, que doou os olhos, com um pedido à paróquia: doar uma prótese ocular para uma criança que esteja precisando.
TRAVESSIA OCEÂNICA A história da Igreja de Nossa Senhora da Boa Viagem teve início no século 18. Em 1709, o português Francisco Homem del Rey conseguiu autorização da Coroa Portuguesa, por meio de cartas de sesmarias, e se estabeleceu na região onde hoje se encontra Belo Horizonte. Segundo as pesquisas, ele trouxe uma imagem da padroeira dos navegantes portugueses, Nossa Senhora da Boa Viagem, que o acompanhou na travessia do Oceano Atlântico. Para homenageá-la e proteger a imagem, Francisco ergueu em suas terras uma pequena capela de pau-a-pique. Como estava na rota dos tropeiros que passavam pela região transportando riquezas do interior do país, a igrejinha recebeu o nome de Nossa Senhora da Boa Viagem e passou a ser conhecida também como a padroeira dos viajantes.
Com o passar dos anos e a enorme devoção dos fiéis, a capelinha ficou pequena para receber tanta gente e em seu lugar foi construída uma igreja maior. Mas, com a construção da capital, foi necessário erguer um novo templo – o atual Santuário Arquidiocesano de Adoração Perpétua Nossa Senhora da Boa Viagem, inaugurado em 1923, data em que a cidade de Belo Horizonte foi oficializada como arcebispado. Em 1932, o título de padroeira da capital mineira foi oficializado pelo papa Pio XII, a pedido do cardeal dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota. A festa da protetora de BH ocorre entre 6 e 15 de agosto, dia que lhe é dedicado. * Estagiária sob supervisão do editor Roney Garcia
Programação da festa:
» 7h, 8h30 e 11h – Missa
» 16h30 – Terço
» 17h – Procissão Luminosa
» 18h – Missa solene, presidida por dom Walmor Oliveira