Jornal Estado de Minas

Medo de prescrição de ações de Mariana chega a Juizados Especiais

Cópia do ofício enviado pelo Juizado Especial de Governador Valadares - Foto: ReproduçãoO medo da prescrição dos processos relacionados ao rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas, que este ano completa três anos, chegou até mesmo a processos de menor monta, concentrados no Juizado Especial, na região de Governador Valadares, no Leste do estado, onde 45 mil ações reclamam algum direito relativo a danos ocasionados pelo desastre socioambiental.

Com o prazo apertando e o temor das milhares que questionam a qualidade da água terem de voltar à estaca zero na Justiça comum, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) questionou o andamento dos processos que tramitam no Posto Avançado de Autocomposição e pediu, em caráter de urgência à Justiça que sejam despachados os processos nessa situação, para apressar o julgamento dos pedidos.

Dezenas de milhares de ações questionam a qualidade da água fornecida pelo sistema público de distribuição das cidades que captam água do Rio Doce depois do rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, há quase três anos.

Nessa terça-feira, o juiz coordenador do Juizado Especial de Governador Valadares, Wagner José de Abreu Pereira, respondeu, por meio de ofício, “que não há qualquer tipo de represamento de autos que possa prejudicar o trâmite dos processos”. Ele ressaltou ainda os termos do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), admitido no caso dessas ações.

Segundo o magistrado trata-se de um recurso por meio do qual se busca uma sentença única para todos os casos. Ele pode ser suscitado por alguma das partes envolvidas ou pelo próprio magistrado, quando há várias ações questionando o mesmo assunto ou pedindo reparações semelhantes. Admitindo o incidente, uma decisão vale para todos, logo, todas as ações têm o mesmo resultado.

Conforme mostrou o Estado de Minas no mês passado, no fim de maio, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) admitiu esse entendimento único sobre a questão. Na ocasião, estava em xeque se os Juizados Especiais são competentes para processar e julgar demandas que têm como objeto o fornecimento de água e/ou indenização por danos morais. Avaliava-se também aquelas relativas à qualidade da água fornecida pelo sistema público de distribuição das cidades que captam água do Rio Doce em ações propostas em decorrência do rompimento da barragem do Fundão.


A Samarco alegou a natureza técnica complexa da questão e a necessidade de produção de prova pericial, o que seria incompatível com a lei que trata dos Juizados Especiais.

A Corte admitiu o IRDR e fixou tese jurídica sustentando que os Juizados Especiais não são competentes para processar e julgar ações que tratam de problema no fornecimento de água ou de pedidos de indenização por danos morais relacionados nas cidades que captam água do Rio Doce.

Os 10 desembargadores, por unanimidade, entenderam que tais ações tratam de questões de natureza técnica complexa, por isso, é imprescindível a produção de prova pericial para apurar o dano. Eles decidiram ainda que só podem ser julgados nos Juizados Especiais os casos que tiverem prova já produzida em outro processo acerca da qualidade da água, desde que todas as partes tenham se manifestado. O magistrado impôs a extinção das ações que questionam a qualidade da água e a necessária postulação dessa matéria na Justiça comum.

De acordo com o presidente da ordem em Governador Valadares, Elias Dantas Souto, o entendimento é de que os processos serão extintos e será necessário ingressar com novas ações na Justiça comum, antes de o prazo legal de prescrição, quando a maior tragédia socioambiental brasileira completa três anos.

A maior parte dos atingidos em Valadares, o maior município da Bacia Hidrográfica do Rio Doce, com 280 mil habitantes, luta por indenizações por terem seu fornecimento de água interrompido por uma semana.

As torneiras secaram depois que a onda de lama e rejeitos de minério de ferro invadiu o Rio Doce, onde era feita a captação de água municipal. Pelo Programa de Indenização Mediada (PIM) promovido pela Fundação Renova, os atingidos locais teriam direito a uma reparação no valor de R$ 1 mil.

Apesar da apreensão dos atingidos, o TJMG informou que esses processos não perderão prazo, pois estão suspensos. Em 16 de março de 2017, o relator do caso, desembargador Amauri Pinto Ferreira, determinou a suspensão de todas as ações decorrentes do rompimento da barragem que estavam em trâmite perante os Juizados Especiais integrantes do TJMG e que questionem ou apresentem entre seus argumentos a dúvida/insegurança acerca da qualidade da água fornecida pelo sistema público de distribuição.


A decisão alcança aquelas ações que não tiverem sido julgadas ou que, já sentenciadas, estejam em fase recursal. A exceção são aquelas em que a sentença já tenha transitado em julgado. Logo, o período de prescrição não conta.

As ações ficarão suspensas até a conclusão da tramitação do IRDR. O processo ainda passará pela fase de instrução – pelo Código de Processo Civil, o relator pode chamar partes, entidades e até fazer audiência pública, se julgar necessário.

Depois de concluída a instrução, é marcada a data para julgamento do mérito, quando se decidirá a tese a ser adotada, ou seja, o que decidir para todos os processos com pedidos iguais. Sendo assim, processos relacionados a essas questões devem aguardar para que todos tenham decisão igualitária.

 

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