Primeira cidade brasileira a receber o título de patrimônio da humanidade (1980), Ouro Preto, na Região Central, dá a largada nas ações efetivas de combate a incêndios em igrejas, prédios públicos, casarões e outros monumentos dos séculos 18, 19 e início do 20. Ontem, começou no Centro Histórico e distritos uma operação pente-fino a fim de verificar se há autorização – Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB) – para funcionamento de estabelecimentos comerciais, realização de eventos e outros. Ao mesmo tempo, o Serviço Municipal de Águas e Esgotos voltará as atenções para os hidrantes, adianta o secretário de Cultura e Patrimônio, Zaqueu Astoni Moreira. Segundo ele, as repúblicas de estudantes de Ouro Preto já contam com o AVCB. O trabalho de fiscalização ocorre como consequência do incêndio que destruiu o Museu Nacional, no Rio de Janeiro (RJ), que completa um mês hoje.
“Ouro Preto vive uma situação de fragilidade. Como há muitas casas geminadas no Centro Histórico, o perigo de o fogo se alastrar e atingir museus e igrejas é imenso. Portanto, é necessária a união de esforços, um alinhamento na atuação das instituições e apresentação de projetos e cronograma de execução”, explicou o promotor de Justiça, após a reunião de mais de quatro horas. Um dos pontos destacados se refere aos hidrantes. “Esse é um ponto fundamental e é preciso melhorar a rede, identificando equipamentos que não funcionam e áreas descobertas”, disse Domingos, adiantando que são necessários aportes financeiros para evitar falhas e aumentar a frota de viaturas dos bombeiros e o prédio ocupado pelo batalhão, perto do Centro Histórico. As fontes poderão vir de compensações ambientais e de um fundo municipal.
Sobre o aniversário de um mês do incêndio no Rio, Domingos diz que, infelizmente, no Brasil se aprende com a tragédia. “O mais importante é que o processo burocrático não atrapalhe as ações de prevenção e combate”, disse. Logo após o incêndio, o governo de Minas, em parceria com outros órgãos e Corpo de Bombeiros, formou uma força-tarefa para fiscalizar os museus do estado. Em nota, os bombeiros informam que o serviço ainda está em execução na capital e no interior, pois o prazo é de 60 dias. “Ao final, teremos um levantamento real da situação dos museus em todo o estado”, diz a assessoria do comando.
ESCOMBROS Segundo a assessoria do Museu Nacional, vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), não há previsão de atos públicos para hoje no local. A informação também é que, no momento, estão sendo feitas obras de escoramento, cobertura, instalação de andaimes e outros no prédio, com recursos de R$ 8,9 milhões do governo federal – uma próxima etapa deverá consumir R$ 50 milhões. O prazo para término desse serviço e retirada do acervo que está nos escombros é de 180 dias contados desde a segunda-feira da semana passada. As obras serão feitas pela Concrejato Engenharia, empresa que participou da reconstrução do Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, que também sofreu um incêndio. A empresa foi escolhida por chamada pública.
Além dessa primeira etapa de intervenções emergenciais, estão previstas outras três na reconstrução do Museu Nacional, incluindo a possibilidade de cessão de um terreno próximo ao local para que as atividades acadêmicas sejam mantidas. A segunda etapa depende da conclusão da perícia da Polícia Federal no local. Depois de realizada, será contratado um projeto básico e, com base nele, será implementado o projeto executivo da reconstrução do museu. A terceira etapa é a da reconstrução. A ideia é mobilizar recursos por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura, conhecida como Lei Rouanet. A quarta fase poderá ocorrer em paralelo com a obra de construção. É a de recomposição do acervo. O governo pretende fazer uma campanha internacional para a doação e aquisição de acervos para o Museu Nacional.
O Museu Nacional tinha um acervo de cerca de 20 milhões de itens, mas até agora nada foi retirado. E também não se sabe o quanto foi perdido de fato, incluindo o crânio de Luzia. “Alguns fragmentos foram achados, mas não se sabe se são de Luzia. Da mesma forma, já se tem conhecimento de que a fachada não tem risco de desmoronar”, disse uma assessora, lembrando que uma equipe da Organização das Nações Unidas para a Educação, Saúde e Cultura(Unesco) já visitou o local. Sobre a Luzia, o dado mais recente é que, a partir da tomografia e posterior digitalização em 3D do crânio foi possível reproduzir o fóssil, assim como de outros 300 anteriormente escaneados. O trabalho foi feito pela equipe do Instituto Nacional de Tecnologia.
Entre o material que pode estar perdido nas cinzas do museu estão também coleções da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e de outras instituições. Numa via de mão dupla, a PUC Minas poderá fazer cópias de exemplares da megafauna, que tiveram os originais do Museu Nacional como referência, numa forma de ajudar o equipamento cultural e científico a recompor, no futuro, seu precioso patrimônio de 200 anos.
Rede de prevenção e proteção em Minas
As ações em Ouro Preto vão envolver treinamento – inicialmente serão 10 funcionários da arquidiocese, que trabalham na cidade – e verificação de projetos referentes à parte elétrica dos monumentos. A etapa é fruto da iniciativa da superintendência em Minas do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que pretende criar brigadas nas cidades mineiras com sítios históricos reconhecidos como patrimônios da humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). As ações vão se espelhar num trabalho desenvolvido em Belo Horizonte, que tem a Pampulha nesse seleto grupo, numa parceria da prefeitura com os bombeiros. Os outros locais são, além de Ouro Preto, Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, e o Santuário Basílica do Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, na Região Central.
Conforme disse ao Estado de Minas a superintendente do Iphan, Célia Corsino, trata-se de uma “rede de prevenção e proteção” entre as quatro cidades, com ajuda mútua e troca de experiências. “Vamos treinar brigadistas para tomar providências ao menor sinal de fogo, Queremos reunir não apenas funcionários de museus, mas também de arquivos e outros edifícios públicos, zeladores de igrejas e de capelas e outros interessados da sociedade civil.” A expectativa é de que dezenas de pessoas recebam treinamento até o fim do ano, ficando capacitadas a tomar providências caso o pior aconteça. Na prevenção, a Prefeitura de Diamantina está em negociação com o grupo especializado Ignis, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), para a elaboração de diagnóstico e projetos para proteção dos bens tombados do Centro Histórico.
Um avanço para as autoridades está na Portaria 366/2018, em âmbito nacional, divulgada na semana do incêndio do Museu Nacional e que busca “compatibilizar as normas do Corpo de Bombeiros com o que pode ser feito em prédios tombados”. Trata-se de uma forma de garantir mais agilidade na aprovação de projetos, e a explicação técnica é a seguinte: Até então, o Iphan só havia realizado ações pontuais, como a produção de cartilhas sobre combate e prevenção de riscos ao patrimônio cultural. “Dessa forma, a nova portaria conseguiu compatibilizar as exigências para a segurança, prevenção e combate a incêndios com o mínimo impacto sobre os elementos arquitetônicos e artísticos das edificações protegidas pelo Instituto”, diz uma nota da autarquia federal. (GW)
Museu reabre em Itabira
Depois de quase 10 anos fechado, o Museu de Itabira foi reaberto ao público no sábado, com exposição sobre a artista Elke Maravilha (1945-2016), palestra e música. De acordo com a prefeitura local, a solenidade de reinauguração marcou um importante momento para a cultura e o turismo de Itabira, já que o prédio do início do século 19 se confunde com a história da cidade, pois ficava ali a primeira sede da Câmara Municipal. Em 1971, o sobrado passou a sediar o Arquivo Público Municipal – e se tornou um elemento importante na preservação da identidade itabirana. A mostra sobre Elke, nascida na Rússia e que, ainda criança, chegou ao Brasil para morar com a família em um sítio em Ipoema, distrito de Itabira, inclui roupas, calçados e acessórios (alguns deles confeccionados por ela). O museu fica na Avenida Carlos Drummond de Andrade, 666, no Centro.