Enquanto atingidos pela tragédia de Mariana comemoram o acordo que prevê a suspensão do prazo de prescrição para ações indenizatórias de quem teve sua vida revirada após o rompimento da Barragem do Fundão, advogados que se preparam para levar o caso a tribunais europeus veem no fato um avanço muito tímido às vésperas dos três anos da pior catástrofe socioambiental da história brasileira. O acordo foi celebrado sexta-feira entre o Ministério Público em níveis federal e estadual, a Defensoria Pública, a Samarco, que operava o barramento de rejeitos de minério de ferro que se rompeu, suas controladoras, as mineradoras Vale e BHP Billiton, e a Fundação Renova, criada pelas companhias para lidar com os reflexos da catástrofe.
Sócio do escritório anglo-americano SPG Law, que prepara ação nas cortes da Inglaterra e do País de Gales contra a BHP Billiton SPL, braço britânico da gigante BHP, controladora da Samarco, o advogado Tom Goodhead avalia que a notícia do fim da prescrição é muito boa, mas não garante justiça aos atingidos. “Ficamos felizes com a notícia. Mas nada mudou: não há indenização, só mais promessas. A mesma velha história. E o nosso processo (internacional) é contra a (britânica) BHP Billiton SPL, que não foi signatária do acordo. Portanto, para nós o prazo de prescrição segue sendo 5 de novembro, quando a tragédia completa três anos”, afirmou. Como o Estado de Minas antecipou com exclusividade, o processo internacional preparado pelos advogados estrangeiros deve ser proposto até o próximo dia 1º.
Após a assinatura do acordo, o chefe da força-tarefa do Ministério Público Federal encarregada de investigar o rompimento da barragem, procurador José Adércio Leite Sampaio, disse que “oportunistas” procuravam atingidos pela tragédia e lhes diziam que haveria prescrição no próximo dia 5, quando a tragédia completa três anos. “As empresas, de maneira irretratável, afirmam que não há prescrição. Para tirar qualquer dúvida, fizemos esse acordo”, acrescentou. Segundo o procurador, é preciso que as pessoas não se submetam “a oportunistas que tentam ganhar dinheiro com a tragédia”.
HABILITAÇÃO O compromisso assinado pelas empresas também deixa claro que pessoas até o momento não cadastradas como atingidas ainda poderão se habilitar como candidatas à reparação. Com isso, elas teriam suas situações analisadas de modo criterioso ao longo do processo de repactuação previsto no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) Governança – homologado pelo Judiciário Federal em 3 de agosto passado.
Diante dos comentários, o advogado Tom Goodhead se disse surpreso com a classificação de “oportunistas” dirigida a advogados que alertam sobre o risco da proximidade do prazo de prescrição. “Achei isso algo chocante de se dizer. Só na SPG Law são 500 advogados dedicados à ação contra a BHP Billiton SPL, todos profissionais e trabalhadores comprometidos em obter justiça para os clientes. Em vez de criticá-los, por que não explicam aos atingidos o motivo de não terem conseguido nenhuma compensação após três anos do desastre?”, questionou, afirmando que o escritório pretende defender advogados brasileiros de ataques do tipo.
Com a ação internacional, o escritório SPG Law espera obter cerca de 5 bilhões de libras (cerca de R$ 24 bilhões) em indenizações para os atingidos pelo desastre, em um prazo máximo de dois anos. Segundo os advogados internacionais, não haverá custos para pessoas que aderirem à ação. O rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, despejou cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro e lama na Bacia Hidrográfica do Rio Doce, atingindo também a costa brasileira. Morreram 19 pessoas na tragédia e cerca de 500 mil foram atingidas.