“Todos confirmaram que fazem esse download e o armazenamento porque gostam. Nenhum deles negou a prática. Gostam e não conseguem se controlar. Sabem que podem ser presos a qualquer momento e já esperam por isso. Quando chegamos às casas, antes de falarmos qualquer coisa, diziam que tudo o que precisávamos estava lá, mostrando os computadores”, afirmou a chefe da Divisão de Orientação e Proteção à Criança e ao Adolescente (Dopcad), Isabella Franca Oliveira. Segundo ela, as imagens são fortes e contêm cenas de sexo explícito e até de crianças e adolescentes mantendo relações com animais.
Os suspeitos compartilharam quantidades diversas de conteúdos. Num período que variou entre seis meses e um ano, foram entre 600 e mais de 30 mil arquivos. O único nome divulgado entre os suspeitos é justamente o do campeão desses compartilhamentos, o médico Fábio Lima Duarte, de 36 anos, considerado o alvo de maior vulto pela polícia, o que mais chama a atenção e sobre quem há ainda várias perguntas sem respostas. Foram cerca de 33 mil imagens compartilhadas em um ano. De acordo com a delegada, foram encontradas onde ele mora, no Bairro Ouro Preto, na Pampulha, várias fotos dele tendo relação sexual com adolescentes, na própria casa. “Ainda não identificamos crianças nessas cenas, mas adolescentes é possível afirmar. Ele fala que as relações foram consentidas, mas só produzir e manter em posse dele essas imagens já configuram crime”, relatou.
EXAMES GRAVADOS Outro ponto que chocou os policiais foi o fato de, segundo a delegada, Fábio Duarte afirmar que tem esse tipo de material, que adquire de maneiras diversas, desde que era adolescente. A investigação vai apurar ainda a quais consultórios o médico, que é clínico geral e fazia exames de imagem, está ligado. Informações preliminares dão conta de que ele atendia em Betim. Entre o material apreendido estão vídeos de pacientes fazendo exames, entre eles ultrassons e mamografias. “Ele informou que as vítimas eram gravadas por ele, nos consultórios, com câmeras escondidas, sem o consentimento das mulheres”, contou Isabella Franca.
Por causa desses fatos, uma nova investigação terá início. “Vamos apurar a suposta prática de estupro de vulnerável e importunação ao pudor. Se houver alguma paciente que tenha percebido conduta diferente durante consulta ou exame pode nos ajudar, pois, muitas vezes, as mulheres sentem que há algo errado, mas ficam em dúvida e preferem não denunciar”, afirmou a delegada Renata Ribeiro Fagundes, da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca).
A Corregedoria da Polícia Militar também acompanhou a ação, por causa do envolvimento de um sargento reformado de Betim e de um cabo da ativa de Nova Lima. Um deles compartilhou mais de 8 mil arquivos. “Vamos oportunizar aos policiais a ampla defesa e o direito ao contraditório, num processo administrativo e disciplinar. A PM não coaduna com esse tipo de prática”, afirmou o subcorregedor da PM, tenente-coronel Gláucio Porto Alves. Nesse processo, será definida a permanência ou não dos suspeitos nos quadros da corporação. O militar da ativa pode ser excluído e o reformado perder a patente. As investigações criminais ficam a cargo da Polícia Civil.
A defesa dos acusados não foi localizada. Os suspeitos foram transferidos ontem à tarde para a penitenciária. Na saída da delegacia, questionados pela imprensa sobre a procedência da acusação, os seis detidos em BH, incluindo o médico, ficaram em silêncio. Os militares estão detidos em quartel. O crime de armazenamento está previsto no artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e prevê pena de 1 a 4 anos de prisão. Se houver compartilhamento do conteúdo, a pena é aumentada para 3 a 6 anos. Em caso de produção de imagens, crime do qual o médico é acusado, o tempo de detenção passa para 4 a 8 anos. Já o estupro de vulnerável prevê reclusão de 8 a 15 anos. “Nada que é feito pela internet fica escondido. Tudo é rastreável”, ressalta a delegada Isabella Franca Oliveira.