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Estado de Minas

Prefeituras atingidas pelo desastre de Mariana dizem que estão sendo intimidadas

Municípios afetados alegam que estão sendo pressionados pela Fundação Renova a extinguir e abandonar ações


postado em 16/11/2018 06:00 / atualizado em 16/11/2018 08:26

Moradores de Bento Rodrigues, distrito de Mariana arrasado pelo rompimento da Barragem do Fundão, ainda aguardam a indenização(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press )
Moradores de Bento Rodrigues, distrito de Mariana arrasado pelo rompimento da Barragem do Fundão, ainda aguardam a indenização (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press )

Prefeituras que integram o grupo de 39 municípios atingidos pelo rompimento da Barragem do Fundão, que era operada pela mineradora Samarco, em Mariana, Região Central de Minas, denunciam que estão sendo vítimas de pressão e intimidação pela Fundação Renova. A organização, criada em 2016 para coordenar e executar a reparação dos danos provocados pela ruptura do barramento, teria emitido para as administrações municipais, nesta semana, um termo de transação, quitação e exoneração de responsabilidade, que condiciona a liberação de R$ 53.344.331 à extinção e abandono de ações na Justiça nacional e internacional contra a própria Renova, a Samarco e suas operadoras, as mineradoras Vale e BHP Billiton, com efeito sobretudo sobre processos movidos no exterior.

Os recursos são referentes aos gastos que os municípios contraíram para auxiliar a população atingida pelo maior desastre socioambiental da história do país, prover abastecimento e reparar emergencialmente estruturas destruídas. Um valor que foi previsto pelo Termo de Transação de Ajustamento de Conduta (TTAC), celebrado entre as mineradoras, os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, a União e seus órgãos ambientais. Os advogados do escritório anglo-americano que processa a BHP Billiton nas cortes do Reino Unido, como o Estado de Minas mostrou com exclusividade, afirmaram que vão acionar a Renova e a BHP nos tribunais do Brasil e da Inglaterra, diante da pressão denunciada pelos municípios, 21 dos quais aderiram ao processo internacional.

O EM teve acesso ao termo emitido a prefeitos, um documento de timbre da Fundação Renova, com nove páginas e que deveria ser preenchido em três vias por cidade. Segundo as condições impostas nas cláusulas, apenas com essa adesão as administrações poderão ter acesso aos recursos de compensação pelo empenho de recursos, pessoal, maquinário e gastos como a abertura de estradas enlameadas, captações de água arruinadas, pontes derrubadas, abrigo a pessoas desalojadas, logística de doações e ações de defesa civil. Do total, R$ 12.185.686 serão destinados aos municípios do estado do Espírito Santo e R$ 41.158.645, aos mineiros. As prefeituras não se pronunciaram oficialmente, temerosas de mais retaliações relacionadas a recursos emergenciais pagos pela fundação.

No parágrafo oitavo do documento, a Fundação Renova estabelece que “o município renuncia a quaisquer outros direitos eventualmente existentes, presentes ou futuros, para nada mais reclamar em tempo e lugar algum, a qualquer pretexto, em relação a alocações e gastos públicos extraordinários decorrentes do rompimento”. Com isso, a fundação e suas mantenedoras estariam “desobrigadas inteiramente, com validade e eficácia no Brasil e em qualquer outra jurisdição estrangeira”. Diante da assinatura do termo, “o município se compromete a não tomar qualquer medida adicional” acerca desses gastos extraordinários, bem como desistir, dentro de 10 dias, de outras ações já em curso contra os mesmos réus.


Até esse ponto o termo parece resguardar a Renova e as mineradoras de ser processadas após terem pago um recurso proveniente de acordo. Contudo, alguns municípios informaram que as ações na Justiça “são lícitas e necessárias para que a reparação seja justa e completa”. O termo é ainda mais incisivo quanto ao processo nas cortes da Inglaterra e do País de Gales. Nesse processo, os advogados do escritório SPG Law buscam reparações acima de 5 bilhões de libras (mais de R$ 24 bilhões) contra a BHP Billiton PLC, o braço britânico da gigante da mineração que divide com a Vale o controle da Samarco.


TENTATIVA DE SUBORNO?
Apesar de ainda não ter sido sequer citada no processo, o nome da companhia estrangeira já consta nominalmente no termo emitido pela Fundação Renova. “O município, neste ato, desiste da ação coletiva movida perante a High Court of Justice em Liverpool – Reino Unido contra a BHP Billinton PLC, BHP Billiton Brasil Ltda., Samarco Mineração S.A., BHP International Finance Corp., BHP Minerals International LLC e Marcona Intl. S.A.”, diz trecho do documento. E o texto prossegue, indicando que a prefeitura deverá “comunicar tal desistência às cortes inglesas e a quem mais se fizer necessário”.

O sócio inglês do escritório, Tom Goodhead, considerou essa como “uma ação catastrófica” adotada pela Renova e suas mantenedoras. “Todos os prefeitos com quem conversamos acham que esse termo vai contra suas obrigações legais. Isso soa quase como uma tentativa de suborno, com um recurso com o qual a fundação é obrigada a pagar de qualquer jeito”, considera o advogado.

Ele alerta que as ações na Justiça não se restringem aos gastos extraordinários, extinguindo também os pedidos de reparação por perda de arrecadação fiscal e investidores que partiram, por exemplo. Goodhead calcula que os ganhos para os municípios com a ação nas cortes do Reino Unido podem ser de 50 a 100 vezes maiores do que os obtidos com o termo de ajuste de conduta firmado no Brasil. E ataca também a forma como a Renova e suas mantenedoras agiram. “Tentaram enganar as prefeituras, exigindo que desistissem da ação na corte de Liverpool para receber o recurso (do TTAC). Como nós (do escritório SPG Law) somos os representantes legais desta causa, deveriam ter nos contatado primeiro e não diretamente aos nossos clientes. Uma atitude rasteira, que no Reino Unido pode ser considerada antiética”, define.


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