O crescimento do Vetor Sul de Belo Horizonte, nos limites com Nova Lima, traz efeitos colaterais que a cada dia mais testam a paciência de quem precisa se deslocar por bairros como Belvedere, em BH, e Vila da Serra, na cidade vizinha da região metropolitana. A principal consequência da ocupação desenfreada se mostra principalmente na junção da BR-356 com a Avenida Raja Gabaglia, que já não tem mais horário de congestionamento, já que o nó no trânsito extrapola os períodos de pico, estendendo-se por quase todo o dia.
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Excesso de carros de apps não facilita mobilidade e congestiona trânsito, diz pesquisaBelo Horizonte supera 2 milhões de veículosPolícia Militar prende autores de roubo no Bairro BelvedereEm março de 2017, o Ministério Público firmou um acordo com a Prefeitura de Nova Lima e a BHTrans para destinar recursos de empreendimentos imobiliários da região a projetos e obras de mobilidade para a confluência dos bairros Belvedere e Vila da Serra. Segundo a promotora Marta Alves Larcher, coordenadora das Promotorias de Justiça de Habitação e Urbanismo do MP, depois que foi definido um termo de referência para contratação de projetos executivos para as obras, a Associação dos Empreendedores do Vila da Serra e do Vale do Sereno foi chamada a escolher uma empresa para detalhar as intervenções a serem adotadas na região. A mesma associação foi responsável pela construção da trincheira de acesso da MG-030 para a BR-356, no sentido Savassi. “A empresa foi escolhida e já assinou contrato, com prazo de 120 dias.
Enquanto a BHTrans não se manifesta, Rodrigo Coelho, diretor da Fratar Engenharia Consultiva, empresa escolhida para fazer os estudos, adianta que uma das possibilidades para melhorar o trânsito da região a curto prazo é a inversão de fluxos no viaduto da Raja Gabaglia sobre a BR-356, situação segundo ele comum nos Estados Unidos, designada com a sigla DDI (Diamond Diverge Interchange). Coelho sustenta que a alternativa eliminaria a confluência de veículos que precisam passar embaixo ou sobre o elevado, atualmente configurado no estilo trevo de quatro folhas. “Essa solução funciona bem até atingir sua capacidade, mas quando aumenta muito tem entrelaçamento de veículos em cima e embaixo. Dessa forma, se a capacidade é de, por exemplo, 1 mil por veículos por hora, ela se reduz para 400 por esse estrangulamento”, afirma. Na proposta do DDI (veja arte) ele explica que semáforos regulam os pontos de inversão do fluxo.
Ainda segundo Rodrigo Coelho, o que justifica a necessidade de uma intervenção que traga efeitos a curto prazo na região é a expansão muito grande dos horários de congestionamento naquele ponto.
Por dentro do nó
Veja principais problemas do cruzamento entre a BR-356 e a Avenida Raja Gabaglia, que testam a paciência dos motoristas
1 - O maior gargalo está no sentido Savassi. Quem segue pela BR-356 e fica à direita, com intenção de pegar a Raja Gabaglia no sentido Centro de BH, encontra motoristas saindo da avenida em direção à rodovia. Essa confluência causa filas que se prolongam em vários momentos do dia.
2 - No sentido Rio há o mesmo problema, porém, a frequência é menor e ele ocorre normalmente à tarde. Mas, nesse caso, o perigo é bem maior. Motoristas que seguem na rodovia e querem ir para o Belvedere ou Nova Lima se mantêm à direita, mas a disputa por espaço com quem sai do bairro para pegar a 356 cria congestionamento. O problema é que os carros que chegam à fila frequentemente em alta velocidade, freando de maneira brusca.
3 - As filas no sentido Rio da BR-356 costumam criar um conflito entre motoristas que querem seguir na Raja Gabaglia à direita (ruo ao Buritis, por exemplo) e aqueles que querem ficar na faixa que vai levar ao viaduto, para seguir para Nova Lima ou Belvedere
AVENIDA DIVIDE COMUNIDADE
As alternativas estudadas para a região de confluência dos bairros Belvedere, em Belo Horizonte, e Vila da Serra, em Nova Lima, não se restringem a mudanças no trevo do BH Shopping: incluem uma intervenção de grande porte, com potencial para mudar a realidade da região. Empreendedores e a Prefeitura de Nova Lima defendem o uso da linha férrea que fazia parte do antigo ramal ferroviário Águas Claras para construir uma via expressa em duas etapas. A primeira iria da BR-356 à Alameda Oscar Niemeyer, criando um acesso que evitaria a passagem pelo trevo do BH Shopping. A segunda etapa integraria o que a administração de Nova Lima chama de via estruturante, do Vila da Serra até o Centro da cidade, obra que é um dos objetivos do plano de mobilidade do município da região metropolitana. As obras, porém, enfrentam oposição severa de parte da comunidade local.
Moradores do Belvedere e do Vila da Serra defendem o uso da área por onde passam os trilhos para implantar um parque linear, sob o argumento de que construir uma avenida abriria espaço para um crescimento ainda maior da região, sem nenhum tipo de controle. Os críticos do projeto sustentam que a nova via daria acesso a uma série de terrenos hoje sem opções viárias, o que contribuiria diretamente para pressionar ainda mais o gargalo da mobilidade, em vez de resolvê-lo.
A primeira parte do que seria uma futura via estruturante ligando a BR-356 ao Centro de Nova Lima, como alternativa à MG-030, é conhecida inicialmente como Via 20 nos estudos que estão em andamento (veja arte). A intenção é aproveitar a área de domínio da linha férrea, desde o pontilhão com a BR-356 até o elevado da Alameda Oscar Niemeyer, ponto onde Vila da Serra e Belvedere se encontram. Essa é a parte estudada pela Fratar Engenharia Consultiva, contratada pela Associação dos Empreendedores do Vila da Serra e Vale do Sereno para atualizar estudos e desenvolver projetos executivos para intervenções de mobilidade na região, a partir de acordo com o MP, do qual também participam a BHTrans e a Prefeitura de Nova Lima.
AVENIDA TRARÁ MAIS PROBLEMAS Participante ativo das discussões na Associação dos Amigos do Bairro Vila da Serra (Amavise), Alvaro Gonzaga, que é morador do bairro, diz que esse seria o ponto de partida para criar acesso a uma série de terrenos ainda sem opções viárias na região de Nova Lima. Essa medida tem, segundo ele, potencial inimaginável para aumentar a pressão sobre a região, pois abriria espaço a inúmeros empreendimentos. “O Vila da Serra passou a ser uma extensão da Zona Sul de BH. As pessoas moram ali, mas não têm Nova Lima como trabalho e destino. Ou seja, todo o passivo urbano de quem mora lá deságua em BH. Não somos contra o crescimento, somos contra o crescimento irracional”, diz ele.
Diante da situação, moradores como Alvaro querem a criação de um parque linear na área da linha férrea, o que também é defendido pela Associação dos Amigos do Bairro Belvedere. O presidente da entidade, Ubirajara Pires Glória, pontua que construir uma avenida no local dos trilhos iria contra duas normas em curso: uma que preserva a estação ecológica que serve como amortecimento para as matas do Jambreiro e do Cercadinho e outra que prevê o uso de linhas férreas apenas para casos em que o empreendimento possa ser revertido, se houver necessidade de reativação dos trilhos. “A via estruturante (defendida pela Prefeitura de Nova Lima e empreendedores) abre caminho para outros empreendimentos.
Rodrigo Coelho, diretor da empresa Fratar Engenharia, contratada pelos empreendedores da região para estudar melhorias de mobilidade para o trânsito do Belvedere/Vila da Serra, defende a construção do que ele chama de Via 20, da BR-356 até o Vila da Serra. “A via recebeu críticas porque moradores acreditam que vai virar a avenida dos empreiteiros, mas tecnicamente não foi essa a origem. Ela foi realmente embasada em uma solução para a região do Belvedere e Vila da Serra, e acho que é uma solução viável a médio prazo para melhorar a mobilidade da região”, afirma.
A implantação da avenida ainda aponta para um horizonte distante, já que, segundo a promotora de Justiça Marta Alves Larcher, coordenadora das Promotorias de Justiça de Habitação e Urbanismo do Ministério Público, trata-se de uma obra para mais de R$ 20 milhões, dinheiro que não existe no fundo criado para receber contrapartidas dos empreendimentos da região. Hoje, o fundo tem cerca de R$ 1,8 milhão, conforme o MP. A obra teria que ter aval da Prefeitura de BH, já que o trecho da linha férrea passa pelo município de Belo Horizonte, e também oferta de recursos, em um momento de crise financeira e torneiras fechadas para grandes obras.
Nova Lima defende projeto
A Prefeitura de Nova Lima pretende aprovar até abril do ano que vem seu plano de mobilidade, instrumento para disciplinar as intervenções que a administração municipal considera importantes para ordenar o trânsito da cidade da Grande BH. Entre as intervenções previstas, destaca-se a via estruturante que compreende o trecho de avenida estudado atualmente, seguindo a linha férrea entre o Belvedere e o Vila da Serra, mas é ainda maior, chegando ao Centro de Nova Lima, para se transformar em uma opção à já saturada MG-030. Diferentemente do que entendem moradores da região afetada, a diretora de Fiscalização de Obras de Nova Lima, Ana Paula Guerra Rezende, destaca que essa via estruturante não foi pensada para atender à especulação imobiliária, mas sim para apresentar soluções para a mobilidade, até porque já existe uma série de empreendimentos aprovados para a região que vão aumentar ainda mais a demanda na área.
“A via estruturante vem junto com a reformulação do Plano Diretor de Nova Limam, e a revisão do plano tem que considerar o adensamento da região. Não adianta fazer a via e adensar ainda mais. Estamos fazendo um trabalho de simulação com uma empresa especialista em trânsito, sobre o que vai ocorrer em cinco anos, 10 anos. O objetivo é evitar que isso vire um problema ainda maior nesse período”, diz Ana Paula. Ela também destaca que é possível construir a avenida em paralelo ao parque linear defendido pela população local.
Já há negociações, tanto em Nova Lima quanto em BH, para que a Superintendência de Patrimônio da União (SPU), responsável pelo ramal ferroviário, ceda a área tanto para a Prefeitura de BH quanto para a de Nova Lima. No primeiro caso, o objetivo seria viabilizar o parque e no segundo, garantir o caminho da avenida, mas ainda não há definição sobre o destino dos trilhos.
“É importante dizer que a gente não tem como proibir todos os investimentos naquela região agora, até porque a Zona Sul de Belo Horizonte é Nova Lima. O Plano Diretor de Nova Lima permite hoje uma série de novos empreendimentos, que a gente precisa tratar. Aquela região virou uma cidade e não fazer nada é um problema. Não adianta tapar o Sol com a peneira”, acrescenta Ana Paula.
Especialista pede um basta ao crescimento
Ao analisar o futuro da mobilidade da região dos bairros Belvedere e Vila da Serra, o coordenador do Núcleo de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende, destaca que não vê soluções viáveis do ponto de vista de obras, e aponta a necessidade de restrição da ocupação no Vetor Sul da capital. “Estamos falando de um nó que tende a aumentar. A única forma de minimizar é restringir movimentos e nesse ponto a implantação do parque é a alternativa que restringe movimentos. Ali a questão é muito simples: são muitos empreendimentos para pouco espaço. Quando olho para o futuro daquelas ocupações em Nova Lima, não vejo solução para aquilo”, afirma Resende.
A promotora de Justiça Marta Alves Larcher reforça a necessidade de rever as legislações de uso e ocupação do solo de BH e de Nova Lima, para conter a proliferação de empreendimentos com potencial para aumentar consideravelmente a população local. “Imagino muita dificuldade nessa alteração, porque é uma área valorizada pelo mercado imobiliário. Seria importante que os municípios atuassem para modificar a ocupação, mas sabendo que vão encontrar grande resistência do mercado e de proprietários de terra que têm expectativa (de negócios na região)”, completa.
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