O evento, que ocorreu na tarde desta sexta-feira no sistema prisional mineiro, vai muito além de uma competição de beleza: trata-se um projeto de valorização da mulher e celebração da diversidade, independentemente dos padrões. Ao lado de Ingrid, outras cinco detentas participaram da final, realizada no Complexo Penitenciário Feminino Estevão Pinto, no Bairro Horto, na Região Leste da capital.
O uniforme vermelho foi deixado de lado para dar lugar a um belo vestido de festa, uma coroa brilhante e um sorriso no rosto. “Daqui já começo a fazer planos de novas escolhas. Quero ser esteticista, abrir um negócio, dá muito orgulho para minha mãe porque a fase adolescente rebelde já passou”, contou Ingrid, detenta há um ano e oito meses.
Ela foi condenada a 13 anos por homicídio.“Sempre tive de tudo”, disse, arrependida do passado, mas esperançosa em relação ao futuro. Ela não conteve as lágrimas ao abraçar a mãe quando recebeu o título de miss. “Uma simples frase que ela falou se tornou meu combustível. Aí eu vi que existe alguém que acredita em mim”, contou. E a mãe também chorou emocionada: “Não queria que fosse aqui, mas já que veio aqui, está ótimo”, contou Cláudia Pereira da Silva, de 43, que chorou emocionada.
O diretor de ensino e profissionalização da Secretaria de Administração Prisional, Lucas Eduardo Pereira Silva, explica que o projeto existe desde 2013 e esta é a quarta edição. “O projeto contempla duas etapas: a teórica e a prática. A teórica abordou a discussão sobre o empoderamento feminino, a violência contra a mulher e o próprio encarceramento da mulher. A prática é o concurso”, explicou. A etapa teórica funciona para transformar o concurso de beleza e desconstruir os padrões.
MULHER TRANS Foi a primeira vez que o concurso contou com a presença de uma mulher transsexual. Ela não competiu pela coroa, mas, subiu aos palcos e foi muito aplaudida. "Ser a primeira mulher trans e negra aqui é um grande passo. É mais um degrau da vida que posso subir. Só quero conquistar meu espaço lá fora", disse Thaís Camargo.
O segundo lugar ficou para Raíssa Ferreira, de 24, representante do Complexo Penitenciário de Ponte Nova, no Vale do Rio Doce. “Quando estamos encarceradas, nos esquecemos da nossa beleza, ficamos sem autoestima. Esse evento vem para nos levantar, nos ajudar a libertar nossa beleza. Tinha quatro anos que eu não me arrumava”, contou a jovem, que usou um vestido azul de pedras. O terceiro foi para Aline de Matos Reis, de 31, que levava o nome do Presídio de Eugenópolis, no Vale do Rio Doce.
Ao todo, 53 mulheres se candidataram e participaram das seletivas. Vinte e seis unidades prisionais participaram das etapas regionais, realizadas nas regiões da Zona da Mata, Campo das Vertentes, Sul, Triângulo Mineiro, Norte e Região Metropolitana de Belo Horizonte.
“É uma conquista delas, para que elas saiam daqui sabendo que existe uma nova chance, uma nova vida, uma nova oportunidade lá fora. Nosso trabalho não é de ressocialização, mas de socialização, para que elas não retornem para um presídio”, concluiu Juliana Camargos, diretora-geral do Complexo Penitenciário Estevão Pinto.