Moradores de Conceição do Mato Dentro, na Região Central de Minas, visitantes e autoridades participam, ao longo deste sábado, das solenidades de reabertura da Matriz de Nossa Senhora da Conceição, que tem seu dia celebrado hoje e é padroeira do município. A construção de mais de 300 anos, considerada uma joia do Barroco mineiro, foi totalmente restaurada. A festa começou às 6h, com alvorada com toques de sinos, fogos e banda de música, no Santuário Bom Jesus do Matosinhos, seguindo-se o momento mariano com a coroação de Nossa Senhora e apresentação do coral Cidade dos Profetas da cidade de Congonhas. A procissão com a imagem da santa teve início às 9h, saindo do santuário em direção à Matriz Nossa Senhora da Conceição
Outros pontos importantes deste sábado em Conceição do Mato Dentro: às 10h, houve a entrega das chaves da Matriz Nossa Senhora da Conceição e abertura das portas, com a celebração da dedicação ou sagração da igreja. À noite, às 19h, será celebrada a missa no adro da Matriz Nossa Senhora da Conceição e encerramento ocorre às 20h45, com um concerto a cargo do coral Cidade dos Profetas. À frente das solenidades estão o arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Diamantina e administrador apostólico da Diocese de Guanhães, dom Darci José Nicioli e o titular da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, vinculada à diocese de Guanhães, padre João oão Evangelista dos Santos. A festa conta com a presença do secretário de Estado da Cultura, Angelo Oswaldo.
Preservação
A restauração dos elementos artísticos do templo se tornou possível graças ao termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado entre o Ministério Público de Minas Gerais, por meio dos promotores de Justiça Marcos Paulo de Souza Miranda, ex-coordenador das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico (CPPC), hoje na comarca de Santa Luzia, na Grande BH, e Marcelo da Matta Machado, de Conceição do Mato Dentro. O valor histórico e cultural é ressaltado pela comunidade, e as pinturas internas foram consideradas “uma das mais encantadoras e delicadas do patrimônio de arte religiosa do país” pelo primeiro presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o advogado, jornalista e escritor Rodrigo Melo Franco de Andrade (1898-1969).
Tombada em 1948 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e interditada desde 2005, a igreja com mais de 300 anos e em restauração há cinco anos e meio, exibe agora todo seu esplendor barroco, com destaque para os douramentos do retábulo da capela-mor, os anjos em policromia e as 10 pinturas contando a vida de Nossa Senhora e de Jesus, as quais estavam escondidas sobre camadas e tintas e vieram à tona durante as obras. Com o fim das obras, na qual trabalharam 50 pessoas, a imagem da padroeira, Nossa Senhora da Conceição, também restaurada, retornou ao altar.
O encantamento de quem vê a igreja recuperada não tem limite, principalmente para a equipe do Estado de Minas que acompanhou, desde o início, a luta da comunidade e da paróquia para impedir a ruína da construção Na época, eram assustadores os problemas estruturais e a deterioração dos elementos artísticos. Entre as questões mais graves estavam a torre, a cobertura e o madeirame, que cedia lentamente, com risco de desabar. Os recursos para salvar a matriz provêm da mineradora Anglo American, por meio de uma medida compensatória firmada com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), e também da prefeitura local e da Paróquia Nossa Senhora da Conceição. No total, foram gastos cerca de R$ 10 milhões, sendo que os serviços, com supervisão do Iphan, ganharam mais força de dois anos para cá, a cargo da Cantaria Conservação e Restauro. O montante inclui recursos da Paróquia Nossa Senhora da Conceição e um aporte de R$ 350 mil da prefeitura local.
Satisfeita com o resultado, a restauradora Dulce Senra enumerou as obras concluídas, como os altares colaterais (lado direito de quem olha para o altar), dedicado a São Miguel Arcanjo, antes conhecido como do Sagrado Coração de Jesus e o de Nossa Senhora do Rosário, antes de São Francisco. Tábuas com desenhos vermelhos, pretos e ocre, num estilo que lembra as chinesices, foram minuciosamente trabalhadas, de forma a completar a lateral do arco-cruzeiro. Derivada da palavra francesa chinoiserie, chinesice é o conjunto de pinturas que recriaram, no século 18, em igrejas e capelas de Minas, os pagodes ou pagodas (tipo de torre com fins religiosos comuns na China e outros países da Ásia), animais e paisagens.
Na complementação da obra, foram implantados projetos luminotécnicos, interno e externo, jardinagem, além de drenagem externa e limpeza do piso interno, e sistema de monitoramento por circuito fechado de tevê, informou o coordenador da obra pela empresa, o engenheiro civil Alexandre Leal.
Descobertas
São demais os mistérios que permeiam a construção de uma igreja barrocas e muitas as descobertas para quem tem a curiosidade de admirar cada detalhe. Na Matriz Conceição do Mato Dentro, no camarim que abriga a imagem da padroeira, na capela-mor, pode-se agora ver a “mandorla” ou um pequeno arco que surpreende pela beleza, com um conjunto de 10 anjinhos de madeira. No forro camarim, sobressai a representação da Santíssima Trindade, um triângulo, e a pomba símbolo do Divino Espírito Santo. Merecem destaque, na base do retábulo, as duas aves fênix douradas, “que estavam escuras”, conforme a equipe, e os belos anjos barrocos, além das colunas laterais.
Há pouco mais de um ano, em 8 de novembro de 2017, os moradores de Conceição do Mato Dentro e convidados conheceram parte do restauro da matriz. Livre dos andaimes, a Capela do Bonfim, no interior do templo, que funciona como sacristia, foi reinaugurada depois de obras que deram mais beleza às pinturas parietais originais recriando a Paixão de Cristo. No forro, podem ser contempladas a figura de Verônica e as representações das três virtudes (fé, esperança e caridade) e dos cinco sentidos emoldurando a Sagrada Família. Quem passa pela rua não deixa de contemplar as fachadas pintadas de tinta nova, branca, o relógio inglês de 200 anos, restaurado, que aciona o sino e marca a vida da população e as pedras largas reassentadas no piso do adro.
Hoje, na totalidade, é impossível não ficar horas admirando, na capela-mor, em tons avermelhados, dourado e sépia, as cenas bíblicas da Natividade: Anunciação do Anjo Gabriel à Virgem Maria, Visita a Santa Isabel, Adoração dos Pastores, Visita dos Reis Magos, Fuga para o Egito e outras que encantam pela história sagrada e beleza da criação e pelo esmero no trabalho dos especialistas em ação. É bom lembrar essas pinturas parietais, feitas diretamente sobre a madeira estavam cobertas de camadas de tinta.
Conforme as pesquisas recentes, o trabalho em policromia foi encoberto, em 1816 e 1933, por camadas de tinta. O artista que fez as pinturas retratadas nos azulejos copiou as gravuras do livro de Bartolomeo Ricci, de 1607. Muito usadas como modelo pelos artistas coloniais, os especialistas verificaram que “as gravuras de Ricci estão nas parietais da matriz e reproduzidas com muita fidelidade ao original, com algumas modificações em que o autor coloca sua interpretação pessoal”. As figuras humanas, por exemplo, têm anatomia mais atarracada, com pequenas modificações nas vestes.
Programação deste sábado:
19h – Missa no adro da Matriz Nossa Senhora da Conceição
20h45 Concerto com o coral Cidade dos Profetas
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