Socorro a vítimas de quatro atropelamentos, uma pessoa em overdose, um idoso vítima de mal súbito e um amigo contundido. Esse era o currículo do monitor escolar Marcos Henrique de Oliveira até quinta-feira, quando se tornou herói e encarou o maior desafio desde que se habilitou, em 2014, para a função de socorrista civil, a que se dedica sem qualquer remuneração, inspirado pela mãe. Formado no 3º Batalhão do Corpo de Bombeiros de Minas, no qual se inscreveu apenas pelo desejo de ajudar pessoas em risco, ele foi o responsável por salvar, com apoio de outras duas pessoas, cinco crianças e um casal na Avenida Nossa Senhora do Carmo, no Bairro Sion, Zona Sul de BH, onde uma árvore caiu sobre cinco veículos durante a tempestade, matando o motorista Ranur Pierre da Silva Carneiro, de 28 anos, que conduzia um escolar. “Sabia que havia riscos por causa dos fios energizados. Mas eu estava de botas e as crianças, dentro da van. Agi o mais rápido possível”, conta o jovem de 22 anos, morador do Bairro Flamengo, em Ribeirão das Neves, na região metropolitana.
O dia seguinte ao ato de coragem ficou marcado por cansaço, mas também por muitas homenagens. “Tive dificuldade para dormir naquela noite, porque a adrenalina estava alta. Mas acordei mais tranquilo, por ter salvado as sete pessoas. Recebi muitas mensagens de familiares e amigos”, relata Marcos Henrique. O salvamento também foi lembrado pelo sargento Robson de Paula, do 3º Batalhão do Corpo de Bombeiros, situado na Avenida Antônio Carlos, onde o militar, que foi professor de Marcos Henrique, se dedica a um curso básico de primeiros socorros há mais de uma década.
Para Marcos, respeito ao código de conduta e tomada de decisão rápida marcaram o resgate das cinco crianças e dois adultos. O socorrista estava em um ônibus da linha 5106 (Bandeirantes/BH Shopping) quando percebeu o acidente. “As pessoas gritaram e eu pedi ao motorista para descer pela porta do meio”, detalha. Ao chegar ao outro lado da avenida, ele checou as condições para o socorro e tentou se assegurar de que não havia risco. Apesar dos fios elétricos no chão, o rapaz avaliou que tanto ele quanto as vítimas contavam com isolamento e relativa segurança – proporcionados por uma bota que ele usava e pelos carros onde as vítimas estavam –, o que minimizaria a possibilidade de acidentes com a eletricidade. Seu principal receio era de que outras árvores caíssem.
O próximo passo foi pedir a pessoas que estavam perto que acionassem o Corpo de Bombeiros para, depois, prestar o socorro. “O motorista da van (Ranur Carneiro) só me pedia para retirar as crianças. Os vidros já estavam quebrados pelo choque com a árvore, então retirei uma a uma. A última estava no banco da frente, com dificuldades para sair, pois estava presa ao cinto. Mas também consegui resgatá-la”, conta o socorrista. Ele conta que os pequenos foram levados à base da Polícia Militar ao lado do local da ocorrência, na Praça da Harmonia. Marcos Henrique ajudou, ainda, um casal a sair de um carro de passeio. Para isso, ele precisou quebrar o vidro do automóvel com uma cotovelada.
Ao retornar à van, a missão do jovem teve sua única baixa. “Falei com o motorista, mas ele já não me respondeu. Depois, chequei o pulso dele e não havia resposta, infelizmente”, recorda. Ranur permaneceu no veículo até que seu corpo foi resgatado mais de três horas depois da ocorrência, já que os bombeiros aguardaram o corte de energia para iniciar os trabalhos.
O socorrista pratica artes marciais em uma academia do Bairro Bom Jesus (Noroeste) e é monitor escolar em uma instituição do Bairro Sion. A vocação para ajudar pessoas necessitadas vem de família: a mãe de Marcos também é socorrista. Eles aturam em conjunto há dois anos, quando precisaram auxiliar um homem em overdose em Contagem, na Grande BH. “Ele estava em frente a um hospital privado, mas não queriam atendê-lo. Fomos nós que o salvamos.”
Além da morte do motorista, outra cena entristeceu o socorrista no seu dia de herói: muitas pessoas optaram por registrar a tragédia com seus celulares, em vez de ligar para os bombeiros. “Isso não ajuda. Em todo acidente é a mesma coisa. É lamentável, pois as pessoas preferem gravar a fazer algo verdadeiramente útil”, lamentou.