Jornal Estado de Minas

Semana da resolução sobre tarifa de ônibus em BH começa em clima de batalha

Valor das passagens na capital está congelado desde 2017, quando Alexandre Kalil anunciou que eventual reajuste só ocorreria após a abertura da "caixa-preta da BTHTrans" - Foto: Juarez Rodrigues/EM/DA Press

A semana que deve marcar a definição dos preços das passagens de ônibus em Belo Horizonte para 2019 começou em clima de batalha de bastidores entre a administração municipal, que prepara a divulgação dos resultados de uma auditoria sobre o setor, e as empresas de transporte, que sustentam estar amargando prejuízos com as atuais tarifas, congeladas desde o ano passado. Paralelamente, o movimento Tarifa Zero, que questiona os custos do serviço na capital e a planilha que remunera as concessionárias, anuncia para hoje a divulgação de um estudo que indicaria um ganho indevido de R$ 179 milhões pelas companhias de transporte no ano passado.

Ontem logo pela manhã, o prefeito Alexandre Kalil mandou um recado para as empresas em seu perfil no Twitter. “Se as empresas de ônibus fazem o que querem, vão receber o troco. Belo Horizonte tem governo”, escreveu. A mensagem veio em um tom acima do adotado pelo prefeito no fim da semana passada, ao anunciar que a “caixa-preta da BHTrans” havia sido aberta. Kalil garantiu que a decisão sobre o aumento ou não das tarifas para 2019 dependeria do que os números apontassem, mas adotou tom conciliador: “Nós não podemos levar o transporte público de BH como inimigo. São empresários e querem lucro.
Nós queremos a passagem mais barata e temos que ter a responsabilidade de não parar o transporte público na terceira capital do país”, disse, durante visita às obras de um centro de saúde.

Na tarde de ontem, a administração municipal divulgou informação que parecia se somar à mensagem publicada pelo prefeito mais cedo. “A Prefeitura de Belo Horizonte informa que foram aplicadas, de janeiro a novembro de 2018, 8.726 multas às empresas de ônibus, totalizando R$ 5.808.723,68, referentes à falta de cobrador em linhas e horários não autorizados. As multas estão sendo enviadas à Secretaria Municipal de Fazenda para as devidas providências”, informou comunicado da PBH. A viagem sem agente de bordo, popularmente conhecido como trocador, é permitida por lei durante o período noturno, entre as 20h30 e as 5h59, durante os domingos e feriados, em horário integral, e nos veículos do Move, mas passou a ser adotada irregularmente em situações não permitidas.

O aumento no número de punições impressiona, se comparado com as infrações registradas em todo o ano passado. As 8.726 multas aplicadas neste ano são aproximadamente 41 vezes mais do que as 210 computadas nos doze meses de 2017 pelo mesmo motivo.
A falta de cobradores em coletivos foi motivo de protestos recentes em Belo Horizonte e inclusive da ação de vereadores, que em visita técnica às estações Barreiro e Diamante, no fim de novembro, disseram ter confirmado denúncias de usuários, identificando a ausência de trocadores em grande número de ônibus em circulação.



REAÇÃO Na tarde de ontem, o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra BH), Joel Paschoalin, disse que a orientação da entidade patronal às 35 empresas de ônibus que atuam na capital é cumprir a lei municipal que obriga a presença de cobrador nos coletivos, “com exceção do horário noturno, domingos e feriados e nos veículos do Move e das linhas alimentadoras do Move”. Porém, Paschoalin sustentou que empresários do setor alegam estar sem condições de arcar com esse compromisso, por dificuldades financeiras.

“Não estamos pressionando a prefeitura”, disse o presidente do Setra, sobre o comentário do prefeito Alexandre Kalil, “de que as empresas de ônibus fazem o que querem e vão receber o troco”. Pelas contas dos patrões, o rombo mensal do setor chega a R$ 20 milhões e vários pontos devem ser levados em consideração, como a redução no número de passageiros, de 29 milhões para 22 milhões nos últimos quatro anos e o aumento de combustíveis.

Sobre os prejuízos para o setor, o representante patronal afirmou que nos últimos 10 anos, partir de novembro de 2008, foram registrados ainda 81 ônibus queimados, sendo 22 no ano passado e 17 em 2018. “O pior é que esses ônibus não têm seguro, pois as seguradoras não aceitam fazer”, afirmou.

Na sede do Setra, Paschoalin disse que mais de 80% dos passageiros, atualmente, pagam tarifa com o cartão BHBus. Porém, considerou que o trocador continua sendo necessário e que a extinção do cargo causaria impacto social muito grande.
“Mas temos que lembrar que os motoristas ganham 20% a mais no salário para cobrar passagem e, por isso, fazem pressão”, argumentou. Para realocar os agentes de bordo, as empresas sustentam estar buscando serviços de capacitação. O setor emprega 6 mil motoristas e 5 mil cobradores para trabalhar em 2,9 mil coletivos. A estimativa do sindicato patronal é de que tenha havido redução de 800 a 1 mil cobradores.

Sobre as 8,7 mil multas aplicadas pela BHTrans às empresas, de janeiro a novembro, Paschoalin garantiu que não há condições de pagamento, devido às dificuldades financeiras vividas pelo setor. O equilíbrio só virá, acredita, com a redução de custos e com reajuste da tarifa, “pois tivemos aumentos de combustível e duas convenções coletivas dos trabalhadores”.

 

CONTROVÉRSIA
No fim do ano passado, o prefeito Alexandre Kalil se reuniu com empresários que administram as empresas de ônibus de BH e anunciou que não haveria aumento no valor das passagens enquanto não se abrisse “a caixa-preta da BHTrans”, conforme promessa feita na campanha do então candidato do PHS. Desde então, enquanto as empresas falam em prejuízo, o movimento Tarifa Zero fala em lucro excessivo.

O Tarifa Zero fez um estudo sobre a tarifa de Belo Horizonte, cujos detalhes pretende divulgar hoje. Mas a conclusão antecipada é de que o valor atual está bem acima do que seria devido. As empresas, segundo o coletivo, teriam acumulado um ganho indevido de R$ 179 milhões em 2017.
Para chegar ao valor, segundo o movimento, foi refeita a base de cálculo, tendo por base a metodologia que era usada pela Prefeitura de BH até o ano de 2007.

 

 

O que diz a lei


 

A Lei 10.526, de 2012, estabelece regras sobre a atuação de cobradores e motoristas no transporte de passageiros por ônibus na capital mineira. O parágrafo 1º do artigo 3º especifica que cada veículo será operado por um condutor e um agente de bordo, com exceção das linhas do sistema Move e dos coletivos em operação em horário noturno (das 20h30 às 5h59) e durante os domingos e feriados, em tempo integral.

 

 

Números da discórdia


R$ 4,05
é o valor atual da tarifa predominante em Belo Horizonte, congelado pela prefeitura em dezembro de 2017

40 mil
documentos foram analisados na auditoria das contas do transporte encomendada pelo município, segundo a Prefeitura de BH

8.726
multas foram aplicadas às empresas de ônibus de BH, de janeiro a novembro, por viagens feitas sem cobrador fora dos horários permitidos. Em todo o ano passado foram 210

R$ 5,8 milhões
é o valor acumulado das punições impostas às empresas por falta de agente de bordo em 2018

R$ 20 milhões
seria o montante do rombo mensal na conta das empresas, segundo o sindicato que representa as companhias de transporte da capital

7 milhões
de passageiros deixaram de usar o serviço de transporte nos últimos quatro anos, de acordo com as empresas de transporte

R$ 179 milhões
seria o ganho indevido das empresas de transporte em 2017, pelos cálculos do movimento Tarifa Zero, que sustenta ter considerado metodologia adotada pela Prefeitura de BH até 2007

 

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