Jornal Estado de Minas

Em 2018, DEER suspendeu um terço dos ônibus vistoriados após denúncias

As empresas de ônibus responsáveis por levar passageiros de uma cidade a outra em Minas Gerais entraram na linha de fogo da fiscalização. Depois do transporte clandestino, agora é a vez das linhas regulares ficarem na berlinda. Números que põem em xeque a segurança e até mesmo as condições de higiene dos veículos estão levando o Departamento de Edificações e Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DEER/MG), responsável pela verificação das linhas intermunicipais, a reforçar as inspeções. Vistorias feitas em virtude de reclamações de passageiros resultaram no recolhimento da autorização de tráfego de mais de um terço dos veículos examinados no ano passado. Quem passa pelo transtorno de ficar na estrada por causa de quebras constantes de ônibus cobra providências. Especialista lembra que, assim como no transporte aéreo, os viajantes têm direitos também no rodoviário e orienta quem foi prejudicado a recorrer à Justiça para reparar danos.


Em 2018, o DEER/MG recebeu 654 reclamações de passageiros, sendo que 416 se referiam à conservação, conforto e higiene. Outras 238 eram sobre problemas mecânicos ou de segurança. O departamento fez 670 vistorias em função dessas denúncias, sendo que 231 ônibus perderam provisoriamente a autorização de tráfego, até a correção do problema.
O órgão estadual informou que a atual gestão está avaliando os dados da fiscalização de veículos do transporte intermunicipal para identificar as deficiências e reforçar as vistorias desses ônibus. O objetivo é garantir a segurança de quem usa o serviço.

A fiscalização verifica, frequentemente, o cumprimento de condições adequadas dos ônibus quanto à segurança (portas, pneus, lanternas, parte mecânica e elétrica), à higiene e ao conforto, de acordo com o estabelecido por regulamento e termo de manutenção. O DEER acrescenta que, no caso de denúncias, todas as reclamações são enviadas à fiscalização para averiguação e notificação à empresa. Em casos de reprovação na vistoria, o veículo tem a autorização de tráfego recolhida imediatamente, até que se corrijam as deficiências.



VIA-SACRA O problema tem se tornado recorrente nas estradas do estado, principalmente no período de férias e feriados e causado transtornos aos passageiros. No caso do engenheiro Alex Vitor Rodrigues dos Santos, de 37 anos, morador de Contagem, na Grande BH, era mais uma viagem que já começava com apreensão por causa de experiências anteriores malsucedidas com a Expresso Gardênia, a única a atender o Sul de Minas. Mas nem no pensamento menos otimista pensou passar pela maior das vias-sacras: enfrentar três quebras de ônibus no mesmo trajeto. Um dia depois do Natal, ele embarcou em Belo Horizonte com destino a Poço Fundo, próximo a Alfenas.

A linha fazia o percurso da capital até Poços de Caldas, pela rodovia Fernão Dias.
O engenheiro deveria descer em Machado, distante 380 quilômetros de BH. Um pouco antes de Carmópolis, a 110 quilômetros da capital, o veículo deu pane. Foram duas horas até os passageiros entrarem em outro, da mesma empresa, para continuar na estrada. Pouco depois de deixarem o posto de combustíveis na cidade de Perdões, a 197km da capital, onde o ônibus faz parada, o veículo quebrou novamente. “Disseram que viria um veículo que estava numa cidade a 13 quilômetros de distância, mas ele demorou duas horas para chegar. Desci em Machado e, quando o ônibus arrancou para seguir viagem, o pneu estourou. Ele chegou a Poços às 5h, sendo que o horário previsto era 20h do dia anterior”, conta.

O engenheiro diz que os problemas com a empresa de transporte começam com a falta de pontualidade. “Todos os ônibus saem atrasados e há uma frequência de quebra enorme”, relata.
Na pior viagem que já fez, chamou atenção a quantidade de crianças e idosos que havia no ônibus e a falta de providências da empresa. “Ela não prestou assistência alguma, nem com um copo d’água. E ainda havia um motorista despreparado para lidar com a situação”, relata. “Ligamos para a Polícia Rodoviária Federal, que informou não ser atribuição dela. Orientou chamar o 0800 da empresa. Era madrugada e o número só recebe ligação de telefone fixo. De forma geral, com exceção de linhas mais renomadas, aquelas que atendem as cidades do interior são uma vergonha”, reclama.

Números de duas das rodovias mais importantes que cortam Minas Gerais mostram como panes em ônibus intermunicipais e interestaduais se tornaram reflexo do descaso com quem tem no transporte rodoviário o meio para chegar a cidades do interior. No perímetro mineiro da Fernão Dias e da BR-040, trechos privatizados, o socorro a veículos nessa situação, feito pelas concessionárias, somaram 2,4 mil ocorrências ao longo do ano passado – média de 6,6 casos por dia.

OCORRÊNCIAS O volume maior se concentra na Fernão Dias, onde as panes totalizaram 1.698 – quase cinco por dia. Este ano a situação não começou diferente. Nos primeiros 14 dias de 2019, foram 93 ocorrências dessa natureza, de acordo com dados da Arteris Fernão Dias (AFD), concessionária responsável pelo trecho que liga Belo Horizonte a São Paulo.
Apenas nos limites mineiros, a média diária é de 6,6 atendimentos. A AFD informa ainda que o pico é no período de férias e feriados prolongados. No réveillon deste ano, as panes nos veículos rodoviários responderam por 48% dos atendimentos, bem acima dos acidentes, que ficaram na casa dos 10%.

Na BR-040, de acordo com a Via 040, responsável pelos 936,8 quilômetros entre Brasília (DF) e Juiz de Fora (MG), o trecho mineiro registrou 702 ocorrências em 2018. As panes mecânicas responderam pela maior parte dos casos, com 515 atendimentos. No verão, de janeiro a março e em dezembro, elas somaram 38,6% dos casos. Pneus furados ou estourados totalizaram 49. Pane elétrica, pane seca, superaquecimento do motor e bateria descarregada também integram a lista de problemas.

O diretor-superintendente da Arteris Fernão Dias, Helvécio Tamm de Lima Filho, considera o número elevado, principalmente pela proporção entre ônibus e outros veículos que trafegam pela estrada. Segundo ele, boa parte das panes ocorre em veículos clandestinos, mas o fato também é frequente nas linhas regulares. “A linha é uma concessão pública, e a empresa tem obrigação de seguir normas e dar manutenção. Independentemente de ser uma concessão tem essa responsabilidade, mas, sendo, é ainda mais grave”, afirma.
“Nas férias e feriados, o número de ônibus regulares aumenta e entendemos que têm mais condição de prestar melhor serviço, mas quebram também”, diz.

Para tentar minimizar o problema, o diretor-superintendente da Arteris pensa em adotar para os ônibus ação semelhante à que é feita com caminhões na rodovia. Na campanha Serras Seguras, eles são abordados em conjunto com a Polícia Rodoviária Federal (PRF). Um mecânico verifica as condições mecânicas dos veículos, como freios, pneus, fixação de cordas, entre outros itens. “Volta e meia encontramos caminhões em condições lamentáveis. É de se pensar incluir os ônibus nesse procedimento”, avisa.

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