Para alguns, a dor da certeza da perda definitiva de entes queridos, para outros a angústia do silêncio da desinformação. Quatro dias após a tragédia que varreu do mapa vidas inteiras, o entra e sai no prédio do Instituto Médico Legal (IML) em Belo Horizonte revelava a tragédia humana protagonizada pelo mar de lama que na sexta-feira paralisou corações e mentes em todo Brasil. Muito choro, apreensão, poucas esperanças e muita solidariedade marcaram a segunda-feira de centenas de pessoas que ainda aguardam alguma notícia, ou mesmo um porto seguro onde possam se apoiar.
No quarteirão permitido somente ao trânsito local, calçadas tomadas por uma rede solidária de voluntários, gente vindas de todas as partes para oferecer alimento, acolhida, agasalho ou apenas um afago se misturava com famílias e amigos nas idas e vindas do desespero de obter “alguma notícia” ou na dor expressa da confirmação da ausência de um pai, um filho, um marido ou esposa.
Sem dormir há três dias Odair Dias da Rocha Santana, soldador 42, anos aguradava notícias da irmã Denise da Rocha, 32 anos, engenheira da Vale, mãe de dois filhos de 12 e oito anos, que trabalhava na empresa há quatro anos, “Ela nos mandou fotos almoçando, no refeitório, na sexta-feira às 13h30 e nunca mais tivemos notícia”. Odair aguardava a chegada da mãe e irmãs, vindas de São Paulo, para tentar entrar no instituto e reconhecer a irmão entre os corpos. “Não sabemos o que dizer aos filhos que chamam pela mãe o tempo todo e precisaram ser medicados. Ninguém da Vale ainda nos procurou”.
A manicure Mirtes Alves Rodrigues foi avisada pelo cunhado que através do telefone 0800 disponibilizado pela empresa para informações, foi informado que deveria procurar o IML, para reconhecer o corpo da irmã Rosélia Alves Rodrigues, 36 anos, técnica em nutrição terceirizada. “Mas ao chegar aqui fui informada que era para esperar ligação do instituto antes de comparecer. “A gente fica sem chão, são muitas as dúvidas a serem esclarecidas. Nos agarramos a esperança de encontrar os restos mortais, já que é muita lama para que ainda esteja viva”. Rosélia tem um filho de quatro anos.
Angustiado, foi a classificação dada pelo metalúrgico Ricardo Braga, ao falar sobre a procura pelo irmão, o analista de qualidade na empresa por dez anos, Adriano Júnior Braga, de 38 anos. Na rua, redes de solidariedade foram formadas. Movidas pelo mesmo sentimento Gabriele Fernandes Gabriel, 30 anos, Erika Fernandes de 25, Carla Eduarda da Silva, Letícia Aparecida Gomes da Silva e Mariza Costa e Ana Carolina, que se conheceram no local, distribuíam sucos, água e alimento doados por inúmeras pessoas a familiares que chegavam ao IML em busca de notícia. Elas se sensibilizaram com a situação.
“Pensei em ir para Brumadinho mas me lembrei que muitos vinham aqui com a roupa do corpo, as vezes sem dinheiro até para passagem, no desespero e me desloquei pra cá”, relatou Ana Carolina. A despachante Ana Carolina disponibilizou telefone e xerox de sua empresa sem custos aos familiares e a empresa de socorristas Alpha Vidas, de Contagem deslocou duas ambulâncias e equipes de socorristas formadas por técnicos de enfermagem e enfermeiros para auxiliar em caso de “alguém passar mal”, explicou Jefferson Fernandes da Cunha. A aposentada Adriana Correia, moradora das proximidades ofereceu sua casa aos voluntários “para um descanso ou mesmo um banho”.