Enquanto helicópteros trazendo mortos da lama cruzam os céus de Brumadinho, o prefeito da cidade, Avimar de Melo Barcelos (PV), tenta manter os pés no chão. E se equilibra no dilema entre cobrar punição à Vale - empresa responsável até o momento por 84 mortos e 276 desaparecidos desde o rompimento de uma barragem de rejeitos - e a dependência econômica do município com a atuação da mineradora. “O maior empregador privado em Brumadinho é a Vale, precisamos desses empregos também. Como fica a cidade toda desempregada?”, questiona, em entrevista exclusiva ao Estado de Minas.
Como o senhor vê a prisão dos cinco engenheiros que atestaram a segurança da barragem rompida?
Os responsáveis vão ter que pagar pelo erro. A Vale acabou com nossa cidade, destruiu a cidade toda. É a maior catástrofe em número de mortos e desaparecidos de que tivemos notícia. Tem que aparecer o responsável por isso. Não sei se são essas pessoas que foram presas, mas alguém tem que pagar.
Qual a situação do município com relação às multas já aplicadas à Vale?
Leia Mais
Salta para 84 o número de mortos da tragédia de Brumadinho Poesia sobre Brumadinho na voz de Cid Moreira viraliza; veja o vídeo 'A cidade não ganhou nenhum centavo': prefeito de Brumadinho cobra promessas do estadoComissão faz visita técnica a Brumadinho para avaliar danos ambientais Lama percorreu área equivalente a 290 campos de futebol até chegar ao Rio ParaopebaVale anuncia que vai desmontar barragens iguais às de Mariana e BrumadinhoO medo é repetir Mariana?
Exatamente. O prefeito de lá esteve aqui no fim de semana e disse que quase nenhuma multa havia sido repassada ao município. A situação dele é delicada e tenho esse medo, de o município ficar a ver navios. Aqui é muito grave, várias famílias desabrigadas, grande número de mortos e desaparecidos. E financeiramente o município não conseguirá sobreviver sozinho.
Qual a preocupação imediata?
Exigir dos bombeiros e da Defesa Civil que trabalhem incansavelmente em busca de pessoas com vida.
Até onde o senhor sabia, a barragem que se rompeu não apresentava riscos?
Era o que a Vale nos passava. Inclusive, quando este presidente da Vale assumiu, assumiu com o lema ‘Jamais Mariana’. Se esperássemos algo dessa natureza, solicitaríamos ao governo federal a fiscalização.
Não havia rotas de fuga, treinamentos de retirada, sirenes…
Tinha sirene, mas no dia não funcionou. Por isso pegou esse tanto de gente almoçando no refeitório. Como uma empresa do porte da Vale deixa um escritório e um refeitório abaixo da barragem, na mancha de alagamento? Isso não poderia ter ocorrido de forma alguma.
Diante do cenário de dependência econômica do município com a atuação da mineradora, o que o senhor enxerga de perspectiva?
As investigações vão apurar os responsáveis criminais, civis e também sobre a questão ambiental. O Ministério Público já está trabalhando neste sentido. Exigimos que o estado pedisse o bloqueio judicial de R$ 1 bilhão, para garantir o pagamento das indenizações. As multas devem demorar mais, mas em Brumadinho vamos jogar pesado, vamos ficar em cima, porque não vamos admitir o que foi feito em Mariana.
O senhor imagina esta cidade sem a Vale?
Se não tivermos o apoio dos governos estadual e federal, dependemos da Vale, não só financeiramente, para as contas da prefeitura, mas - Foto: Fred Bottrel/EM/D.A Pressem matéria de empregos. Exigi do presidente da Vale que ele não demita nenhum funcionário da empresa. Que se paga os funcionários que estejam sem trabalhar neste momento.
Em Mariana, as demissões da Samarco prejudicaram bastante a economia local e a cidade viveu esse dilema entre chorar a tragédia e contrabalancear a questão financeira…
Por isso não podemos permitir que isso ocorra aqui. O maior empregador privado em Brumadinho é a Vale, precisamos desses empregos também. Como fica a cidade toda desempregada? É a chegada do dinheiro na cidade que faz o comércio funcionar. É uma questão muito complicada, principalmente neste momento em que estamos preocupados em resgatar vítimas vivas.
.