Jornal Estado de Minas

'Sem ajuda, dependemos da Vale', diz prefeito de Brumadinho

- Foto: Fred Bottrel/EM/D.A Press
 
Enquanto helicópteros trazendo mortos da lama cruzam os céus de Brumadinho, o prefeito da cidade, Avimar de Melo Barcelos (PV), tenta manter os pés no chão. E se equilibra no dilema entre cobrar punição à Vale - empresa responsável até o momento por 84 mortos e 276 desaparecidos desde o rompimento de uma barragem de rejeitos - e a dependência econômica do município com a atuação da mineradora. “O maior empregador privado em Brumadinho é a Vale, precisamos desses empregos também. Como fica a cidade toda desempregada?”, questiona, em entrevista exclusiva ao Estado de Minas.

Como o senhor vê a prisão dos cinco engenheiros que atestaram a segurança da barragem rompida?
 
 
 
Os responsáveis vão ter que pagar pelo erro. A Vale acabou com nossa cidade, destruiu a cidade toda. É a maior catástrofe em número de mortos e desaparecidos de que tivemos notícia. Tem que aparecer o responsável por isso. Não sei se são essas pessoas que foram presas, mas alguém tem que pagar.

Qual a situação do município com relação às multas já aplicadas à Vale?
 
O município aplicou total de R$ 100.750.000 em multas.
O estado de Minas Gerais, por outro lado, prometeu nos ajudar, mas não posso acreditar: às vezes se recebe a multa e o dinheiro some. Sobre a multa do governo federal, não tenho também certeza se a multa virá para a cidade. Com Mariana, até hoje nada, como me contou o prefeito de lá. E a cidade parou. Tenho o medo de que Brumadinho também pare porque aqui nós dependemos da Vale. Praticamente 40% da nossa arrecadação vem da Cefem (Compensação financeira pela Exploração de Recursos Minerais) e grande parte do ICMS apurada também em relação ao Cefem. Então estamos em situação muito crítica.
Se estado e governo federal abandonarem a gente, a cidade não vai ter como atender serviços essenciais da população.

O medo é repetir Mariana?
 
Exatamente. O prefeito de lá esteve aqui no fim de semana e disse que quase nenhuma multa havia sido repassada ao município. A situação dele é delicada e tenho esse medo, de o município ficar a ver navios. Aqui é muito grave, várias famílias desabrigadas, grande número de mortos e desaparecidos. E financeiramente o município não conseguirá sobreviver sozinho.

Qual a preocupação imediata?
 
Exigir dos bombeiros e da Defesa Civil que trabalhem incansavelmente em busca de pessoas com vida.

Até onde o senhor sabia, a barragem que se rompeu não apresentava riscos?
 
Era o que a Vale nos passava. Inclusive, quando este presidente da Vale assumiu, assumiu com o lema ‘Jamais Mariana’. Se esperássemos algo dessa natureza, solicitaríamos ao governo federal a fiscalização.

Não havia rotas de fuga, treinamentos de retirada, sirenes…
 
- Foto: Fred Bottrel/EM/D.A Press 
 
Tinha sirene, mas no dia não funcionou. Por isso pegou esse tanto de gente almoçando no refeitório.
Como uma empresa do porte da Vale deixa um escritório e um refeitório abaixo da barragem, na mancha de alagamento? Isso não poderia ter ocorrido de forma alguma.

Diante do cenário de dependência econômica do município com a atuação da mineradora, o que o senhor enxerga de perspectiva?
As investigações vão apurar os responsáveis criminais, civis e também sobre a questão ambiental. O Ministério Público já está trabalhando neste sentido. Exigimos que o estado pedisse o bloqueio judicial de R$ 1 bilhão, para garantir o pagamento das indenizações. As multas devem demorar mais, mas em Brumadinho vamos jogar pesado, vamos ficar em cima, porque não vamos admitir o que foi feito em Mariana.

O senhor imagina esta cidade sem a Vale?
 
Se não tivermos o apoio dos governos estadual e federal, dependemos da Vale, não só financeiramente, para as contas da prefeitura, mas - Foto: Fred Bottrel/EM/D.A Pressem matéria de empregos. Exigi do presidente da Vale que ele não demita nenhum funcionário da empresa. Que se paga os funcionários que estejam sem trabalhar neste momento.

Em Mariana, as demissões da Samarco prejudicaram bastante a economia local e a cidade viveu esse dilema entre chorar a tragédia e contrabalancear a questão financeira…
 
Por isso não podemos permitir que isso ocorra aqui. O maior empregador privado em Brumadinho é a Vale, precisamos desses empregos também. Como fica a cidade toda desempregada? É a chegada do dinheiro na cidade que faz o comércio funcionar. É uma questão muito complicada, principalmente neste momento em que estamos preocupados em resgatar vítimas vivas.
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