Jornal Estado de Minas

'A lama misturada com terra pegou a caminhonete por baixo e a levantou', diz sobrevivente

A caminhonete aparece em meio ao mar de lama - Foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press

Sobreviventes de Brumadinho contaram os horrores que viveram nos minutos que seguiram ao rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão no dia 25. Na tarde de quarta (30), ainda abalados pelo o que testemunharam, eles prestaram depoimento na Delegacia Especializada em Investigação de Crimes Contra o Meio Ambiente (DEMA),  no Bairro Lourdes, na Região Centro-sul.  

“A gente ia fazer o serviço acompanhando os terceirizados. Mas antes mesmo de a gente começar, eu ouvi um estrondo. Pensei que fosse trem que tivesse descarrilado, mas, quando cheguei para avistar, vi a lama. Eu e um colega meu tentamos fugir, mas não deu tempo. Corre prá lá, corre pra cá, a lama cercou e jogou a caminhonete para cima”, recorda-se o operador mantenedor e saneamento da Vale, Elias de Jesus Nunes.

Vestido com uma camisaque estampavaa palavra “life”, vida em inglês, Elias estava muito abatido, mas com certeza de que testemunhou um milagre. A força da lama descarrilou os vagões do trem da Vale. Alguns ficaram retorcidos, mas o carro onde estavam não sofreu avarias.
Da forma como a caminhonete foi levada pela lama, ele não duvida das mãos de Deus, que salvou ele e o colega Sebastião.  “A lama misturada com terra pegou a caminhonete por baixo e a levantou”, completou.

A lama retorceu os vagões descarrilados - Foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A PressElias e Sebastião ficaram ilhados. Com a lama por todos os lados, eles tiveram que ser resgatados pelo helicóptero do Corpo de bombeiros. Apesar do susto, ele disse que não passava pela cabeça a possibilidade de a barragem se romper. “A barragem não apresentava rachadura, problema. Nada. Estava num lugar que era meu trajeto de rotina, onde passava todos os dias”, disse. Do barulho do rompimento à chegada da lama foram cerca de seis minutos, segundo ele.
“Quando ouvi o barulho, a barragem já tinha rompido”, disse. 

Outro sobrevivente,  o operador de máquinas da Vale William Isidoro de Jesus escapou por um triz da onda de rejeitos. “Quando assustei, já tinha um monte de lama do meu lado. Deus me salvou. Por isso estou hoje aqui com vocês. Foi algo bem triste.” Ele afirmou que não soou nenhum alarme alertando do rompimento. “Nos treinamentos, a orientação era que a sirene tocaria e a gente seguiria pelas rotas de fuga. Mas não teve aviso, não teve sirene. Estava na máquina trabalhando, quando vi a lama chegando perto de mim.
Parecia cena de filme”, diz.

O inquérito instaurado pela DEMA  tem objetivo de averiguar se houve crime e, caso a investigação chegue à conclusão da existência do crime, a Polícia Civil poderá indiciar os responsáveis. “Estamos ouvindo as vítimas sobreviventes para entender a dinâmica dos fatos, saber onde estavam e o que estavam fazendo. Também vamos ouvir as famílias das vítimas falecidas”, informou o chefe da DEMA, o delegado Bruno Tasca Cabral.  

William e Elias preferiram não falar sobre a responsabilidade da Vale em relação ao rompimento. Também não comentaram o anúncio da empresa repassar R$ 100 mil às famílias que tiveram parentes mortos pela lama de rejeitos. 

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