Com dupla classificação de alto risco – na possibilidade de acidentes e na extensão do dano potencial em caso de rompimento –, quatro barragens de rejeitos de mineração e uma de água em Minas Gerais só agora despertam a atenção do poder público, depois da repercussão da tragédia provocada pela Vale em Brumadinho. Largadas ao abandono ou esquecidas há anos, embora estejam próximas de áreas habitadas, elas recebem as primeiras promessas de desativação, com retirada de material e reabilitação.
Em Rio Acima, distante cerca de 87 quilômetros do complexo destruído pela lama da barragem da mina Córrego do Feijão, dois maciços que pertenciam à mineradora Mundo Mineração serão descomissionados (esvaziamento e posterior reabilitação) e caberá à Copasa licitar a execução das obras, informou ao Estado de Minas a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). O projeto foi finalmente aprovado para as estruturas, que, como denunciou o EM no começo do ano passado, acumularam contaminantes como cianeto, capaz de provocar parada cardiorrespiratória.
A outra barragem em Minas que a Agência Nacional de Águas destaca com duplo perigo é a Barragem de Perenização Bananal, usada para irrigação no Norte do estado, localizada no município de Salinas. Segundo a Semad, ela passará por fiscalização neste mês. Em relação a mais duas barragens, localizadas em Ouro Preto (Água Fria) e Itabirito (Dique 2), fonte ouvida pela reportagem informou que o projeto executivo para desativação da primeira estrutura está em fase de contratação. O Ministério Público requereu fiscalização imediata e soluções para todas as barragens em Itabirito.
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As duas barragens constam com outras três como as mais perigosas de Minas em dupla avaliação – o risco alto na possibilidade de acidente e os graves danos às comunidades próximas e ao meio ambiente em caso de rompimento – no mais recente Relatório de Segurança de Barragens, da Ana, referente a 2017.
O reservatório foi incluído na lista de maciços mais arriscados que o governo federal determinou, com o desastre provocado pela Vale em Brumadinho, que sejam fiscalizadas de imediato. Estão também classificadas no último degrau do relatório as barragens Água Fria, que acumulou rejeitos da exploração de topázio imperial no distrito de Rodrigo Silva, em Ouro Preto; e Dique 2, em Itabirito, ambos municípios históricos da Região Central de Minas.
PLANO DE EMERGÊNCIA Fonte envolvida nas negociações para desativação da barragem Água Fria ouvida pelo EM informou que o projeto executivo das obras está em fase de contratação. Em Itabirito, sem plano de emergência, a unidade Dique 2, da empresa Minar Mineração Aredes, está desativada e não contém mais água ou rejeitos em sua estrutura, como informou a Defesa Civil. Procurado pelo EM, o Ministério Púbico de Minas Gerais (MPMG) comunicou ter requerido à Fundação Estadual do Meio Ambiente e à Agência Nacional de Mineração (ANM) a fiscalização de todas as barragens localizadas em Itabirito, bem como pediu medidas necessárias ao fim das barragens.
O MPMG está processando a empresa de mineração responsável pela barragem Dique 2. Parte dessas estruturas pressionam a Estação Ecológica do Aredes. A reportagem tentou contato com a empresa, mas não teve retorno.
O geólogo da Defesa Civil de Ouro Preto Charles Murta afirma que o município histórico está inserido num cenário mais dramático, uma vez que além de 16 barragens de Ouro Preto serem classificadas com alto dano potencial associado, o risco geológico da cidade também é grande. “O município, hoje, tem dois riscos: o geo-hidrológico e geotécnico, que é a facilidade de deslizamento em períodos de chuva, e o risco associado aos barramentos. Só no primeiro caso, temos 313 locais com riscos alto ou muito alto. Isso perfaz quase 6,5 mil pessoas em Ouro Preto”, explica.
SITUAÇÃO DRAMÁTICA Murta diz ainda que já foram feitas duas simulações de acidentes em barragens nas áreas de mineração das empresas Vale e Gerdau, e outras estão previstos para este ano. De acordo com o especialista, há um esforço da Defesa Civil, em conjunto com outras entidades públicas, como o MPMG, para que as empresas regularizem a situação das barragens na região.
Embora veja alguma evolução das cidades brasileiras no sentido de identificar os riscos geológicos e corrigir os problemas, o geólogo Edézio Teixeira de Carvalho, ex-professor da UFMG e da UFOP, diz que o país está muito atrasado nesse campo.
Para o especialista, o Brasil peca, da mesma forma, por não transformar a geologia em matéria na escola, o que ocorre em outras nações com Portugal. “O sistema geológico adoece exatamente como ocorre com o homem. O médico de que a geologia precisa pode ser o próprio geólogo ou o engenheiro”, afirma. Na visão de Teixeira de Carvalho, a ciência e a técnica deveriam prevalecer e a legislação brasileira não respeita isso. (*) Estagiário sob a supervisão da subeditora Marta Vieira
Perigo que ronda
» Barragem de perenização Bananal – Salinas
A estrutura sobre o Rio Bananal, que está próxima de centenas de propriedades rurais, foi incluída na lista preparada pelo governo federal contendo barragens que devem ser fiscalizadas de imediato devido ao seu alto risco
» Barragens Mina Engenho 1 e 2 – Rio Acima
Abandonadas desde 2012 pela mineradora Mundo Mineração, as barragens passaram à responsabilidade do governo estadual e contêm elementos tóxicos para homens e animais
» Água Fria – Ouro Preto
O reservatório, que não tem mais recebido rejeitos de mineração, serviu à extração de topázio imperial em Rodrigo Silva, distrito de Outro Preto
» Dique 2 – Itabirito
Estrutura usada na mineração de ferro, de propriedade da empresa Minar Mineração Aredes Ltda, que está sendo processada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG)
Inatividade perigosa
Construída há mais de 30 anos, a Barragem Água Fria não contém aditivos químicos e não recebe rejeitos há 10 anos, segundo fonte ouvida pela reportagem. Para o projeto de descomissionamento, ainda é necessária a aprovação de documentos pela empresa dona da barragem, a Topázio Imperial Mineração. Em nota, a mineradora admite que existem similaridades com a barragem de Córrego do Feijão, da Vale, mas pondera pontos que as diferenciam.
O primeiro aspecto seria o tempo o qual a barragem está desativada, o que faz com que a ela esteja “muito mais compactada do que a de Brumadinho” de acordo com a empresa. O segundo é o tipo de rejeito, que não demanda utilização de agentes químicos. O terceiro é que, apesar de as duas serem construídas com o método de alteamento a montante, a de Água Fria não foi produzida com o próprio rejeito.
Fiscalização O Ministério do Desenvolvimento Regional divulgou nota informando que serão feitas vistorias de 3.386 barragens que apresentam riscos no Brasil. Desses maciços, há 205 barramentos de mineração, cuja inspeção será prioritária até junho próximo. Desse universo, são cerca de 40 em Minas, de acordo com a Agência Nacional de Mineração (ANM). .