O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e a sociedade civil entram numa nova queda de braço na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Depois de ter sido recusada no ano passado, uma proposta de iniciativa popular para fazer cerco ao setor minerário e endurecer as regras para construção e licenciamento de barragens volta a tramitar na Casa. O Projeto de Lei de Iniciativa Popular 3695/2016, conhecido como Mar de Lama Nunca Mais, é um substitutivo ao PL 3.676 que, segundo promotores, flexibiliza as regras do setor. A expectativa é que ele seja votado em breve na Comissão de Administração Pública, onde foi apresentado na segunda-feira, e, efetivamente, atue como um marco regulatório para a segurança de barragens em Minas Gerais.
O substitutivo não é uma novidade. Tem exatamente o mesmo teor da proposta inicial, derrotada no ano passado. O imbróglio começou em março de 2016, quando o Mar de Lama nunca mais foi apresentado e anexado ao PL 3676, proposto pela Comissão Extraordinária das Barragens. Pelas regras do Legislativo, quando dois projetos tratam do mesmo assunto, entende-se que um contempla o outro e, por isso, o que chega depois é apensado e, na prática, desconsiderado. Por isso depois ele foi apresentado à Comissão de Minas e Energia, como substitutivo ao 3.676, mas os deputados não o aprovaram.
Agora, numa manobra regimental e depois de mais uma tragédia, o deputado João Vítor Xavier (PSDB), autor do substitutivo, o reapresentou, desta vez, na Comissão de Administração Pública, já que as regras permitem que o mesmo projeto seja proposto novamente, desde que numa outra comissão. “Podemos aprová-lo rápido, porque já foi amplamente discutido, está em segundo turno e falta passar apenas pela Comissão de Administração. Passando por ela, já pode ser votado em Plenário”, afirmou o deputado.
Ele ressaltou que o projeto foi construído com base em nota técnica do Ministério Público, de 18 páginas, apontando as fragilidades do PL 3.676 e como ele não contempla pontos importantes da outra proposição. Entre os destaques do projeto, estão a exigência de que as empresas adotem tecnologias de ponta para a disposição de rejeitos, o que garantiria mais segurança aos empreendimentos, a exigência de audiências públicas em todas as comunidades atingidas e a obrigatoriedade de caução (garantias financeiras prévias) e do uso de novas tecnologias, mais seguras e menos impactantes, nos empreendimentos.
“SEM DONO” O caução é uma maneira de obrigar as mineradoras a reservar dinheiro ou terem seguro-garantia para, em caso de desastre, arcarem com questões socioambientais e reparação às vítimas. “Samarco e Vale são duas gigantes do setor, mas e se uma tragédia ocorre com uma empresa sem capital ou em mina abandonada?”, questiona a coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa do Meio Ambiente (Caoma) e da Força-tarefa do MPMG no caso Samarco, promotora de Justiça Andressa Lanchotti.
Outro ponto importante do projeto se refere ao licenciamento das barragens, divididas em licença prévia, de instalação e de operação. Em cada uma delas são feitas exigências específicas, como o Estudo de Impacto Ambiental (EIA). Entretanto, em Minas, é possível que as três sejam emitidas ao mesmo tempo. O licenciamento concomitante ocorreu, por exemplo, na barragem de Feijão, em Brumadinho. Já pelo PL 3695/2016, as três licenças ocorrem separadamente. Só se passaria para a etapa seguinte se as condicionantes impostas na fase anterior, referentes à mitigação de danos e à reparação de impactos, forem cumpridas. “Queremos um marco regulatório efetivo. As questões econômicas não podem continuar se sobrepondo às questões humanas e sociais”, ressaltou.