“Só se fala nisso”, desabafa o diretor de Meio Ambiente e Saúde da União das Associações Comunitárias de Congonhas (Unaccon), Sandoval de Souza Pinto Filho, sobre o temor que a população da cidade tem em relação às 24 barragens que a rodeiam. Há mais de 10 anos a comunidade do município da Região Central do estado, distante 89 quilômetros de Belo Horizonte, vem denunciando o perigo que o complexo minerário representa para a população.
Agora, depois da tragédia em Brumadinho e dos alertas e susto em Barão de Cocais, também na Região Central, e em Itatiaiuçu, na Grande BH, moradores cobram medidas urgentes para que a Barragem Casa de Pedra, localizada praticamente dentro da cidade, não seja o motivo de mais uma catástrofe. A estrutura é uma das mais perigosas do estado, pois se ergue a cerca de 250 metros sobre três bairros com cerca de 4,8 mil pessoas ameaçadas em caso de rompimento.
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CSN planeja desativar barragem de área urbana de CongonhasDesastre em Brumadinho leva medo a Congonhas, que tem mais de 20 barragensBarragem Casa de Pedra, em Congonhas, possui risco de rompimentoMaior barragem dentro de uma cidade faz MPMG recomendar evacuação de 2,5 mil moradores em Congonhas Aulas são suspensas em Congonhas por medo de rompimento de barragemA discussão começou a se acirrar em 2013, quando a estrutura da Casa de Pedra, propriedade da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), apresentou problemas técnicos e assustou moradores. Na época, explica Sandoval, uma representação foi apresentada ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e uma série de obras corretivas foi determinada pela Justiça. Apesar disso, em 2017 a barragem voltou a apresentar problemas estruturais.
A tragédia em Brumadinho, explica Sandoval, piorou o clima na cidade de Congonhas e acirrou ainda mais as disputas com a mineração. De acordo com ele, a falta de informação e o medo da população que mora próximo às estruturas definem o cotidiano da comunidade. “Quem faz bem não tem motivo nenhum para esconder nada.
A Casa de Pedra é uma das maiores barragens em área urbana no mundo. A estrutura dela contempla 84 metros de altura e volume de 50 milhões de metros cúbicos. De acordo com a Agência Nacional de Águas (ANA), ela está classificada na categoria de risco baixo – igual à Mina Córrego do Feijão –, mas tem potencial associado considerado alto. O risco mede os níveis de problema que ela têm, incluindo a probabilidade de ruptura. O potencial associado indica os danos (ambientais, sociais e econômicos) que poderão ocorrer.
Apesar de toda a movimentação da população contra a mineração na cidade, apenas em 2017 a prefeitura criou a Secretaria Municipal de Meio Ambiente. Em novembro de 2018, o órgão elaborou um Plano Municipal de Gestão de Barragens e determinou às empresas o cumprimento de várias medidas em relação à estrutura das barragens em Congonhas. De acordo com moradores, porém, as ações ainda não alcançaram o nível desejado e a insegurança ainda impera na comunidade.
TENSÕES
Além da relação tensa entre a população e as mineradoras, há um histórico de retaliação às pessoas que denunciam a apreensão da comunidade. Exemplo disso foi o afastamento do capitão do Corpo de Bombeiros Ronaldo Rosa de Lima, que trabalhou na unidade de Congonhas, e foi removido do posto pelo comando da corporação depois de ter relatado preocupação com a estrutura da barragem de Casa de Pedra em 2017. Ele revelou que a barragem estaria “propensa a rompimento”. Na época, o comando dos Bombeiros alegou que o afastamento do capitão foi uma ação de rotina.
Em contraponto ao relato dele, o então coordenador adjunto da Defesa Civil, major Rodrigo de Faria, argumentou que a situação da barragem “é estável” e que um relatório apresentado pela CSN ao antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) atestou as boas condições da estrutura.
No último 31 de janeiro, a CSN afirmou que vai encerrar a disposição de rejeitos na Barragem Casa de Pedra até o fim de 2019. Apesar disso, na última quarta-feira, a empresa foi questionada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre o descomissionamento da barragem e afirmou que é “precipitado” divulgar detalhes sobre prazos e valores envolvidos na operação. A CSN alega que as etapas que envolvem o processo de descomissionamento são “complexas” e que são “objeto de revisão técnica”.
*Estagiário sob a supervisão da subeditora Regina Werneck
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