A Justiça poderá ser o caminho para resolver os imbróglios familiares gerados depois do anúncio da doação de R$ 100 mil pela Vale a parentes de mortos e desaparecidos na tragédia de Brumadinho. O dinheiro está sendo entregue a um único representante de empregados da mineradora, de trabalhadores terceirizados e de pessoas da comunidade e, por isso, se tornou motivo de discórdia, uma vez que mais pessoas com vínculos afetivos ou econômicos com as vítimas também querem sua parte. A Defensoria Pública de Minas Gerais defende a extensão da doação a outros familiares e afirma que levará a questão para os tribunais caso não haja um acordo amigável com a empresa.
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Estado de Minas mostrou na edição de ontem como cônjuges, companheiros, irmãos, filhos e pais estão brigando pelo direito ao auxílio financeiro. Em alguns núcleos, a guarda de crianças que perderam seus pais ou mães e se tornaram herdeiras não apenas da doação, mas de uma indenização a ser paga futuramente, se tornou o centro da disputa. A Defensoria está de olho nas pessoas que querem apenas se aproveitar da situação e não abre mão de garantir o benefício a mais pessoas com vínculos afetivos e familiares. “Estamos fazendo todos os trâmites na tentativa de mediar esses conflitos. A expectativa é que ela pague a todos os envolvidos, sem dividir o valor. Se há dois núcleos familiares com crianças ou adolescentes (caso de pessoa com filhos em mais de um relacionamento), queremos que pague R$ 100 mil aos dois grupos, ainda que não esteja previsto no anúncio inicial”, afirma o defensor público do estado, Rômulo Carvalho.
A Vale afirmou que os casos conflituosos serão analisados individualmente.
De acordo com a empresa, apenas um representante poderá se registrar para receber a doação. Na ordem de preferência, está o responsável legal por filhos menores em primeiro lugar. Não havendo filhos menores, cônjuge ou companheiro em regime de união estável passam a ser a pessoa que receberá o auxílio. Se a vítima também não tiver um relacionamento, estão aptos a receber o dinheiro seus descendentes – filho, neto e bisneto, nessa ordem. Por último, excluídas essas possibilidades, têm direito os ascendentes – mãe, pai, avós e bisavós, nessa ordem.
Os parentes próximos só estão contemplados na proposta de indenização apresentada ao Ministério Público do Trabalho. A expectativa da empresa é de que os acordos sejam firmados extrajudicialmente. Pela proposta, por danos morais, cônjuges ou companheiros vão receber R$ 300 mil.
Filhos terão direito a também R$ 300 mil cada um. Pai e mãe terão R$ 150 mil cada um. Já cada um dos irmãos será indenizado com R$ 75 mil. Além disso, a Vale assumiu o compromisso de arcar com plano médico para os familiares dos trabalhadores próprios e terceirizados, no regime de credenciamento, com abrangência em todo o estado, sendo vitalício para viúvos (as) ou companheiros (as) e até 22 anos para os dependentes.
A Defensoria não tem levantamento de quantas pessoas da mesma família pleitearam o direito aos R$ 100 mil fora da ordem de prioridade estabelecida pela mineradora, uma vez que o cadastramento é feito pela Vale. “Haverá uma solução e vamos esgotar todas as possibilidades antes de acionar a Justiça. Um acordo extrajudicial é o ideal, por ser mais rápido e eficiente. Mas, se qualquer pessoa for prejudicada, usaremos todos os mecanismos a que ela tem direito”, ressalta Rômulo Carvalho. A defensoria do estado e também da União montaram estruturas na cidade para atender os moradores e atingidos pela tragédia.
Reconstrução da ponte
Operários trabalham na reconstrução do acesso a Brumadinho.
No local, será instalada ponte de metal e concreto na estrada destruída com a lama da Vale. Técnicos da Vale trabalham no local, próximo a Alberto Flores e Parque da Cachoeira, em Brumadinho. A previsão é que as obras ocorram dia e noite e que a ponte esteja pronta até o fim do mês. A estrutura está sendo pré-fabricada em Matozinhos. As máquinas abrem grandes cavidades para permitir o escoamento de água. A ponte será sustentada por dois blocos, que consumirão 12 caminhões de concreto cada. Por meio da instalação de uma ponte de 50 metros de extensão, o trânsito entre comunidades e o Centro da cidade deve ser restabelecido. Os trabalhos estão sendo conduzidos pela Vale e o prazo previsto para a conclusão é de aproximadamente três semanas. A estrada ligava as comunidades de Córrego do Feijão, Piedade do Paraopeba, Topo do Mundo e a BR-040 à cidade de Brumadinho. A moradora Josefa Evangelista, de 38 anos, aguarda com ansiosidade a liberação do acesso.
“Meu marido tem um caminhão. O acesso pela Mina da Vale já ajuda, mas ainda fica mais longe. Como fica o combustível gastado para fazer o trajeto? ”, questionou. A construção da ponte foi definida após uma reunião entre representantes da Vale, Secretaria de Obras de Brumadinho, Defesa Civil e Departamento de Estradas e Rodagens (DER).
(Com Fred Bottrel e Pedro Loski) .