Velas acesas, oração coletiva, flores de papel, nomes dos mortos escritos na escadaria e cruzes como símbolo máximo da dor. Centenas de pessoas participaram, na noite desta sexta-feira, na Igreja São José, no Centro da capital, de uma série de celebrações em solidariedade às vítimas da tragédia de rompimento da barragem da mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O bispo auxiliar da Arquidiocese de BH, dom Vicente de Paula Ferreira presidiu a missa das 18h e lembrou que em 25 de janeiro, às 12h28 – um mês se compelta na segunda-feira – ocorreu “um massacre, um crime”, que resultou na morte de 177 pessoas e deixou 133 desaparecidos sob a lama que vazou do empreendimento da mineradora Vale. Os atos religiosos e também de manifestação popular foram organizados pela Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), Igreja São José e arquidiocese.
Antes de começar a missa, quem passava no adro da Igreja São José podia ver, do lado direito do templo, uma enorme cruz, com fotos penduradas de todas as pessoas que morreram no desastre que também degradou a Bacia do Rio Paraopeba. No chão, outras cruzes menores. Ao pegar uma delas, o missionário Raimundo Nonato de Noronha, de 28, morador de Esmeraldas, disse que a vontade era de chorar. “Estive em Brumadinho logo depois da tragédia e vi bem de perto o sofrimento das famílias”, contou ao lado da noiva Bárbara Freitas, de 24, formada em engenharia de produção e moradora do Bairro Mangueiras, no Barreiro. “Ficaram muitas crianças órfãs”, disse a jovem com emoção.
A cerimônia teve vários momentos e cenas que deixaram os presentes com lágrimas nos olhos. Um deles foi a entrada na igreja, logo no início da missa, de um homem segurando nos braços uma criança, ambos cobertos de lama. “Eu tinha conhecidos que morreram em Brumadinho”, contou o ator e diretor de teatro, Munish, que trazia nos braços a menina Mariana Mota, de 10, filha de uma amiga dele. Perto do altar, os dois foram recebidos por um grupo de religiosas que, cuidadosamente, receberam os dois e limparam o rosto da garota, representando, nesse momento, todas as crianças que perderam a vida no desastre. Antes, na entrada, um grupo portava cartazes com frases de alerta, a exemplo de “lucro acima de tudo, lama em cima de todos”. Na escadaria, foi estendida uma faixa na qual se lia Vale assassina.
Água do rio
Outro momento de emoção foi o Pai Nosso rezado, na língua nativa, por um grupo de 14 indígenas pataxós, da Aldeia Naô Xohã de São Joaquim de Bicas, duramente atingida pelos rejeitos. No ofertório, uma religiosa levou ao altar uma garrafa com água do Rio Paraopeba agora contaminado por metais pesados carreados na lama. “Quase um mês depois, tenho um sentimento inexplicável. Um sentimento que não vou viver o suficiente para definir, mas que levarei até último instante da minha vida”, disse o pároco da Matriz de São Sebastião, de Brumadinho, padre Renê Lopes.Em cada banco ou de pé, as pessoas prestavam homenagens às vítimas e pediam que Minas não seja mais alvo de tragédias como as de Mariana, em 2005, e Brumadinho, pouco mais de três anos depois. “As pessoas estão muito sensibilizadas com tudo isso, por isso esta celebração é importante. É essencial não esquecermos desta tragédia, para que não ocorram mais no nosso estado”, disse a assistente administrativa Eliane Alves Silva, moradora do Bairro Santa Efigênia, na Região Leste da capital. Na porta principal da igreja, o vigário e missionário redentorista, também concelebrante, padre Flávio Campos, ajudava a receber os fiéis e informava que havia religiosos de muita congregações, além de leigos que formaram um grande coro ao som da banda São Sebastião, de Brumadinho, sob regência do maestro Anderson. Durante a missa, houve também referência aos bombeiros e voluntários chamados de “heroicos e incansáveis”.