Jornal Estado de Minas

Rio Acima, na Grande BH, abriga represa que ainda não teve estabilidade atestada


A crise de segurança em barragens, que além de espalhar morte e destruição por Brumadinho, na Grande BH, exigiu evacuações de populações vizinhas de complexos minerários em outras quatro cidades mineiras, espalha medo por vários outros municípios, e um dos considerados mais preocupantes é Rio Acima, também na região metropolitana da capital. Além de abrigar a represa de rejeitos abandonada pela Mundo Mineração, considerada em “perigo máximo” pelo Ministério Público, o território municipal abriga o empreendimento em pior situação entre aqueles que ainda precisam ter sua estabilidade atestada este ano. Duas barragens da Nacional Mineração, do grupo da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), estão entre as 36 estruturas nessa condição no estado, segundo levantamento feito pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) a pedido do Estado de Minas. Uma delas, a B2 Auxiliar, é a única da lista que, antes mesmo do processo deflagrado pela catástrofe da Vale, em janeiro, já não tinha estabilidade garantida.


Caso o pior aconteça e as barragens B2 e B2 Auxiliar, de 75 metros de altura, se rompam, uma carga de rejeitos de 9 milhões de metros cúbicos poderia atingir o Rio das Velhas em menos de 20 minutos. Em caso de rompimento da estrutura, a onda resultante ingressaria no manacial a 10 quilômetros da captação da Copasa de Bela Fama, responsável por abastecer de água 60% da Grande Belo Horizonte.

De acordo com o levantamento da Semad, assim como as demais 34 estruturas, as represas da Nacional Mineração foram erguidas pelo processo de barramento a montante. É a técnica mais barata e menos estável, uma vez que consiste em aumentar a capacidade do reservatório (alteamento) apoiando os barramentos sobre parte do conteúdo da própria barragem. É o mesmo processo adotado nas represas que se romperam em Mariana, em 2015, e em Brumadinho, no começo do ano.

As barragens B2 e B2 Auxiliar têm um histórico de preocupação, que levou o Ministério Público da comarca de Nova Lima a conseguir sua interdição na Justiça, em abril do ano passado, como mostrou o Estado de Minas na época, com exclusividade. As represas se encontram no Complexo Minerário de Fernandinho, entre Itabirito (Região Central) e Rio Acima.
O Plano de Ação de Emergência de Barragem de Mineração prevê apenas cinco famílias na chamada zona de autossalvamento – área em que pessoas precisam escapar de eventual acidente por conta própria, já que não há tempo para intervenção de órgãos públicos. Sirenes de alerta foram instaladas no vale abaixo do barramento para avisar a essa população diretamente ameaçada.

Na época em que a Justiça embargou as barragens do Complexo de Fernandinho, a CSN informou que estava fazendo drenagens nas represas, com o desvio do curso d’água que chega à estrutura. “Finalizada essa parte, a empresa iniciará o processo de estabilização, com as estruturas sendo removidas e reintegradas à paisagem natural”, informou, por meio de nota, referindo-se ao processo conhecido como descomissionamento.

SEM OBRAS Contudo, a equipe de reportagem do EM esteve novamente ontem na barragem, onde não se observa nenhum trabalho para reinserir o barramento na paisagem natural, como anunciado na época. Pelo contrário: toda a estrutura parecia abandonada. Apenas um trabalhador apareceu, caminhando entre os degraus que retêm o minério, e uma caminhonete foi vista em estradas internas. Na mesma nota divulgada em 2018, a empresa informava que “não há risco, já que todas as medidas para garantir a estabilidade da estrutura estão sendo executadas”, ainda que, um ano depois, tal estabilidade ainda não esteja garantida, segundo a Semad.

A decisão judicial que paralisou o complexo de Fernandinho foi motivada por ação civil pública baseada em laudos que classificavam como sob risco “iminente de rompimento” a estabilidade geológica e hídrica das estruturas da CSN. Além de determinar a imediata paralisação do descarte de rejeitos nos dois reservatórios, a Justiça deu na época 10 dias para que a mineradora elaborasse e submetesse à aprovação dos órgãos competentes (incluindo o Departamento Nacional de Produção Mineral, hoje Agência Nacional de Mineração, e Fundação Estadual do Meio Ambiente – Feam) um plano de ação que garantisse total estabilidade aos barramentos.
Por um ano, deveria manter auditoria técnica de acompanhamento e fiscalização das estruturas.

Em até 30 dias deve  entrar em curso no estado um plano de fechamento de barragens de montante, com prazo de término em janeiro de 2021. O descumprimento das medidas sujeita a empresa a multa diária R$ 30 mil, até o limite de R$ 1 milhão.

Consultada pelo Estado de Minas, a CSN se limitou a informar, por meio de sua assessoria, que não comentaria o processo de descomissionamento de suas barragens do Complexo de Fernandinho..