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Estado de Minas

Trabalho de buscas a desaparecidos em Brumadinho não tem prazo para acabar

De acordo com os Bombeiros, localização de todos os desaparecidos e condições biológicas são os únicos fatores que podem encerrar as buscas


postado em 25/02/2019 17:23 / atualizado em 26/02/2019 21:15

(foto: Estado de Minas)
(foto: Estado de Minas)
 

 

 

Um mês de dor, um mês de espera. Para quem já enterrou seus mortos ou ainda aguarda para velar parente ou amigo, não só os 30 últimos dias, mas todos os vindouros serão longos. Para uns, resta a expectativa de responsabilizações e reparações. Para outros, se soma a ela a espera angustiante e diária de encontrar o ente desaparecido para pôr o ponto final nessa parte da história. Enquanto se rendiam homenagens às vítimas e a indignação falava do alto do púlpito da tragédia, bombeiros e 54 equipamentos distribuídos em 14 frentes de buscas davam vazão a escavações profundas na expectativa de recuperar corpos. Sem prazo para acabar, os trabalhos seguem com nova dinâmica para fazer diminuir o número de pessoas que ainda não foram encontradas depois do rompimento da barragem da Vale. 

“Não há previsão de os trabalhos acabarem”, afirmou nesta segunda-feira o tenente Pedro Aihara, porta-voz do Corpo de Bombeiros, sobre o fim das buscas aos desaparecidos. Em entrevista coletiva para fazer o balanço de 30 dias das operações, ele informou que há apenas duas hipóteses para a conclusão das ações de recuperação de corpos. A primeira é encontrar todos que estão desaparecidos. Atualmente, são 131. A segunda é quando não houver mais condição biológica para os trabalhos. “O estado de decomposição dos corpos é bastante avançado, mas ainda é possível fazer esse tipo de identificação na lama”, disse. “Todo dia, ao final das operações, tem uma reavaliação dos objetivos da missão para ver se ainda estamos em condição de fazer esse resgate ou se chegamos a estágio que inviabiliza a operação.” 

O tenente acrescentou que nesse um mês de buscas não houve um dia sequer sem localização de corpos ou partes deles –  foram encontrados mais seis segmentos. “Cada retirada exige uma escavação e um georreferenciamento específicos. O trabalho de identificação por DNA demanda mais tempo. Com o material que já foi recuperado, mas ainda não identificado, a expectativa é de que a lista de desaparecidos diminua.” 

Até o momento, houve 340 recuperações de corpos ou segmentos, dos quais 179 foram identificados e 10 classificados como não humanos. De acordo com o delegado Arlen Bahia, os exames de DNA são feitos, conferidos e reconferidos para não haver qualquer tipo de falha. “Mas os dados ainda não foram cruzados”, disse. Ele informou que não é possível determinar prazo para a identificação de todo o material. 

Um mês depois do desastre, o número de bombeiros envolvidos caiu de 400 para uma média de 150. Do total, 23 são de Santa Catarina e do Paraná. Aihara explicou que a fase atual exige efetivo menor, pois a operação se dá basicamente com maquinário pesado, para fazer escavações mais profundas (veja quadro). A operação aérea também foi restringida. Os militares estão operando eminentemente com drones. “Antes, o lançamento de equipes era em áreas muito fluidas e maleáveis, onde só se podia chegar por meio de aeronaves. Agora conseguimos lançamento por terra”, afirmou o tenente Aihara. Além de drones, balões meteorológicos fazem o acompanhamento das condições. 

(foto: Arte EM)
(foto: Arte EM)


SEM TRÉGUA
 Os trabalhos avançam agora para a região conhecida como Remanso 3. Já foram concluídas as buscas no refeitório e a expectativa é de que até o fim do dia elas sejam finalizadas também no almoxarifado. A área da pousada teve seu perímetro de buscas ampliado. “Pela própria característica de fluidez da lama e do relevo da região Remanso 3 é uma área onde a água tende a se concentrar. Essa área permanecia inundada e a chuva era direcionada a esse local pela questão topográfica. Com essa concentração de água, era impossível usar maquinário pesado”, relatou o tenente. Os bombeiros instalaram equipamentos para drenar e conseguiram retirar praticamente toda água que havia no local. “A partir desse momento, conseguiremos operar com equipamento, na expectativa de encontrar quantidade significativa de corpos ou segmentos”, relatou. A expectativa é, principalmente, em relação a corpos que estavam na região da Central de Materiais Descartáveis, na parte lateral da área administrativa. 


O maior desastre humano da mineração no país conta também com a maior operação de salvamento já feita no Brasil, inclusive do ponto de vista aéreo. Uma comparação feita com o Aeroporto Internacional de Confins, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, dá a dimensão do tamanho das ações. Enquanto o fluxo médio de pousos e decolagens no terminal é de 260 por dia, durante os 30 dias em Brumadinho, a média foi de 299. “Foi a maior movimentação aérea em Minas Gerais”, destacou o tenente Aihara. No total, foram empregadas nos trabalhos de busca e resgate 31 aeronaves dos bombeiros de Minas e de outros estados, polícias Militar, Civil e Federal e até do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Foram mais de 1,4 mil missões aéreas.

SEGURANÇA Continuam as operações para garantir a integridade dos bens dos moradores de Brumadinho, bem como nas três outras cidades evacuadas – Itatiaiuçu, Barão de Cocais e Macacos (em Nova Lima). Durante os 30 dias, nenhuma ocorrência de saque foi registrada pela Polícia Militar, de acordo com o porta-voz da corporação, major Flávio Santiago. Ele destacou que os bloqueios das zonas de risco em Brumadinho continuam e pede para moradores não insistam na passagem. “Mesmo depois de 30 dias, ainda temos áreas de risco. Continuamos com bloqueios e esclarecemos que as pessoas não devem tentar entrar nessas áreas”, disse.

Protestos, saudade e dor

Ver galeria . 6 Fotos Edesio Ferreira/EM/D.A.Press
(foto: Edesio Ferreira/EM/D.A.Press )


Brumadinho - “Não foi fatalidade nem acidente. Foi crime. O lucro não vale a vida”. Esses são dizeres de uma das dezenas de faixas erguidas por familiares das vítimas do rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Usando roupas brancas, centenas de pessoas se reuniram na ponte da cidade, que fica sobre o Rio Paraopeba, para protestar e  prestar homenagens aos parentes e amigos mortos em 25 de janeiro. Durante o ato, balões brancos foram levados pelos moradores e uma chuva de pétalas lancadas de um helicóptero. O Corpo de Bombeiros, as polícias Civil e Militar e outros órgãos que participaram da operação de resgate receberam aplausos. 

Após um mês de buscas por vítimas, equipes de resgate contabilizavam até ontem 179 mortos e 131 desaparecidos. A esperança de encontrar sobreviventes dá lugar à angústia para a localização de corpos e realização do velório do ente querido perdido. Wilson Caetano, de 64 anos, sai de sua casa em Pará de Minas, na Região Centro-Oeste, todos os dias para ir até o Córrego do Feijão buscar notícias de seu filho. Ele se senta à beira do mar de lama e acompanha os trabalhos do Corpo de Bombeiros. Seu filho, Luiz Paulo Caetano, trabalhava em uma empresa que prestava serviços para Vale e acabara de se casar quando ocorreu o desastre. “Não queria homenageá-lo por sua morte. Gostaria de homenagear a alegria dele. Gostaria de tê-lo em casa, após o trabalho, para abraçá-lo”, disse o senhor. “Só quero que devolvam o corpo do meu filho. Ele é meu filho e não deles. Não vou dar sôssego para a Vale”, acrescentou. 

A inquietude se repete na família de Daniela Tavares, de 24. Ela continua à procura do pai, funcionário da Vale, que está desaparecido. “O último mês foi muito difícil, nunca esperamos por isso. Ele trabalhava lá havia 38 anos, no administrativo. Saiu de casa para nunca mais voltar”, contou a jovem. Ela foi uma das que cantaram durante o ato que emocionou todos os presentes na ponte sobre o Rio Paraopeba. Cantora, ela tinha seu pai como maior fã e postou em suas redes sociais um vídeo em homenagem a ele, em que entoa uma canção sobre Deus e a importância de ter forças. “Tenho certeza de que meu pai gostaria que eu estivesse aqui cantando hoje”, disse.

Além da participação de Daniela, o encontro contou com a apresentação de música composta pelo bispo auxiliar da Arquidiocese de BH dom Vicente Ferreira em homenagem a Brumadinho. Representantes de diferentes religiões se uniram em um círculo para fazer um minuto de silêncio. Era o momento de orações. Às 12h28, hora em que a barragem se rompeu há um mês, um helicóptero jogou pétalas de rosas sobre o rio, que desde 25 de janeiro tem suas águas mais escuras por causa do derramamento de rejeitos. O momento foi de muita emoção. Familiares e amigos também amarraram fitas e cartazes na ponte, com mensagens lembrando as vítimas. Entre tantos dizeres, as palavras “saudade” e “justiça” se sobressaem. 

“Nossos filhos eles não vão trazer mais. Mas quero justiça. Ela morreu por irresponsabilidade da Vale”, disse Patrícia Anísio, que perdeu a filha de 28 anos . Letícia Mara era enfermeira da Vale e deixou marido e um filho de 1 ano e meio. Patrícia contou que o menino chama pela mãe todos os dias: “Ele ainda mamava no peito e nunca mais terá a mãe de volta”, disse, chorando. 

No mesmo horário, o Movimento Atingidos por Barragem (MAB) se reuniu no Parque Cachoeira. Depois, moradores seguiram para o local onde fica o letreiro com o nome da cidade. Desde o dia da tragédia, o ponto se tornou referência de encontros, manifestações e solidariedade. Ontem, de mãos dadas, cerca de 30 pessoas clamavam por justiça. Com crucifixos nas mãos, manifestantes oraram e cobraram explicações. A fisioterapeuta Jéssica Soares, de 28, foi enfática: “A gente quer justiça e espera que as buscas continuem para que todos os corpos sejam encontrados”.

 


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