O número de mulheres que procuram por auxílio após sofrerem agressões físicas e violência sexual em Montes Claros, no Norte de Minas, teve aumento nos dois primeiros meses deste ano. O Serviço de Assistência às Vítimas de Violência Física e Sexual, que funciona no Hospital Universitário Clemente de Faria (HUCF), atendeu 40 casos em janeiro e fevereiro (20 em cada mês) deste ano, o que corresponde a 24% do total de 167 vítimas atendidas durante todo ano de 2018.
A socióloga e pesquisadora Theresa Raquel Martinez, do Grupo de Pesquisa “Gênero e Violência” da Unimontes e que na atua no ambulatório especializado do HUCF, ressalta que os dados dos primeiros dois meses de 2019 mostram o recebimento de um caso de mulheres em situação de violência física e sexual a cada dois dias. “Mas, a nossa percepção enquanto pesquisadora e referência nesse serviço é que, na verdade, não houve aumento dos casos de violência. O que houve foi aumento das denúncias, da procura e do acesso (do serviço de atendimento às vítimas)”, afirma Theresa Martinez.
Segundo ela, o crescimento das denúncias e procura de auxilio por parte das vítimas é influenciado pela divulgação pela mídia e pelas redes sociais. “No nosso entendimento, essa violência (contra as mulheres) sempre existiu. É claro que em alguns períodos do ano ela se torna mais frequente, como em épocas de festas e de férias, mas o que houve mesmo foi um aumento da procura pelo serviço”, assegura a pesquisadora.
A especialista ressalta que as mulheres passaram a procurar mais o atendimento público porque estão mais conscientes dos seus direitos. Ela enfatiza que “99,9%” dos agressores são homens. “Isso demonstra a violência tem um perfil machista e patriarcal. Mesmo quando as vítimas são meninos, os agressores também são homens”, comenta.
As vítimas de violência física e abusos sexuais estão distribuídas em todas as classes sociais, mas as mulheres das categorias mais baixas são as que mais sofrem. “A violência é multicausal e atinge todas as classes sociais de forma distinta. Porém, a gente sabe que a maioria das mulheres que nos procura pertence à classe social menos favorecida”, observa Thereza Martinez. Ela lembra ainda que o perfil das vítimas é bem variado, incluindo universitárias, profissionais do sexo e integrantes da comunidade LGBT.
Ciclo de violência
A socióloga e pesquisadora da Unimontes salienta que para aumentar a assistência às vítimas e combater a violência doméstica, é preciso que as mulheres denunciem seus agressores. Por outro lado, ressalta ainda falta uma estrutura de apoio às vítimas por parte do Poder Público.“Do ponto de vista legal, processual e social, é imprescindível que a vítima denuncie o agressor. Só que esse ciclo de violência demora para ser rompido. É muito fácil pra gente sugerir para que um agressor seja preso ou que a mulher saia desse ciclo. Mas, a gente sabe que o Estado não tem um aparato para proteger a mulher (agredida e que denuncia o caso) o tempo todo”, avalia Martinez, lembrando que, após a denúncia, o processo para punição do agressor –“seja ele conhecido ou não” demora anos.
“De forma geral, o ideal é que a mulher saia do ciclo de violência”, diz a pesquisadora. “Para isso é preciso o suporte e o apoio a partir da parceria dos órgãos públicos que trabalham com a questão para que as mulheres se sintam minimamente acolhidas e seguras para tomar a decisão (de fazer a denúncia)”, acentua.
A socióloga salienta ainda que estudos mostram que, mesmo quando os casos são denunciados, o ciclo de violência doméstica enfrentada pelas mulheres demora de sete a 10 anos. “Então, as mulheres ficam de sete a 10 anos sofrendo até que consigam falar se liberar dos seus agressores”, constata Theresa Martinez.