Passados 47 dias desde que a barragem da Vale se rompeu em Brumadinho, na Grande BH, e com a contabilidade oficial superando a barreira das duas centenas de mortes confirmadas (201 até a noite de ontem), o Corpo de Bombeiros aposta em uma combinação de três frentes de trabalho para localizar os desaparecidos, 107 pessoas. A tecnologia ligada especialmente ao georreferenciamento, o trabalho de cães farejadores e o emprego de máquinas pesadas é a trinca para otimizar a localização de corpos em locais considerados prioritários. Uma das áreas de maior atenção da corporação é a Instalação de Tratamento de Minério (ITM), pois o cruzamento de dados de inteligência aponta que ali podem estar 16 corpos. Segundo os dados oficiais, 107 pessoas seguem desaparecidas em toda a área impactada pelo crime da Vale. Por outro lado, 173 corpos e segmentos corporais aguardam identificação no Instituto Médico Legal.
O trabalho na ITM é um bom exemplo da soma das três apostas dos bombeiros para localizar, o mais rápido possível, todos os desaparecidos. Dados colhidos pela inteligência apontam que ali, provavelmente estavam 16 pessoas que ainda não foram encontradas. Segundo o tenente-coronel Eduardo Ângelo Gomes da Silva, um dos comandantes da operação, como o local conta com uma estrutura de edificação robusta, é mais provável que os corpos de quem estava ali não tenham sido arrastados para pontos distantes, como aconteceu em outros casos de passagem livre do rejeito. Por isso, a operação trabalhou com drenos para diminuir ao máximo a fluidificação do solo no local e permitir a entrada de máquinas pesadas, que atuam para revolver o solo e desmontar a ITM.
Enquanto isso, frentes de trabalho que usam cães farejadores na busca por corpos, como ocorreu ontem. O cão Thor, que pertence aos bombeiros de Minas Gerais, apontou o ponto exato onde foi localizado um corpo. Segundo o sargento Leonardo Costa Pereira, depois que o cachorro farejou uma pista para os militares, foram três horas de escavações manuais até encontrar o corpo, que estava bastante preservado para o tempo em que permaneceu ali. Sempre que o animal aponta uma provável localização, as máquinas param de escavar e o trabalho passa a ser manual. “Quando a fase de degeneração do corpo avança, o odor diminui e só o cão, com sua capacidade olfativa, consegue localizar”, afirma o militar.
MAPA DO INVISÍVEL Na retaguarda desse processo, a tecnologia se apresenta de forma a garantir o georrefereciamento de tudo que é encontrado, seja corpo, segmento ou qualquer objeto. Esse trabalho é que vai municiando os militares de informações para apontar onde as frentes de trabalho devem atuar. Cada bombeiro em campo alimenta um aplicativo desenvolvido pela corporação que posiciona tudo que for encontrado, e assim vai revelando o mapa do que está soterrado pelos rejeitos de minério. Ontem, por exemplo, foram 20 frentes com atuação dos bombeiros e 136 militares envolvidos nos trabalhos. As máquinas pesadas chegaram a 81 unidades e o trabalho ainda conta com o apoio dos sete drones dos bombeiros, que não são usados ao mesmo tempo. Sete duplas formadas por militares e cães atuam em sistema de revezamento.
De acordo com o tenente Pedro Aihara, porta-voz dos bombeiros, a característica da lama impõe uma dificuldade significativa ao trabalho de busca por corpos. “A lama acaba deixando todo o material com essa característica monocromática (uma única cor) e dificulta ainda mais o trabalho de nossas equipes de resgate. Por isso é um trabalho muito meticuloso”, afirma o tenente. Mesmo assim, as buscas vão seguir, segundo o tenente-coronel Ângelo. “Elas só serão encerradas em duas hipóteses. A primeira é o encontro de todo mundo que está desaparecido. A segunda é quando chegar o momento em que o estágio de decomposição de mistura desse material biológico com o rejeito impedir as equipes de continuar os trabalhos. Mas não temos como precisar esse tempo”, completa.