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Estado de Minas

Áreas verdes de BH guardam rico tesouro natural e sofrem pressão imobiliária

Recente decisão de fechar as portas à expansão imobiliária no Belvedere reforça a luta pela proteção de matas que preservam os últimos cursos d'água limpos da capital


postado em 17/03/2019 06:00 / atualizado em 17/03/2019 07:46

No limite com Santa Luzia e Sabará, a área verde de Capitão Eduardo chegou a ser cogitada para receber prédios do Minha casa, minha vida, mas licença foi negada(foto: TÚLIO SANTOS/EM/D.A PRESS)
No limite com Santa Luzia e Sabará, a área verde de Capitão Eduardo chegou a ser cogitada para receber prédios do Minha casa, minha vida, mas licença foi negada (foto: TÚLIO SANTOS/EM/D.A PRESS)

 

Há quase uma década, moradores de um bairro da capital levantam bandeiras, empunham cartazes e põem a boca no mundo, querendo se fazer ouvir e dar visibilidade a um movimento pela qualidade de vida coletiva e preservação urbana. São eles e elas do Planalto, na Região Norte, incansáveis em defender a Mata do Planalto, uma área particular de 200 mil metros quadrados que se une a um parque municipal onde há nascentes, 68 espécies de aves (tucanos, beija-flores-da-fronte-violeta, saracuras e araras), árvores da mata atlântica (ipê, cedro e jacarandá), que proporcionam uma temperatura ao redor bem abaixo da registrada na Avenida Cristiano Guimarães, a principal do bairro, que, assim como o Centro da cidade, está escaldante neste verão. “Não baixamos a guarda para defender este patrimônio natural, que não é apenas nosso, mas de toda Belo Horizonte”, afirma a presidente da Associação Comunitária do Planalto e Adjacências, Magali Ferraz Trindade.

A exemplo da Mata do Planalto, outras áreas da capital guardam seus tesouros ambientais, sofrem pressão do mercado imobiliário e resistem como podem à especulação, embora, de acordo com a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), haja legislação específica e definições bem claras sobre zoneamento urbano e construção em áreas particulares e públicas, além da realização, de quatro em quatro anos, de conferências municipais específicas para debater as políticas urbanas. Mas isso não é o bastante, tanto que a Mata do Isidoro, na Região Norte, incrustada na região do Isidoro e guardando um dos últimos cursos d’água limpos da cidade, o Córrego dos Macacos, já foi alvo de vários projetos imobiliários, mesmo após ser ocupada. Na Região Nordeste, no limite com Santa Luzia e Sabará, se encontra mais uma área cobiçada: a Fazenda Capitão Eduardo, de propriedade da PBH e localizada à margem do Rio das Velhas e da rodovia BR-381. Nos dois casos, os projetos não foram para frente.



A recente decisão do Conselho Municipal de Meio Ambiente de Belo Horizonte (Comam) fechando as portas à expansão do Bairro Belvedere, na Região Centro-Sul, e determinando a recuperação de antiga área de mineração na Serra do Curral anima ambientalistas e abre as janelas para esses pontos que vivem pressionados pela especulação. Porém, isso não é tudo. “Pode entrar outro prefeito e mudar tudo”, diz Magali, que confia na palavra de campanha do chefe do Executivo, Alexandre Kalil, para garantir a integridade da Mata do Planalto. “Já pedimos uma reunião com ele e a secretária municipal de Política Urbana, Maria Caldas. O prefeito nos deu sua palavra e queremos que ela seja mantida, afinal, a conservação ambiental é de interesse da cidade”.

PRÉDIOS No início da tarde de sexta-feira, a presidente da Associação Comunitária do Planalto e Adjacências mostrou o porquê da luta em defesa da Mata do Planalto. Embora seja propriedade particular, e, portanto, vedada a estranhos, paira sobre o espaço um projeto imobiliário da Direcional. Segundo ela, seríam 16 prédios com 16 andares cada um, totalizando 760 apartamentos e 3,5 mil vagas de garagem. O caso está na Justiça, em três ações, sendo uma do Ministério Público (MPMG) e outras da Defensoria Pública e popular. “Imaginem o impacto na região”, alerta Magali, que também se reunirá com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). A mesma região já chegou a despertar o interesse da construtora Rossi.

Pela lei municipal, no caso de imóveis particulares, a construção pode ocupar apenas 30% do terreno, a fim de garantir a sustentabilidade. Mas Magali não deixa de voltar sua atenção para o destino da Mata do Planalto. “Acho que a preocupação maior é com o luxo do condomínio, e não com o meio ambiente.” Olhando para a mata, Magali lembra que há um grande corredor ecológico formado pelo Planalto, Parque Lagoa do Nado e Pampulha. “Nossa proposta é que os prédios sejam erguidos em outra região, com terreno doado pela PBH dentro das normas de transferência do direito de construir”, diz a presidente da associação, que veste a camisa da associação, com uma saracura de “modelo”.

Depois do Planalto, é hora de revisitar duas áreas que impedem, por enquanto, um divórcio entre BH e densas áreas de mata. É realmente de impressionar a massa verde vista do alto, com córregos, caminhos de terra, um e outro habitante passando e o silêncio quebrado apenas pelo bando de maritacas anunciando que vem chuva. Com acesso pela rodovia MG-020, no sentido Santa Luzia, a Mata do Isidoro já ganhou o noticiário várias vezes devido à especulação imobiliária. Em 2010, por exemplo, chegou a ser divulgado um grande empreendimento, com milhares de unidades, tendo em vista a Copa do Mundo de 2014. O projeto de operação urbana não vingou, embora tenha recebido licença prévia. Na sequência, veio o projeto de prédios do Minha casa, minha vida, mas o que ocorreu mesmo foi a ocupação de várias partes. De acordo com a PBH, em 2018, o prefeito assinou o Decreto 16.888/2018, sobre a questão fundiária, reconhecendo como de interesse social 119 assentamentos, entre os quais alguns na região do Isidoro.

A Mata do Isidoro entrou nos planos de megaempreendimento para a Copa do Mundo de 2014. Em 2018, a PBH reconheceu a importância social de ocupações do local(foto: TÚLIO SANTOS/EM/D.A PRESS)
A Mata do Isidoro entrou nos planos de megaempreendimento para a Copa do Mundo de 2014. Em 2018, a PBH reconheceu a importância social de ocupações do local (foto: TÚLIO SANTOS/EM/D.A PRESS)


CAPITÃO EDUARDO Da Mata do Isidoro, a equipe do Estado de Minas seguiu em direção à Fazenda Capitão Eduardo, passando pelos bairros Ribeiro de Abreu, Paulo VI e Capitão Eduardo, percorrendo trechos de asfalto e terra. Quando o carro está quase chegando à fazenda, propriedade da PBH, dois arco-íris surgem para dar as boas-vindas. A chuva está longe, do lado de Sabará, e em nada atrapalha a paisagem de mata fechadas. “Isto aqui é um paraíso. Tem pacas, veadinhos e outros bichos. O silêncio é grande, você precisa de ver”, conta, mineiramente, um homem que foi trabalhar por ali há oito anos e acabou habitando um “rancho” de frente para a floresta. Do alto, dá para ver a BR-381 e a ferrovia.

A Área de Proteção Ambiental (APP) da fazenda também já esteve no foco de construção de prédios do Minha casa, minha vida, mas o Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) indeferiu o pedido de licenciamento. Hoje, há na região um Posto Policial Montado da Polícia Militar. “Tomara que continue sempre assim, essa paz e esse sossego. A capital precisa respirar”, diz o morador. A nota dissonante se refere à quantidade de bota-foras e descarte de lixo doméstico, que não só atraem urubus, como trazem um cheiro insuportável à região.

O diretor de Licenciamento Ambiental da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Pedro Franzoni, explica que, atualmente, são poucas as áreas de expressividade ambiental dentro de Belo Horizonte que têm um zoneamento ambiental bem definido. “São muito importantes para a capital, pois, além do verde, há nascentes. Como são poucas áreas, é aquela história: em terra de cego, quem tem olho é rei. Portanto, precisam ser preservadas”, afirma Franzoni. Ele acrescenta que o Parque Estadual Mata da Baleia, na Região Leste, está regulamentado, portanto, imune às construtoras, embora a especulação imobiliária se estenda para o outro lado da Serra do Curral, na vizinha Nova Lima. “Este trecho é um corredor ecológico importante, com a presença de onças, lobos-guarás e outros animais”, afirma. Outra informação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente valoriza as ações populares, pois, depois de muita luta de ambientalistas e moradores, uma área no Bairro Jardim Vitória será preservada, a partir de modificação no zoneamento de proteção ambiental.

DECISÃO Cerca de um mês após a tragédia em Brumadinho, o Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comam) tomou uma decisão aplaudida pelos ambientalistas e considerada histórica. Os conselheiros definiram que toda a extensão da área de abrangência da Mineração Lagoa Seca, explorada por mais de 50 anos na Serra do Curral, deve ser recuperada e destinada a uso público. O empreendedor responsável pela área havia apresentado um projeto batizado de “Legado da Serra”, que deixava de fora da área a ser recuperada uma parte do terreno. Dessa forma, há mais esperança para ambientalistas e defensores de melhor qualidade de vida na capital de cerca de 2,5 milhões de habitantes.

"Não baixamos a guarda para defender este patrimônio natural, que não é apenas nosso, mas de toda Belo Horizonte." - Magali Ferraz Trindade, presidente da Associação Comunitária do Planalto e Adjacências (foto: TÚLIO SANTOS/EM/D.A PRESS)

 

PATRIMÔNIOS VERDES


» Mata do Planalto
Onde fica: Região Norte, perto do Parque Municipal do Planalto
Área: 200 mil metros quadrados
Propriedade: Particular
Pressão imobiliária: Construção de prédios com 760 apartamentos e 3,5 mil vagas de garagem
Situação atual: Há ação popular na Justiça e promessa de campanha do prefeito Alexandre Kalil de preservar
a Mata

» Mata do Isidoro
Onde fica: Região Norte, no limite com Santa Luzia
Área: 10km² (a área interna da Avenida do Contorno tem 8,9km²)
Propriedade: De particulares, incluindo a Granja Werneck
Pressão imobiliária: Antes da Copa do Mundo de 2014, foi anunciado um empreeendimento para o local. Também foi concedida licença prévia para construção de prédios do Minha casa, minha vida
Situação atual: Parte da área foi ocupada e recebeu, no ano passado, o reconhecimento da PBH de ser um assentamento com interesse social

» Capitão Eduardo
Onde fica: Região Nordeste, no limite com Santa Luzia e Sabará, às margens do Rio das Velhas e rodovia BR-381
Área: 521,9 hectares
Propriedade: Prefeitura de Belo Horizonte
Pressão imobiliária: Foi planejada a construção prédios do Minha casa, minha vida, mas o Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) indeferiu o pedido de licenciamento
Situação atual: Não há construções, a não ser um Posto Policial Montado da Polícia Militar de Minas Gerais

FONTES: PESQUISA EM, PREFEITURA, ASSOCIAÇÕES DE MORADORES E OUTROS


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