Um colapso previsto em todas as suas dimensões. O Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração (PAEBM), linha condutora das investigações da força-tarefa que apura as causas do rompimento na Mina Córrego do Feijão, que matou até o momento 207 pessoas e deixou 101 desaparecidas, mostra claramente quais são os sinais de alerta, as medidas a serem tomadas e, a partir disso, os níveis de emergência que vão de 1 a 3, sendo o último situação de ruptura iminente ou que está ocorrendo. A hipótese de liquefação dos rejeitos, levantada nas investigações e por especialistas, é uma das causas apontadas no documento para a falha de estabilidade da Barragem 1, que se rompeu em 25 de janeiro.
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As responsabilidades durante a emergência são bem definidas do documento de 73 páginas ao qual o Estado de Minas teve acesso. Internamente, os funcionários da Vale deveriam detectar, avaliar e classificar a emergência, tomar decisão, executar as ações corretivas, alertar a população da zona de autossalvamento e comunicar os agentes externos. Externamente, a atuação fica por conta de órgãos da esfera municipal, estadual e federal. A função de cada envolvido no plano está previamente estabelecida, com direito a fluxograma mostrando a ordem das ações e as medidas esperadas de acordo com a gravidade da situação. São 14 funcionários tidos como responsáveis pelo acionamento do plano em caso de emergência. Três deles foram presos na primeira operação da força-tarefa: o geólogo César Grandchamp; o gerente de meio ambiente, saúde e segurança do complexo minerário, Ricardo de Oliveira; e o gerente-executivo operacional Rodrigo Melo.
Documentos internos da Vale obtidos na investigação mostram que, além da barragem de Brumadinho, todas as estruturas operadas pela mineradora que recentemente tiveram seus planos de emergência acionados recentemente – Mina de Gongo Soco, em Barão de Cocais; B3/B4, na Mina de Mar Azul, em Nova Lima, Barragem Vargem Grande, no Complexo de Vargem Grande, em Nova Lima, e barragens de Forquilha I, Forquilha II, Forquilha III e Grupo, na Mina de Fábrica, em Ouro Preto – tinham risco de rompimento que ensejava sua inclusão na matriz de riscos da empresa e a submissão ao conhecimento da diretoria, do presidente Fábio Schvartsman e do conselho de administração. Para a força-tarefa, tudo aponta para o fato de que a cúpula da mineradora era alimentada frequentemente com informações relacionadas às condições de segurança das estruturas sob responsabilidade da empresa.
SINAIS De acordo com as investigações, em março e dezembro do ano passado e em janeiro deste ano foram detectadas várias anomalias nas leituras de equipamento instalado para monitorar o comportamento da estrutura do maciço da barragem. Em janeiro, foram detectadas também leituras inconsistentes em diversos piezômetros instalados no maciço, apontando variações importantes na pressão da água na sua estrutura. De acordo com as apurações, não foram adotadas “providências capazes de afastar de forma cabal a ocorrência de risco iminente de rompimento da barragem, nem adotadas as medidas de cautela previstas no PAEBM, tais como suspensão das atividades e evacuação das áreas potencialmente afetadas, inclusive das estruturas de uso coletivo da própria Vale, até o esclarecimento da situação”.
Documento da força-tarefa mostra que todas as ocorrências foram formalmente reportadas a integrantes da equipe de geotecnia operacional da Vale, “daí não decorrendo qualquer providência concreta, mas, ao contrário, tendo sido o operador do equipamento sido advertido para ir ‘com calma que o andor é de barro’”. A frase é de César Grandchamp, em e-mail encaminhado em março do ano passado a um operador que, em depoimento disse ter entendido a frase como um alerta de “fica na sua, fica calado e faz o seu serviço”..