Brumadinho – A força veio das entranhas; a atitude, da urgência; e a generosidade, lá do fundo do coração. Durante dias e noites, dezenas de homens e mulheres se dedicaram, anonimamente, para dar sua parcela de contribuição a quem sofreu com o rompimento, em 25 de janeiro, da barragem da Mina Córrego do Feijão, da Vale, em Brumadinho, na Grande BH. Bombeiros, voluntários e pessoas sem casa ganharam um canto para descansar, saciaram a fome com um caldo quente e ouviram uma palavra de amizade para amenizar a dor do esforço físico insano, da perda e das incertezas.
Leia Mais
'Sou uma missionária, então ajudo com amor': enfermeira avisou vizinhos sobre rompimento de barragemMPMG pede agilidade na entrega das doações aos atingidos em BrumadinhoConheça o radar que vigia barragem com risco de rompimento em MacacosJá na sede municipal, o estudante de engenharia civil João Marcos Moreira praticamente se mudou para a quadra de esporte onde foi feita a distribuição de água e alimentos. Impressionado com a rede de união e solidariedade formada na sua cidade, o jovem não tem dúvida de que “a humanidade tem salvação”. Nesta reportagem, o Estado de Minas conta um pouco da história de quem se dedicou de corpo e alma para ajudar e sabe que a história está longe de ter um ponto final. “A tragédia está viva; aqui, em Córrego do Feijão, não tem nada de normal”, ressalta a professora Maria Antônia, que, a exemplo de muita gente, ainda não consegue dormir direito.
A estrada de Brumadinho à comunidade de Córrego do Feijão, passando por Alberto Flores, já foi liberada, embora levas de trabalhadores estejam no local com seus uniformes e capacetes.
Recém-chegada da missão diária na Escola Municipal Nossa Senhora das Dores, onde leciona há 17 anos, Maria Antônia recosta-se no sofá da sala para a conversa com o Estado de Minas – curiosamente, pouco depois do meio-dia, quando ocorreu o rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão que mudou a história da localidade e, mais do que isso, de cada um dos seus 300 habitantes. Tão logo o mundo virou de cabeça para baixo na cidade da Grande BH, em 25 de janeiro, a professora tratou de usar toda a força e energia para ajudar a quem mais necessitasse. E foi assim que tomou a iniciativa de abrir as portas da escola, bem em frente da casa, para abrigar 70 bombeiros que chegaram para tentar encontrar vivos e resgatar os mortos do lamaçal.
“A estrada foi destruída, ficamos sem ponte, então a diretora da escola não tinha acesso e não pôde vir durante sete dias. Como eu era a única professora em Córrego do Feijão, tive de tomar providências”, afirma Maria Antônia, divorciada e mãe de uma arquiteta que divide seu tempo entre a capital e Brumadinho. Dessa forma, passou a se dedicar aos desdobramentos da catástrofe de manhã a tarde da noite.
QUARTEL-GENERAL Passado o terror inicial, Maria Antônia viu que era hora de agir com cabeça fria, algo quase impossível no torvelinho de más notícias: “Os primeiros dias foram difíceis, tristes, a cada hora chegavam informações de mais e mais mortos”. A escola se tornou um suporte fundamental do quartel-general montado pelos militares na Igreja Nossa Senhora das Dores (posto avançado). “Recebíamos cestas básicas, remédios, material de limpeza, alimentos. Criamos no WhatsApp o grupo Voluntários do Bem. Fiquei encarregada, informalmente, de organizar tudo com uma equipe de oito pessoas trabalhando duro.” Quando a turma foi desfeita, ela continuou a postos: “Ficamos emocionalmente debilitados, sentimos na pele a dor dos outros. Os bombeiros também ficaram nessa situação. Mas nunca vou me esquecer do agradecimento deles quando oferecíamos um café quentinho”.