A menina R., de 2 anos, espera há 10 meses por cirurgia para retirada de bolsa de colostomia, procedimento realizado como parte do tratamento de um problema no intestino. O problema limita a vida da menina, que não pode desfrutar da infância plenamente. Assim como ela, outras crianças precisam esperar – prazo que pode chegar a até um ano – para ser operadas na rede hospitalar pública de Minas Gerais. Um dos motivos da espera decorre da inexistência de bloco cirúrgico no Hospital Infantil João Paulo II (HIJPII), antigo Centro Geral de Pediatria (CGP), único hospital pediátrico público de Minas, o que dificulta o atendimento e faz com que famílias enfrentem fila para a realização de procedimentos que exigem intervenção cirúrgica.
A ONG já financiou a construção de seis estruturas semelhantes no mundo: uma em Serra Leoa, duas em Ruanda, duas no Malawi e uma na Tanzânia. Um dos pesquisadores do programa chegará a Belo Horizonte na semana que vem para auxiliar em pesquisas sobre a qualidade de atendimento a pacientes com doenças cirúrgicas. Uma das propostas do cirurgião pediátrico Fábio Mendes Botelho Filho, que colabora com o programa de Harvard, é mensurar os impactos que a inexistência de um bloco cirúrgico no único hospital pediátrico do estado tem para a saúde das crianças mineiras.
Atualmente, as crianças que precisam ser operadas na rede, tanto em cirurgias de urgência quanto eletivas, são levadas para hospitais gerais, que atendem pessoas de todas as idades, como o Hospital de Pronto-Socorro João XXIII e Hospital Odilon Behrens. O Hospital Infantil João Paulo II tem 150 leitos, sendo 20 na terapia intensiva, mas não há espaço para a realização de cirurgias simples, embora haja cirurgiões pediátricos na equipe médica. Não podem ser realizados até mesmo procedimentos menos complicados, mas que necessitam de urgência para evitar a morte da criança, como a retirada de apêndice. “Estamos perdendo crianças por falta de investimento”, afirma o cirurgião pediátrico Fábio Mendes Botelho Filho.
ANGÚSTIA Muitas famílias ficam meses na espera de vagas para a realização de cirurgias. É o caso da dona de casa Jussilene Gonçalves dos Santos, de 28 anos, que luta para conseguir tratamento da filha de 2 anos. Em função de uma distensão abdominal, a menina não conseguia se alimentar direito desde os primeiros meses de vida e teve de ser submetida, em sua cidade, a cirurgia de urgência. Desde então, passou a usar bolsa de colostomia. Esperou seis meses para conseguir consulta no serviço de gastroenterologia e quando, enfim, foi atendida no CGP, teve de ser transferida para o Hospital das Clínicas para a realização de cirurgia para retirada da bolsa de colostomia. Mesmo tendo sido solicitado a transferência em caráter de urgência, foi necessário esperar 15 dias por uma vaga.
A família de Jussilene mora no distrito de Pedro Versiani, em Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, e tem enfrentado obstáculos para dar sequência ao tratamento da menina. “Muito difícil. Já estava indo para São Paulo para ver se conseguiria fazer a cirurgia dela lá”, afirma. Foram oito meses para conseguir consulta no Hospital Infantil João Paulo II para a cirurgia para fechar a colostomia. A menina ainda deverá esperar 90 dias para ser submetida à cirurgia definitiva. “O tempo em que fiquei lá com ela no CGP, aguardando transferência para o HC, já teria resolvido o problema dela. Já tinha feito cirurgia definitiva. Fiquei quase um mês esperando a transferência”, relata.
Fábio Mendes apresentou o cenário da cirurgia pediátrica no estado à ONG escocesa. O especialista demonstrou à KidsOR o quanto o bloco cirúrgico a ser construído no hospital público em Minas ampliaria o atendimento pediátrico. Em seis anos, as construções das seis salas resultaram na realização de mais de 6 mil cirurgias. “Se tivéssemos um bloco cirúrgico, com seis salas, teríamos esse número total de cirurgias por ano”, afirma Fábio. Ele toma como referência o número de cirurgias pediátricas realizadas em uma única sala do bloco cirúrgico do Hospital das Clínicas, 1 mil cirurgias por ano.
O especialista reforça que é importante sensibilizar os governantes sobre a importância de políticas públicas para melhorar o atendimento à população infantil. “O melhor investimento em saúde pública é investir em cirurgias pediátricas”, diz. Ele se refere ao fato de que a não realização de uma cirurgia na infância pode incapacitar o sujeito, que, além de ter dificuldade de imersão no mercado de trabalho, pode depender de assistência do Estado, o que gera custos.
HOSPITAL CLÍNICO De acordo com a assessoria de imprensa da Fhemig, o Hospital Infantil João Paulo II encaminha para cirurgias programadas de 25 a 30 crianças por ano. As cirurgias de urgência são transferidas para outras unidades, entre elas o Hospital João XXIII; o número varia de 10 a 15 por mês. No ano de 2018, foram realizadas 903 cirurgias de crianças e adolescentes, com até 14 anos, no Hospital João XXIII. No Hospital João Penido, em Juiz de Fora, foram realizadas cerca de 300 cirurgias pediátricas. No Hospital Regional Antônio Dias, em Patos de Minas, foram realizadas 318 de emergência em 2018, incluídos os pequenos procedimentos (faixa etária de até 14 anos). A assessoria acrescentou que “o HIJPII é tradicionalmente um hospital clínico.” Informou ainda que há proposta de elaboração de um projeto para a construção de um bloco cirúrgico em um prédio anexo ao da unidade, mas não há prazo definido.
No fim de março, o serviço de urgência já registrava um crescimento na demanda de mais de cinco vezes. De uma média de 150 atendimentos por dia, saltou para 783. A dona de casa Viviane Monteiro, de 41 anos, chegou ao local com o filho Bernardo, de 5, às 16h de sábado. O menino, que estava com suspeita de dengue, foi atendido às 5h de ontem. Fez os exames e, por volta das 10h, ainda aguardava os resultados. “A médica disse, quase chorando, que nunca passou por um plantão desses. As pessoas estão aguardando em média 15 horas. Este fim de semana foi um dos piores em termos de tempo de espera”, comentou Viviane. “O governo mandou os contratados embora e só os médicos concursados estão atendendo”, disse. Neste domingo, dois médicos estavam trabalhando, sendo um no consultório e outro na emergência.
Relatos de outros pais e mães dão conta de que os próprios médicos chamaram a polícia há alguns dias para registra um boletim de ocorrência por causa da situação. Por meio de nota, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) informou que o número de atendimentos aumentou bastante nos últimos dias em decorrência, principalmente, dos casos de virose e dengue. Para suprir o déficit de pessoal no hospital, a Fhemig solicitou à Secretaria de Estado de Planejamento a substituição de vacância de médico – quadro vago por aposentadoria e/ou falecimento. “Como solução emergencial está sendo avaliado o remanejamento de vagas de outras unidades para o Hospital Infantil João Paulo II”, informou a Fhemig.
A ONG já financiou a construção de seis estruturas semelhantes no mundo: uma em Serra Leoa, duas em Ruanda, duas no Malawi e uma na Tanzânia. Um dos pesquisadores do programa chegará a Belo Horizonte na semana que vem para auxiliar em pesquisas sobre a qualidade de atendimento a pacientes com doenças cirúrgicas. Uma das propostas do cirurgião pediátrico Fábio Mendes Botelho Filho, que colabora com o programa de Harvard, é mensurar os impactos que a inexistência de um bloco cirúrgico no único hospital pediátrico do estado tem para a saúde das crianças mineiras.
Atualmente, as crianças que precisam ser operadas na rede, tanto em cirurgias de urgência quanto eletivas, são levadas para hospitais gerais, que atendem pessoas de todas as idades, como o Hospital de Pronto-Socorro João XXIII e Hospital Odilon Behrens. O Hospital Infantil João Paulo II tem 150 leitos, sendo 20 na terapia intensiva, mas não há espaço para a realização de cirurgias simples, embora haja cirurgiões pediátricos na equipe médica. Não podem ser realizados até mesmo procedimentos menos complicados, mas que necessitam de urgência para evitar a morte da criança, como a retirada de apêndice. “Estamos perdendo crianças por falta de investimento”, afirma o cirurgião pediátrico Fábio Mendes Botelho Filho.
ANGÚSTIA Muitas famílias ficam meses na espera de vagas para a realização de cirurgias. É o caso da dona de casa Jussilene Gonçalves dos Santos, de 28 anos, que luta para conseguir tratamento da filha de 2 anos. Em função de uma distensão abdominal, a menina não conseguia se alimentar direito desde os primeiros meses de vida e teve de ser submetida, em sua cidade, a cirurgia de urgência. Desde então, passou a usar bolsa de colostomia. Esperou seis meses para conseguir consulta no serviço de gastroenterologia e quando, enfim, foi atendida no CGP, teve de ser transferida para o Hospital das Clínicas para a realização de cirurgia para retirada da bolsa de colostomia. Mesmo tendo sido solicitado a transferência em caráter de urgência, foi necessário esperar 15 dias por uma vaga.
A família de Jussilene mora no distrito de Pedro Versiani, em Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, e tem enfrentado obstáculos para dar sequência ao tratamento da menina. “Muito difícil. Já estava indo para São Paulo para ver se conseguiria fazer a cirurgia dela lá”, afirma. Foram oito meses para conseguir consulta no Hospital Infantil João Paulo II para a cirurgia para fechar a colostomia. A menina ainda deverá esperar 90 dias para ser submetida à cirurgia definitiva. “O tempo em que fiquei lá com ela no CGP, aguardando transferência para o HC, já teria resolvido o problema dela. Já tinha feito cirurgia definitiva. Fiquei quase um mês esperando a transferência”, relata.
A construção do bloco pode beneficiar 1,5 milhão de crianças, de acordo com os cálculos de Fábio Mendes. Cerca de 10% de crianças vão precisar fazer algum tipo de cirurgia geral em um período da infância. As doenças cirúrgicas mais comuns são apendicite, hérnias, malformações congênitas, tumores e traumas. Se acrescentar a esses números as cirurgias realizadas na cardiologia, ortopedia e otorrinolaringologia, o percentual de crianças que vão se submeter a cirurgias pode chegar a 30% da população em Minas com até 14 anos, cerca de 5 milhões. Como não dispõe de bloco cirúrgico, o HIJPII encaminha os pacientes com demanda de cirurgia eletiva para serem cadastrados na central de internação da Prefeitura de Belo Horizonte. As cirurgias de urgência são encaminhadas para os hospitais pactuados da rede de urgência do estado."Estamos perdendo crianças por falta de investimento"
Fábio Mendes Botelho Filho, cirurgião pediátrico
Fábio Mendes apresentou o cenário da cirurgia pediátrica no estado à ONG escocesa. O especialista demonstrou à KidsOR o quanto o bloco cirúrgico a ser construído no hospital público em Minas ampliaria o atendimento pediátrico. Em seis anos, as construções das seis salas resultaram na realização de mais de 6 mil cirurgias. “Se tivéssemos um bloco cirúrgico, com seis salas, teríamos esse número total de cirurgias por ano”, afirma Fábio. Ele toma como referência o número de cirurgias pediátricas realizadas em uma única sala do bloco cirúrgico do Hospital das Clínicas, 1 mil cirurgias por ano.
O especialista reforça que é importante sensibilizar os governantes sobre a importância de políticas públicas para melhorar o atendimento à população infantil. “O melhor investimento em saúde pública é investir em cirurgias pediátricas”, diz. Ele se refere ao fato de que a não realização de uma cirurgia na infância pode incapacitar o sujeito, que, além de ter dificuldade de imersão no mercado de trabalho, pode depender de assistência do Estado, o que gera custos.
HOSPITAL CLÍNICO De acordo com a assessoria de imprensa da Fhemig, o Hospital Infantil João Paulo II encaminha para cirurgias programadas de 25 a 30 crianças por ano. As cirurgias de urgência são transferidas para outras unidades, entre elas o Hospital João XXIII; o número varia de 10 a 15 por mês. No ano de 2018, foram realizadas 903 cirurgias de crianças e adolescentes, com até 14 anos, no Hospital João XXIII. No Hospital João Penido, em Juiz de Fora, foram realizadas cerca de 300 cirurgias pediátricas. No Hospital Regional Antônio Dias, em Patos de Minas, foram realizadas 318 de emergência em 2018, incluídos os pequenos procedimentos (faixa etária de até 14 anos). A assessoria acrescentou que “o HIJPII é tradicionalmente um hospital clínico.” Informou ainda que há proposta de elaboração de um projeto para a construção de um bloco cirúrgico em um prédio anexo ao da unidade, mas não há prazo definido.
Espera de até 15 horas por atendimento
(Junia Oliveira) Crianças que precisam de atendimento no Hospital Infantil João Paulo II estão tendo de enfrentar um componente tão doloroso quanto a doença: uma espera que pode chegar a 15 horas. A demora se deve à alta demanda neste período do ano, além de estar associada à falta de médicos na unidade. Em carta à diretoria, médicos plantonistas pedem medidas urgentes e posicionamento imediato dos órgãos responsáveis para resolver a questão, além da realização de novas contratações. Atendimento diário aumentou em 74% nos últimos dias.No fim de março, o serviço de urgência já registrava um crescimento na demanda de mais de cinco vezes. De uma média de 150 atendimentos por dia, saltou para 783. A dona de casa Viviane Monteiro, de 41 anos, chegou ao local com o filho Bernardo, de 5, às 16h de sábado. O menino, que estava com suspeita de dengue, foi atendido às 5h de ontem. Fez os exames e, por volta das 10h, ainda aguardava os resultados. “A médica disse, quase chorando, que nunca passou por um plantão desses. As pessoas estão aguardando em média 15 horas. Este fim de semana foi um dos piores em termos de tempo de espera”, comentou Viviane. “O governo mandou os contratados embora e só os médicos concursados estão atendendo”, disse. Neste domingo, dois médicos estavam trabalhando, sendo um no consultório e outro na emergência.
Relatos de outros pais e mães dão conta de que os próprios médicos chamaram a polícia há alguns dias para registra um boletim de ocorrência por causa da situação. Por meio de nota, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) informou que o número de atendimentos aumentou bastante nos últimos dias em decorrência, principalmente, dos casos de virose e dengue. Para suprir o déficit de pessoal no hospital, a Fhemig solicitou à Secretaria de Estado de Planejamento a substituição de vacância de médico – quadro vago por aposentadoria e/ou falecimento. “Como solução emergencial está sendo avaliado o remanejamento de vagas de outras unidades para o Hospital Infantil João Paulo II”, informou a Fhemig.