Acordo de indenização extrajudicial firmado entre a Defensoria Pública de Minas Gerais e a Vale põe em xeque a coesão da força-tarefa que busca a reparação dos danos causados aos moradores de Brumadinho após o rompimento da barragem 1 da Mina Córrego do Feijão. Isso porque o órgão público teria concretizado o acordo sem avisar as demais instituições que integram a equipe - os ministérios públicos de Minas Gerais (MPMG) e Federal (MPF) e a Advocacia-Geral do Estado (AGE-MG).
Entre os pontos do acordo está a possibilidade de os atingidos negociarem de forma extrajudicial e individual com a mineradora o valor das indenizações a serem pagas pela empresa. Além disso, as partes criaram uma tabela de preços relativos a cada dano sofrido.
De acordo com a Defensoria Pública, esses valores não serão divulgados, “por respeito e proteção aos interessados, que terão, após conhecer o montante, prazo suficiente para avaliar a conveniência de assinar ou não o acordo, além de outro prazo para desistência, caso desejem”.
O acordo foi fortemente criticado pelo MPMG, que acredita que seus termos podem enfraquecer e prejudicar os afetados. “A defensoria surpreendeu a todos”, afirmou o promotor de Justiça André Sperling, que tem forte atuação na força-tarefa. Ele lembrou que, no dia 4, a força-tarefa chegou a
fechar questão sobre a prioridade das ações coletivas no processo de indenização.
O órgão denuncia a falta de transparência da tabela de valores por dano, que teria sido feita sem a participação de representantes dos atingidos. O receio dos promotores à frente das negociações é de que as pessoas participem de audiências individuais com parâmetros que elas não conhecem.
O promotor ainda aponta “falta de ética” da Defensoria Pública ao estabelecer esses valores. Sperling questiona o fato de a instituição estar nas mesas de negociação defendendo os afetados ao mesmo tempo em que construiu a tabela com a Vale. “É uma questão de ética. Ela (Defensoria Pública) perde a imparcialidade. Ela negociou com a Vale, quando devia estar defendendo os atingidos”, argumenta Sperling.
Por sua vez, em nota divulgada em seu site, a Defensoria Pública de Minas Gerais reforça a ideia de que está do lado dos atingidos. “Desde o dia de 25 de janeiro de 2019, data do rompimento da Barragem da Mina do Feijão, a DPMG está em contato direto com os atingidos, prestando assistência, realizando atendimentos, intermediando as demandas mais urgentes diretamente com a Vale, ajuizando ações individuais sobre questões que dependem de manifestação do Judiciário, como alvarás, guardas, declaração de ausências, etc., e participando de todas as discussões e ações coletivas”, divulgou.
De acordo com o órgão, o acordo vem para evitar desfecho parecido com o de Mariana, onde os atingidos ainda não receberam as indenizações pelo desastre.
“A Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais respeita a autonomia e a capacidade dos seus assistidos, garante que direitos não serão preteridos, muito pelo contrário, acredita que a solução extrajudicial será capaz de garantir indenização condizente com a perda de cada um, em curto tempo, ou seja, de forma célere e efetiva, sem que o cidadão atingido, que assim deseje, fique esperando pelo resultado de uma ação judicial”, conclui.
“Dividir para conquistar”
Apesar dos desencontros, Sperling garante que a força-tarefa continua unida para garantir os direitos dos afetados pelo rompimento da barragem. O promotor de Justiça acusa a Vale de tentar gerar conflitos entre as instituições públicas.
De acordo com ele, após sucessivas derrotas na 6ª Vara da Fazenda Pública Estadual, a mineradora buscou uma outra estratégia para atenuar suas perdas com a tragédia: “Dividir as instituições e os indivíduos. Dividir para conquistar.”
Questionado sobre as opções legais que o MPMG tem para barrar o acordo entre a defensoria e a Vale, Sperling diz que a ideia é, primeiramente, convencer a instituição de que os pontos acordados foram equívocos. No entanto, caso o órgão não tenha êxito, a discussão pode ser levada à Justiça.
Consultada sobre as divergências entre o MPMG e a defensoria, a Vale se limitou, por meio de nota, a confirmar os termos do acordo e informar que a opção já está disponível para os interessados "em formalizar acordos para indenizações, por danos materiais ou morais".
No texto, ela orienta essas pessoas a procurarem a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais em Brumadinho. "A instituição presta assistência jurídica integral e gratuita a todos os cidadãos, com foco, entre outras coisas, na garantia do acesso à justiça e no fomento à solução pacífica de conflitos sociais, sendo fundamental ao processo de efetivação de direitos", diz o texto.
No texto, ela orienta essas pessoas a procurarem a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais em Brumadinho. "A instituição presta assistência jurídica integral e gratuita a todos os cidadãos, com foco, entre outras coisas, na garantia do acesso à justiça e no fomento à solução pacífica de conflitos sociais, sendo fundamental ao processo de efetivação de direitos", diz o texto.
*Estagiário sob supervisão da subeditora Rachel Botelho