Uma apreensão que há anos paira sobre as cabeças de moradores do Bairro Caiçara, na Região Noroeste de Belo Horizonte, se concretizou ontem, na forma de uma bola de fogo que explodiu na Rua Minerva, diante do número 405, em meio a dezenas de moradias, a poucos metros de provocar uma tragédia. Com um histórico de medo representado pelos aviões que passam em voos rasantes sobre os prédios e casas da região, a comunidade assistiu ontem à queda de uma aeronave de pequeno porte, em desastre que matou um instrutor que retornava ao Aeroporto Carlos Prates, no vizinho Bairro Padre Eustáquio, onde predominam os voos de aprendizagem.
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Foi quando Izilda da Silva Lopes, de 65 anos, ouviu explosões na porta de sua casa, no número 440 da Rua Minerva. “Ouvi dois estrondos muito intensos e vi o fogo, que já estava bem alto. Eu e um vizinho saímos de casa com mangueiras para tentar conter as chamas. Quando os bombeiros chegaram, já não havia fogo”, disse. A aeronave que caiu ontem, de modelo francês Socata ST-10 Diplomate, tinha capacidade para quatro ocupantes.
O avião bateu em um poste e arrastou parte da fiação da Rua Minerva. Segundo uma testemunha, o aparelho desviou de um prédio antes de cair, em frente às casas e diante de um lote vago, que poderia ser o alvo do piloto.
Segundo Izilda Lopes, a sensação de ouvir os aviões passarem tão baixo sobre as moradias do bairro é “horrível” e significa medo constante para os moradores do Caiçara. Para Maria Elisa, que mora na Rua Francisco Bicalho, paralela à Rua Minerva, local da queda, o acidente era um desastre anunciado. “Já fiz contato com o aeroclube e com a Infraero. Os aviões passam muito baixo. São voos rasantes, que causam preocupação para quem mora perto”, afirmou.
Também residente no Caiçara, José Chartone reclama da proximidade do aeroporto, cuja cabeceira da pista fica a cerca de um quilômetro em linha reta do lugar onde o piloto morreu ontem. “É muito próximo.
Mesmo depois do desastre de ontem, o tráfego aéreo não foi suspenso no entorno do Aeroporto Carlos Prates. Pelo menos três aviões cruzaram os céus do Caiçara enquanto bombeiros e peritos trabalhavam no local do acidente. Segundo o coordenador do 3º Batalhão do Corpo de Bombeiros, tenente Arthur Henrique Santos Ferreira, o avião decolou do aeroporto Carlos Prates às 15h15. Ele afirmou que, conforme o plano de voo, a suspeita é de que um homem de “meia-idade” seja o piloto morto. Contudo, até o fechamento desta edição não havia confirmação oficial da identidade da vítima.
Depoimento
Vivendo sob o medo
“Moro no Bairro Caiçara há mais de 20 anos e convivo frequentemente com o medo e a insegurança por causa de aviões de pequeno porte que sobrevoam diariamente a região, às vezes tão baixo que provocam calafrios.
naqueles rostos.” (Teresa Caram/Editora de Suplementos)
Piloto pode ter evitado o pior
A experiência do piloto a bordo do avião Socata ST-10 Diplomate, que caiu ontem no Bairro Caiçara, Noroeste de Belo Horizonte, pode ter sido fundamental para evitar uma tragédia de maiores proporções. Em um bairro tomado por prédios e casas, a teoria de quem viu a aeronave cair é de que o instrutor pode ter tentado direcionar o aparelho a um lote vago da Rua Minerva. É no que acredita o contador Nélio Godinho, de uma casa vizinha ao local do acidente. “Infelizmente o piloto faleceu, mas parece que ele procurou um lote vago.
O estrago poderia ter proporções muito maiores também se o avião caísse em uma subestação da Cemig, situada a menos de dois quarteirões. “Imagine o tamanho da tragédia que seria? Não deveria existir escola de pilotagem próxima a residências. Agora, começou a ter treinamento de helicóptero também, que é ainda mais perigoso”, disse César Morais, também morador do Caiçara, em referência às atividades de aprendizagem no Aeroporto Carlos Prates, de onde a aeronave decolou. Levantamento feito pelo Estado de Minas mostra que, de oito acidentes em área urbana registrados em BH desde 2008, apenas um não envolveu aeronaves que decolaram do terminal (leia abaixo).
Hoje, peritos do Terceiro Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Seripa 3), ligado ao Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), começam as apurações sobre a queda do avião. Sem saber explicar o porquê da tragédia, Paulo Pacífico, que se apresentou como amigo do piloto morto e mecânico da aeronave, disse que não havia qualquer problema técnico no aparelho. Ele disse que esteve com a vítima na manhã de ontem, pouco antes do acidente. “Não sei explicar o motivo, mas ele tinha experiência e capacidade para voar neste avião. O avião estava Ok, não tinha perigo algum. Estava tudo checado”, destacou.
Segundo Paulo, as manutenções estavam em dia, assim como as licenças da aeronave de fabricação francesa. Ainda de acordo com o mecânico, o piloto deixou dois filhos de cerca de 20 anos e via a aviação como hobby para os fins de semana.
Uma década de risco
Entre acidentes registrados em área urbana de Belo Horizonte nos últimos 10 anos, apenas um não envolveu aeronave que havia decolado do Aeroporto Carlos Prates
2008
Setembro
Um avião de pequeno porte cai no telhado de um depósito de materiais no Jardim Montanhês, em Belo Horizonte, instantes depois de decolar do Aeroporto Carlos Prates. O galpão pegou fogo após o impacto. Três pessoas ficaram feridas.
2012
Maio
Uma aeronave de pequeno porte caiu em um barranco próximo à cabeceira da pista do Aeroporto Carlos Prates. A aeronave apresentou problemas mecânicos ao decolar e o piloto não conseguiu pará-la a tempo. Não houve feridos.
Agosto
Um helicóptero AS 50 Esquilo caiu na cabeceira do Aeroporto Carlos Prates. O piloto e um aluno ficaram feridos. Por pouco não ocorreu uma tragédia, pois a queda aconteceu a cerca de 30 metros do Anel Rodoviário
2014
Outubro
Um monomotor que havia partido do Aeroporto Carlos Prates precisou fazer pouso forçado entre Juatuba e Igarapé, na Grande BH. Três pessoas ficaram feridas
Outubro
Um helicóptero, que também havia decolado do Carlos Prates, caiu nas imediações de Juatuba, na Região Metropolitana de BH. As duas pessoas a bordo da aeronave foram socorridas.
Novembro
Outro avião de pequeno porte caiu sobre uma casa nas imediações do Aeroporto Carlos Prates. Duas pessoas ficaram feridas.
Dezembro
Um avião de pequeno porte caiu sobre a pista do Anel Rodoviário. O piloto não sofreu ferimentos graves e conseguiu sair da aeronave depois de receber socorro de uma Unidade do Samu
2015
Junho
Em 7 de junho, no último acidente aéreo com mortes na capital, o bimotor King Air prefixo PR-ABG caiu pouco depois de decolar, às 15h20, do aeroporto da Pampulha. Não houve vítimas em terra, mas os três ocupantes da aeronave morreram na hora.