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Estado de Minas

Monumento tricentenário do patrimônio mineiro inicia obras de restauro

Muro de adobe que circunda o Mosteiro de Macaúbas, ícone de Minas e de Santa Luzia, passa por obra. Falta ainda recuperar a parte elétrica e retirar cupins do prédio, do século 18


postado em 25/04/2019 06:00 / atualizado em 25/04/2019 07:47

Depois da campanha Abrace Macaúbas, as irmãs conseguiram os recursos necessários para realizar a restauração do monumento tricentenário(foto: MARCOS IKEDA/ESP. EM)
Depois da campanha Abrace Macaúbas, as irmãs conseguiram os recursos necessários para realizar a restauração do monumento tricentenário (foto: MARCOS IKEDA/ESP. EM)
Uma das construções coloniais mais importantes do interior do Brasil, com história tricentenária, ganha proteção externa para o monumento que é ícone de Minas e de Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Começou esta semana a restauração do muro de adobe, do século 18, que circunda o Mosteiro de Macaúbas, na zona rural do município, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha).

Na manhã de ontem, a abadessa, madre Maria Imaculada de Jesus Hóstia, que leva adiante a campanha Abrace Macaúbas em parceria com a Associação Cultural Comunitária de Santa Luzia, mostrou o andamento dos serviços. “Estamos muito felizes, pois esse muro é fundamental para preservar esse patrimônio. A obra representa um presente de Páscoa”, disse a religiosa, ressaltando que ainda falta recuperar a parte elétrica e a descupinizacão do prédio. Depois de citar o incêndio da Catedral de Notre-Dame de Paris, alvo de muitos recursos para a reconstrução, ela pediu a ajuda de outros beneméritos brasileiros para a campanha que começou em 5 de setembro de 2017.

O restauro da estrutura de adobe, exemplar único na cidade, resulta do entendimento entre o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio do promotor de Justiça da comarca Marcos Paulo de Souza Miranda, a Prefeitura de Santa Luzia e um empreendedor luziense que vai custear os R$ 105 mil empregados na intervenção, com duração de três meses. No lançamento da campanha, foi assinado um termo de compromisso entre o MPMG e a municipalidade para garantir a intervenção.

TRÊS SÉCULOS
Conhecer o Mosteiro de Macaúbas, como é carinhosamente chamado o recolhimento das religiosas concepcionistas, representa experiência única: ali estão 16 freiras, roseiras para fazer vinho, muitas orações e trabalho duro. Na entrada principal, onde se lê a palavra clausura, vê-se em destaque a pintura de um personagem fundamental nesta história tricentenária: o eremita Félix da Costa, que veio da cidade de Penedo (AL), em 1708, pelo Rio São Francisco, na companhia de irmãos e sobrinhos.

Demorou três anos para chegar a Santa Luzia, onde construiu uma capela dedicada a Nossa Senhora da Conceição, de quem era devoto. Mas, antes disso, bem no encontro das águas do Velho Chico com o Rio das Velhas, na Barra do Guaicuí, em Várzea da Palma, Região Norte do estado, ele teve a visão de um monge com hábito branco, escapulário, manto azul e chapéu caído nas costas. “Ele se viu ali. Foi o ponto de partida para a fundação do Recolhimento de Macaúbas”, conta a madre superiora, explicando que o quadro e uma estátua de Félix da Costa foram feitos no século passado por uma irmã concepcionista.

No século 18, quando as ordens religiosas estavam proibidas de se instalar nas regiões de mineração por ordem da coroa portuguesa, para que o ouro e os diamantes não fossem desviados para a Igreja, havia apenas dois recolhimentos femininos em Minas: além de Macaúbas, em Chapada do Norte, no Vale do Jequitinhonha. Conforme os estudos, tais espaços recebiam mulheres de várias origens, as quais podiam solicitar reclusão definitiva ou passageira. Havia, portanto, uma complexidade e diversidade de tipos de reclusas, devido à falta de estabelecimentos específicos para suprir as necessidades delas. Assim, os locais abrigavam meninas e mulheres adultas, órfãs, pensionistas, devotas, algumas que se estabeleciam temporariamente, para “guardar a honra”, enquanto maridos e pais estavam ausentes da colônia, ou ainda como refúgio para aquelas consideradas desonradas pela sociedade da época.

Na época do recolhimento, Macaúbas recebeu figuras ilustres, como as filhas da escrava alforriada Chica da Silva, que vivia com o contratador de diamantes João Fernandes. A casa na qual Chica se hospedava fica ao lado do convento. Como parte do pagamento do dote das filhas, Fernandes mandou construir, entre 1767 e 1768, a chamada Ala do Serro, com mirante e 10 celas (quartos para as religiosas). Em 1770, o mestre de campo Ignácio Correa Pamplona assinou contrato para construir a ala da direita da sacristia (Retiro), igualmente dividida em celas. A construção tem ainda as alas da Imaculada Conceição, Félix da Costa (a mais antiga) e a de Santa Beatriz, onde se encontra o noviciado do mosteiro.

Em 1847, o recolhimento passou a funcionar também como colégio, tornando-se um dos mais tradicionais de Minas. Essa situação durou até as primeiras décadas do século 20, quando a escola entrou em decadência, devido à chegada de congregações religiosas europeias com grande experiência na educação de meninas. O tempo passou até que, em 1933, a construção passou a abrigar o mosteiro da Ordem da Imaculada Conceição.

Nessa história, um dos principais nomes é o da irmã Maria da Glória, que ficou mais de duas décadas doente sobre uma cama e morreu em 21 de janeiro de 1986. Muitos católicos atribuem à intercessão da freira diversas graças alcançadas. Em 1965, a extinta revista O Cruzeiro, dos Diários Associados, documentou momentos do cotidiano no mosteiro: as irmãs lavando roupas ou caminhando pelo pátio e a imponente construção colonial em meio ao coqueiral. Muito tempo depois, o Estado de Minas registrou a irmã Maria da Glória, enferma, acompanhada de outra religiosa.

Muro tem terra de formigueiro


O serviço de restauração está a cargo do Instituto Yara Tupynambá, que no momento trabalha com mão de obra local na produção de cerca de 1,2 mil tijolos de adobe artesanais para 150 metros lineares da estrutura. “Usamos o sistema construtivo da época, com barro, capim e terra de formigueiro”, conta o presidente da entidade, José Theobaldo Júnior. “Há partes muito danificadas, outras faltando os tijolos. No final, vamos revestir, com reboco natural, toda a superfície do muro”, explicou.

Para garantir a segurança da equipe e o sucesso da empreitada, os trabalhadores passam por treinamento e capacitação profissional, além de aprender técnicas de prevenção contra incêndio. O secretário de Cultura de Santa Luzia, Ulisses Brasileiro, apoia a iniciativa e lembra que se trata de uma reivindicação antiga da comunidade luziense, e que outros projetos de preservação estão nos planos da atual administração.

Já o presidente da Associação Cultural Comunitária de Santa Luzia, Adalberto Mateus, destaca a imponência da construção. “Trata-se de um muro de adobe assentado sobre um grande alicerce de pedras encaixadas e com acabamento na cobertura em beira-seveira – exemplar único na cidade. Sem dúvidas, é um importante testemunho das técnicas construtivas do período colonial e que ajuda a contar a nossa história”, destacou.

 

Enquanto isso...

…Passeio a Macaúbas

 Um grupo de 38 idosos visita hoje o Mosteiro de Macaúbas, em Santa Luzia, numa iniciativa da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), via programa Vida Ativa da Secretaria Municipal de Esportes e Lazer. Os integrantes do projeto Alegria de Viver são do Lar Dona Paula, no Bairro Padre Eustáquio, na Região Noroeste da capital. Nos dois passeios anteriores, turmas do Abrigo Frei Otto e do Núcleo Cras Vila Apolônia estiveram no Instituto Inhotim, em Brumadinho, enquanto outra do Lar Recanto da Saudade e do Núcleo Vista Alegre estiveram no Museu de Artes e Ofícios. Segundo os organizadores, o objetivo é proporcionar passeios em atrações turísticas e culturais a 1,6 mil pessoas residentes em instituições de longa permanência para idosos.

 

Memória

Termo de compromisso

A campanha Abrace Macaúbas foi lançada em 5/9/2017, em Santa Luzia, na Grande BH, para salvar da deterioração o tricentenário Mosteiro de Nossa Senhora da Conceição de Macaúbas. Durante a cerimônia na Sala da Capítulo Conventual da instituição, foi firmado um termo de compromisso entre a Prefeitura de Santa Luzia e o Ministério Público de Minas Gerais, que garantiu recursos para recuperação do muro que circunda o prédio de 11 mil metros quadrados. Outra providência ficou a cargo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), quanto à descupinização do prédio colonial tombado pelo Iphan, Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha) e município.


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