A epidemia de dengue em Belo Horizonte expõe os dois lados de um mesmo desafio: de um lado, a proliferação descontrolada do mosquito transmissor, o Aedes aegypti; de outro, a superlotação em unidades de saúde, que obriga à abertura de novas estruturas e a busca de reforços para socorro aos doentes.
Na ponta do socorro às vítimas do mosquito, ontem, primeiro dia da parceria entre município e estado para reforço nos trabalhos do Centro de Atendimento para Dengue (CAD) do Barreiro, a atuação conjunta de médicos civis e da Polícia Militar ainda não estava afinada. Com uniformes brancos, os militares chamavam atenção na unidade e aguardavam serem demandados. Em nota, a Polícia Militar (PM) informou que ampliaria a capacidade de atendimento da unidade em 180 pessoas por dia, o que foi negado pela subsecretária municipal de Saúde, Taciana Magalhães, ao afirmar que a parceria apenas “agilizaria” o atendimento.
Segundo a secretaria, a capacidade para o CAD Barreiro é de 150 pessoas por dia. No entanto, no primeiro dia de funcionamento da unidade foram atendidas 180. “Se houver demanda será atendida”, garantiu Taciana Magalhães, ao ser questionada se a presença dos militares ampliaria a capacidade da unidade.
Ao todo são 16 médicos civis no CAD Barreiro. Com a chegada dos militares, o contingente passa para 26, que se revezam ao longo de todo o dia, das 7h às 18h, e durante toda a semana, de segunda a domingo. Na manhã de ontem, dois médicos militares reforçaram a equipe da Secretaria de Saúde, formada por dois médicos civis, três enfermeiros e quatro técnicos de enfermagem.
A subsecretária destacou o número total de profissionais de saúde no reforço feito pela Prefeitura de BH: de 11 a 30 de abril, foram designados 304 médicos para os CADs e centros de saúde da capital, sendo 125 médicos. Parte deles está vinculada a contrato temporário, renovado de seis em seis meses até o limite de dois anos e meio.
HOSPITAL DE CAMPANHA A PM leva o hospital de campanha para o CAD Barreiro até o dia 30. “A Polícia Militar é parceira nessa guerra que estamos vivendo contra a dengue”, afirmou o major Flávio Santiago, porta-voz da corporação. Foram escalados para atuar na unidade 10 médicos militares (sete clínicos gerais e dois pediatras) e também colocadas à disposição duas ambulâncias da corporação. “Vivemos uma guerra contra a dengue em Minas Gerais. Nesse período, a doença aumentou de forma drástica”, completou o oficial.
Os militares vão se revezar no atendimento. “Por que o Hospital de Campanha? A Polícia Militar entra em defesa da sociedade em toda guerra. Campanha, porque temos capacidade por sermos militares de fazer planejamento, inclusive levando policiais a lugares inóspitos, como Brumadinho, onde os nossos médicos atenderam também”, afirmou o major Santiago.
Nos CADs, os pacientes podem fazer o diagnóstico da doença com a realização de exames clínico e de sangue, e recebem tratamento, com hidratação oral e venosa. Quem vem sofrendo com os sintomas da dengue comemorou o reforço dos militares. “É muito bom poder ajudar. Nunca é demais”, afirmou o eletricista José Roberto da Cruz, de 76 anos, com suspeita de dengue, que recebia hidratação oral. “Passei muito mal a noite passada, com febre alta, dor no corpo e calafrio”, contou. A mesma avaliação positiva em relação à presença militar foi feita pela dona de casa Maria do Socorro da Conceição da Costa, de 67, com manchas vermelhas por todo o corpo e queixando-se de dor de cabeça e nas costas.
Paraíso para o Aedes
Ao lado do reforço no atendimento, o combate ao mosquito causador da dengue, o Aedes aegypti, é imprescindível para evitar que o atual inimigo público número 1 faça novas vítimas. Batalha que é dificultada por estruturas que propiciam a reprodução do inseto, como a caçamba deixada no local conhecido como Mirante da Caixa-d’Água, no alto do Bairro Mangabeiras, na Região Centro-Sul da capital. Além de aberto, o equipamento para recolhimento de entulho traz uma lona preta, que, pela fragilidade, não serve para evitar que fique cheia de água até a borda. Nas proximidades há uma obra de calçamento.
Alertada sobre a situação, a prefeitura, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, assegurou que a equipe de Controle de Zoonoses da Regional Centro-Sul será comunicada para tomar as providências necessárias. Quanto às ações no dia a dia, a pasta informou que a cidade tem cerca de 1,5 mil agentes de combate a endemias. “Somente neste ano foram feitas 1.107.400 vistorias, e no ano passado mais de 4,8 milhões, cumprindo a meta definida pelo Ministério da Saúde de cinco visitas domiciliares por ano em cada endereço programado no combate ao Aedes. Nos últimos três anos foram 10.882.414 vistorias”.
Em mutirões de limpeza foram recolhidos 495,1 mil quilos de materiais descartáveis que servem como foco do mosquito nos últimos três anos, 99,4 mil somente em 2019. Para combater o mosquito na fase adulta foi aplicado inseticida em mais de 32 mil imóveis no período de 2017 a 2019. As ações de aplicação de UBV, conhecido como fumacê, já atingiram 773 quarteirões.
As ações de entrada forçada em imóveis em situação de abandono foram feitas em 64 locais de 2017 a 2019. Após cumprir rito de tentar localizar o proprietário por notificações e avisos formais, a PBH entra com ajuda de um chaveiro e faz o recolhimento dos focos do mosquito, aplica larvicida e multa o dono do imóvel. Na tentativa de encontrar os proprietários em horários alternados foram realizadas 1,7 mil ações de agendamento noturno para as vistorias da zoonose, nos últimos três anos.
As visitas dos agentes de combate a endemias também são realizadas por solicitações de Serviço de Atendimento ao Cidadão, sendo 6.584 desde 2017. “Carros abandonados nas ruas também servem como grandes reservatórios para o mosquito transmissor. Nos últimos três anos foram feitas 8,2 mil vistorias em carcaças em parceria com a Subsecretaria de Fiscalizações, da Secretaria Municipal de Política Urbana”, informou a PBH.