Os custos com a paralisação de atividades, perda de empregos, redução de arrecadação e medo trazido pela crise por que passa o setor de mineração e barragens agora traz prejuízo direto ao contribuinte mineiro, além de risco ao meio ambiente.
As formas construtivas e a situação de estabilidade das estruturas de retenção de rejeitos, abandonadas pela mineradora em 2012, são desconhecidas. Outro agravante é que os reservatórios se encontram a apenas 2,5 quilômetros de vales que desembocam no Rio das Velhas, o principal manancial de abastecimento da Grande BH. Caso atinja esse curso hídrico, os detritos tóxicos teriam de percorrer apenas 7,5 quilômetros até chegar à Estação de Tratamento de Água de Bela Fama, em Honório Bicalho, em Nova Lima, onde a Copasa capta cerca de 60% da água consumida por Belo Horizonte e perto de 50% do que é utilizado para matar a sede da Grande BH.
De acordo com a Copasa, as obras para o descomissionamento das barragens 1 e 2 da Mina do Engenho D’água foram licitadas e estão em andamento. Já há operários e técnicos trabalhando no terreno da Mina Engenho D’Água e foi iniciada a montagem de uma estação de tratamento de água (ETA) pré-fabricada, com capacidade para tratar até 40 litros de rejeitos por segundo. “Esses trabalhos (de instalação da ETA) estão previstos para ser concluídos nesta semana e na próxima será iniciado o tratamento dos rejeitos”, informou a companhia de abastecimento e tratamento de água, por meio de nota.
Paralelamente a essas ações, a Copasa informou que está dotando os barramentos de instrumentação geotécnica necessária para monitorar a estabilidade das estruturas abandonadas há sete anos. “Estão sendo instalados piezômetros e inclinômetros para monitoramento do maciço, além de iniciados os trabalhos de tratamento das encostas. O empreendimento envolve recursos de R$ 7,8 milhões, que estão sendo aplicados no tratamento dos rejeitos, no envelopamento dos resíduos, na drenagem de área, na revegetação da área, entre outros serviços. A previsão para conclusão é de 10 meses”, informou a companhia.
Em evento do gabinete de crise da sociedade civil, instituído para agir e cobrar ações no contexto da crise deflagrada após o rompimento das barragens 1, 4 e 4A da Mina Córrego do Feijão, operadas pela mineradora Vale, em Brumadinho, na Grande BH, ambientalistas demonstraram extrema preocupação com a situação dessas represas de rejeitos de Rio Acima.
A área, no Alto Velhas, é onde estão as águas de melhor qualidade do rio, segundo o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, Marcus Vinícius Polignano. “Há um conjunto de barramentos nas cabeceiras dos rios nessa região. No caso da Mundo Mineração, ainda temos um agravante de a Copasa estar investindo milhões, e estamos vivendo uma insegurança hídrica absurda. Não há um plano de contingência se ocorrer o rompimento durante o descomissionamento. Como fica isso? Teremos de esperar romper para agir? Nada tem sido dito e essa situação afeta as pessoas, afeta diretamente o abastecimento”, alerta.
Desde março, o Estado de Minas questiona a Copasa sobre que resultados os estudos pagos pela empresa apontaram sobre os tipos de resíduos químicos depositados nas barragens abandonadas de Rio Acima, e se parte desse material vazou, atingindo mananciais ou lençóis subterrâneos. Contudo, tais questões têm sido simplesmente ignoradas. O silêncio é criticado pelo presidente do comitê de bacia do Velhas. “Precisamos de ações do poder público. Precisamos saber o que há dentro dessas barragens. Há arsênio? Há mercúrio?”, indaga Polignano, citando elementos tóxicos comumente usados na mineração de ouro.
Para o engenheiro Euler Cruz, do Fórum Permanente do Rio São Francisco, em cuja bacia se insere o Rio das Velhas, a situação é de uma gravidade muitas vezes subestimada. “Mesmo as barragens consideradas estáveis podem se romper, como todas as que se romperam assim eram consideradas. Imaginem o problema que representam essas barragens da Mundo Mineração, que estão sobre o Rio das Velhas. São estruturas de alto risco e alto potencial de dano socioambiental no estado”, alerta.
Enquanto isso...
...Nova captação no Rio Paraopeba
Em meio à preocupação sobre os riscos ao abastecimento de água na Região Metropolitana de Belo Horizonte, a mineradora Vale concordou com projeto de construção de nova captação no Rio Paraopeba para abastecer a Grande BH. O acordo foi firmado na noite de ontem, entre representantes da mineradora e do Ministério Público, Defensoria e Copasa, no Fórum Lafayette, na capital. De acordo com o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o novo ponto de captação deverá ser acima do ponto em que os resíduos liberados pelo rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, entram no curso d’água. A previsão é de que a obra fique pronta em setembro de 2020. O estado ficou com a responsabilidade de apressar autorizações e licenciamentos para a intervenção. Desde 25 de janeiro, dia do rompimento da represa de rejeitos, foi suspensa a retirada de água no rio para abastecimento da população.
Do sonho dourado ao pesadelo
Saiba como a estração de ouro da Mundo Mineração, que promteia lucro, se transformou em herança de medo
Promessa de riqueza
2004
» A australiana Mundo Mineração se instala na Mina do Engenho D’Água, em Rio Acima, Região Metropolitana de BH, para minerar ouro no Vale do Rio das Velhas. Em sua composição no Brasil, conta com diretores locais e australianos
Dificuldades e esperança
Junho de 2010
» Diretor da Mundo Mineração, Barry Eldridge relata aos acionistas que a mina atravessa “desafios gerenciais e operacionais nos últimos cinco anos”. Porém, demonstra grande esperança de “salvar o empreendimento” com a operação de duas novas minas, chamadas “Crista” e “Olhos”
Um parque no caminho
Julho de 2010
» Barry Eldridge se mostra confiante com as duas novas minas, mesmo com a demarcação da área do Parque Nacional do Gandarela podendo englobar o empreendimento. “Com a iminente resolução da questão do parque nacional no Brasil, isso permitirá o imediato desenvolvimento da lavra aberta de Crista e aumento da exploração nas áreas de satélites do norte, como Olhos, onde a perfuração começará nos próximos meses”, relata.
Atrasos para novas minas
Agosto de 2011
» Todos os licenciamentos de minas são suspensos na região até a definição do território do parque nacional
Esperança renovada
9 de novembro de 2011
» Demarcação do parque deixa fora a área da Mundo Mineração. Executivos comemoram assinatura de termo de compromisso com o governo mineiro para recomeçar o licenciamento da Mina de Crista
Na corda bamba
11 de novembro de 2011
» Informe a acionistas demonstra a necessidade de refinanciar dívidas com quatro bancos credores brasileiros. A mineradora deve R$ 14,4 milhões. A saída sinalizada pelos diretores seria vender equipamentos e estruturas da Mina Engenho D’Água e recuperar investimentos com a exploração em Crista e Olhos
Burocracia emperra negócio
29 de novembro de 2011
» Informe pessimista alerta acionistas de que os licenciamentos das minas novas dificilmente sairiam antes de fevereiro de 2012. “Apesar do acordo alcançado com o governo, novas exigências continuam aparecendo por parte de funcionários públicos, o que se prova extremamente frustrante”, informa relatório da empresa
Sufoco financeiro
16 de dezembro de 2011
» Diretores afirmam que, mesmo chegando a acordo com dois bancos, outro credor não aceita os termos. Saída seria a recuperação judicial
Sozinha no Brasil
13 de março de 2012
» Diretores buscam auxílio na matriz Australiana para pagamento de credores, dando como garantias as remessas feitas para a Oceania e a produção na América do Sul. Australianos rejeitam a solução. A mina na Grande BH já se encontra abandonada. Com capital que não passa de R$ 190 mil, a mineradora brasileira entra em falência
Fim da Mundo Mineração
14 de setembro de 2012
» Empresa muda de nome no mercado exterior. Passa a se chamar Minera Gold Limited e concentra suas atividades no Chile (cobre), Peru (ouro) e Equador (ouro)
Ordem de recuperação
28 de março de 2016
» Justiça Federal em Minas Gerais determina que a massa falida da Mundo Mineração e sua subsidiária Minera Gold recomponham a paisagem na área da mina abandonada e suas barragens. Nada é feito, mas a Justiça e o poder público têm dificuldade de acionar os responsáveis pelo empreendimento
Novos Planos
18 de julho de 2017
» A Titan Minerals, da Austrália, incorpora a Minera Gold Limited e passa a ter como prioridade a extração de ouro no sul do Peru, em Torrecillas. Na Grande BH ficou o passivo do território de mineração abandonado, assim como as duas barragens com efluentes tóxicos que ameaçam o abastecimento de água para a Região Metropolitana (foto)
Fonte: Histórico de informes a acionistas da Titan Minerals