Foi uma operação de guerra: dois guindastes, agentes da BHTrans para monitorar o trânsito de madrugada e muita expectativa para instalar dois vagões de madeira no pátio da Casa do Conde, na Praça Rui Barbosa (Estação), no Centro de Belo Horizonte. Já na tarde de ontem, a superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Célia Corsino, se orgulhava ao ver as partes de composições ferroviárias diferentes, ambas do início do século passado, sobre os trilhos preparados especialmente para elas.
“Estamos esperando há três anos para essa transferência se concretizar, mas valeu a pena. São vagões muito bonitos, cheios de história e poderão ser visitados, por todos, no próximo semestre”, disse a superintendente do Iphan, autarquia federal que, com a Fundação Nacional de Arte (Funarte), ocupa o imponente casarão do início da construção da cidade. O conjunto pertenceu à antiga Estrada de Ferro Central do Brasil (EFCB), depois passou ao domínio da Rede Ferroviária Federal (RFFSA), extinta, e, em 2007, foi transferido ao Iphan, que, por lei, é o órgão guardião de todo o acervo ferroviário brasileiro.
Célia explicou que os dois vagões estavam no Bairro Horto, na Região Leste de BH, guardados na unidade da MRS – operadora de logística que administra uma malha de trens de carga em 1,6 mil quilômetros em Minas, Rio de Janeiro e São Paulo. “As negociações demoraram, mas deram tudo certo, pois (os vagões) já se encontram incorporados ao patrimônio do Iphan”, explicou. “Para trazer os vagões, durante a semana passada, ocorreu mesmo uma operação de guerra, pois um dos guindastes era de 30 toneladas”, contou Célia.
NO TEMPO Entrar nos vagões é como fazer uma viagem no tempo, e mesmo quem passa no Viaduto da Floresta pode ver os dois “monumentos” estacionados no pátio e formando um conjunto que valoriza a Praça da Estação. A poucos metros dos recém-chegados, está uma máquina a vapor do século 18, chamando a atenção pela conservação e beleza. “Os vagões estão sujos, mas muito bem preservados”, mostrou Célia com entusiasmo e imaginando futuros projetos.
As próximas etapas, adiantou, vão envolver a construção de coberturas de proteção, limpeza, restauro e de jardins ao redor. Como se encontram posicionados no fundo de um prédio particular |(igreja evangélica) virado para a Avenida do Contorno, as charmosas referências ferroviárias do início do século 20 vão ganhar uma “paisagem mineira”. Segundo a superintendente, a ideia é colocar bâneres cobrindo a fachada dos fundos, de forma que os visitantes olhem pela janela e se sintam no trecho.
“Vamos buscar recursos e já há uma organização não-governamental ligada à preservação ferroviária interessada na restauração. Entre os concursados que estão chegando ao Iphan, há um especialista do setor, o que será muito importante neste trabalho”, disse a superintendente convidando a equipe do Estado de Minas a entrar e conhecer um pouco das peças do patrimônio ferroviário. “Vamos fazer um inventário e também um laudo sobre cada um deles.”
No primeiro vagão, é possível ver os camarotes, a sala de reuniões, com mesa e cadeiras, armários de madeira trabalhada, banheiro e cozinha. Um dos destaques está na varanda, na qual, destaca Célia, muitos políticos, em viagem pelo interior, faziam discursos antes e depois das eleições. No segundo, pode-se ver a data de 1917, e a indicação de que pertencia à Officina Norte EFCB. “Sem dúvida, é um conjunto importante para essa região da cidade, que, futuramente, será interligada, com passeios, para moradores e visitantes conheceram mais sobre nossa história”, afirmou.
Em abril, foi inaugurado o espaço ferroviário com 3,5 mil metros quadrados, que, durante 10 anos, foi alvo de intervenções com recursos federais. Localizado na Rua Januária, o antigo galpão foi restaurado pelo Iphan e vai sediar o Laboratório de Restauração de Bens Móveis e Arqueologia, fruto de parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a Associação Mineira das Cidades Históricas e outras instituições da área cultural.
Exposição vai ao interior
A exposição Iphan +80 anos, que conta a história da instituição federal de proteção ao patrimônio e está em cartaz na Casa do Conde, na Rua Januária, vai dar filhote. A partir de julho, ela será itinerante, ficando entre 40 e 50 dias em algumas cidades. O circuito começará por Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, seguindo para Conselheiro Lafaiete, na Região Central de Minas, e depois Delfim Moreira, no Sul do estado. No acervo, há peças, filmes, mesa digital e outros alusivos à trajetória do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.