A ação de máquinas e operários que destruíram barracões em construção e estruturas para cercamentos de lotes feitas por empresários, ontem, em uma área da União invadida no Bairro Olhos d’Água, foi apenas o primeiro capítulo de um desafio que promete se estender na Região do Barreiro, em Belo Horizonte. Uma grande operação montada pelas polícias Federal e Militar para garantir o cumprimento de decisão judicial deu início à liberação dos terrenos que são públicos, por estarem às margens de uma linha férrea. Mas há pelo menos três missões a serem cumpridas para concluir a desocupação: dos pontos de vista social, de demarcação – que inclui a apuração de denúncias de invasões promovidas também por empreendimentos imobiliários – e de manutenção do local livre de usos inadequados.
Leia Mais
Oficiais de Justiça fazem reintegração de posse de área no Bairro Olhos D'água, em BHBarão de Cocais: mineradora obtém direito de ocupar propriedades próximas a mina Talude de Barão de Cocais já se deslocou 2 metros neste anoJustiça suspende reintegração de posse em linha férrea no Olhos D'águaNo primeiro passo de todo esse processo, ontem bem cedo as primeiras máquinas entraram nos terrenos que margeiam a antiga linha férrea do ramal Ibirité, na localidade de Águas Claras, pertencente ao Bairro Olhos d’Água.
Um dos notificados foi a cozinheira Débora Cristina de Souza, de 26 anos, que está desempregada e mora com três filhos e um irmão há oito meses no local. “Eu morava no Bairro Vista do Sol, perto do São Gabriel (Região Nordeste de BH), e pagava aluguel. Mas fiquei sem condições de continuar pagando e por isso vim para cá.
Invasões de famílias e também de empresas
Enquanto a questão social se impõe como um desafio ainda sem solução à vista, o fato é que a invasão do terreno avançou ao longo dos anos, ao ponto de, do lado esquerdo da Rua Santa Rita, a linha férrea já nem existir mais em certos pontos. Ali, a ocupação está bem consolidada, inclusive com invasões praticadas por empresários, que cercaram terrenos com muros – que também foram derrubados ontem.
Uma das áreas que tiveram notificação de desocupação em 60 dias é ocupada pelo empresário José Onofre, dono de uma construtora. Ele disse que o objetivo de construir os muros para cercar o terreno foi evitar que as moradias avançassem, iniciativa que teria sido adotada por vários empresários que atuam no bairro.
Na parte onde os operários a serviço da operação derrubaram muros mais estruturados construídos por empresários, um oficial de Justiça envolvido na operação disse que havia dúvidas sobre a extensão da área invadida. Havia a possibilidade de que uma pequena parte de uma grande construção pertencente a um motel tivesse excedido a área legal, mas a informação não foi confirmada pela SPU.
Na outra ponta, área mais recente da ocupação, a construção de um grande empreendimento na BR-356 leva os ocupantes de baixa renda a questionar a aproximação com a linha férrea. De fato, uma cerca que pertence ao empreendimento foi colocada bem perto da linha e parte do canteiro de obras está colada no antigo ramal ferroviário.
Um dos moradores que tiveram destruídas as paredes que ainda estavam em construção denuncia que a ocupação sofreu ataques de pessoas não identificadas, encapuzadas, que quebraram e queimaram casas há duas semanas. A Polícia Militar informa que não teve conhecimento da ocorrência. “A gente sofreu pressão por estar logo atrás de um grande empreendimento de pessoas que têm dinheiro. Por isso as casas foram removidas tão rápido”, afirma o homem, que não quis se identificar.
MANUTENÇÃO O último desafio relacionado à região diz respeito à manutenção das áreas desocupadas. O delegado Humberto Brandão, que comandou a operação por parte da Polícia Federal, e o tenente-coronel André Domiciano, comandante do 5º Batalhão da Polícia Militar, disseram que estão previstas ações para garantir que o local não seja novamente invadido.
"Nas casas habitadas, os moradores estão sendo notificados para desocupar o imóvel em 60 dias, porque retornaremos para fazer a reintegração dessas áreas também. Assim que terminar a reintegração, a SPU vai cercar os lotes e o acesso à via”, diz o delegado, que faz parte do Núcleo de Operações da PF.