Jornal Estado de Minas

BHTrans vai enquadrar patinetes em BH: saiba o que pode mudar

- Foto: Arte EM

Com um desafio que se espalha a cada dia, deslocando-se entre carros, motos, ônibus, caminhões, bicicletas e pedestres, Belo Horizonte prepara um conjunto de regras que enquadre e discipline o fenômeno dos patinetes elétricos. Popularizados em calçadas, praças, ruas e avenidas da capital, os veículos movidos a energia elétrica se tornaram um elemento a mais para dividir espaço no conflito diário do trânsito. Com a ausência de normas ajustadas ao atual momento da cidade, chamam a atenção os acidentes, além das fraudes e vandalismo. De olho em exemplos de cidades que estão disciplinando o setor, como São Paulo, a BHTrans deve publicar em 20 dias um projeto a ser submetido a consulta pública antes de virar decreto.

O objetivo é primeiro receber sugestões da sociedade, para depois providenciar a regulamentação efetiva. Mas o presidente da BHTrans, Célio Freitas, já adianta que itens como uso de capacete e a circulação nas calçadas precisam ser debatidos em conjunto com outras regras, como velocidade e região da cidade em que o patinete deve ser liberado. Além da empresa que coordena as questões de trânsito e transportes em BH, foram convidados a participar do grupo que vai debater as novas normas a Guarda Municipal e a Secretaria Municipal de Política Urbana, em um contexto no qual os acidentes envolvendo o uso do veículo elétrico vêm chamando a atenção no Hospital de Pronto-Socorro João XXII, que desde o início do ano atendeu mais de 80 feridos em decorrência do uso de patinete, patins e skate, com destaque para o primeiro.

Célio Freitas diz que o objetivo da BHTrans não é implantar regras exageradas, mas sim complementos que tragam segurança. Sobre as calçadas, ele admite a possibilidade de circulação em locais menos movimentados, mas diz que é inviável em outros pontos. “Andar no quarteirão da Afonso Pena na Praça Sete não faz sentido permitir.
Mas isso também é algo que estará na consulta pública e a gente quer discutir. Tem lugares em que é preciso proibir? Em quais circunstâncias? Onde tem passageiros, pontos de ônibus e grande fluxo de pedestres, com certeza o uso é incompatível”, diz o presidente da BHTrans. Sobre capacete, ele avalia que a velocidade é um item importante na discussão e defende a consulta ao setor médico. “Se permitirmos uma velocidade grande no sistema viário, é preciso falar em capacete. Se formos pensar em velocidade menor, talvez não precise. Sobre isso vamos querer escutar especialistas”, diz ele.



O uso de capacete, entre outros equipamentos de proteção individual, é considerado imprescindível pelo diretor assistencial da Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig), o médico Marcelo Lopes Ribeiro. Enquanto regras específicas não são publicadas, vale resolução de 2013 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que se concentra mais nas bicicletas elétricas e permite circulação somente nas calçadas a no máximo 6km/h e nas ciclovias ou ciclofaixas a 20km/h.
Mas, na prática, há exemplos de pessoas conduzindo patinetes a até 30 km/h nas calçadas, segundo Ribeiro.

Essa situação contribui diretamente para um aumento no número de atendimentos no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII. Foram quatro atendimentos a acidentados em janeiro, quando os primeiros veículos desse tipo foram inaugurados na cidade. Esse total, que inclui feridos em patins e skates, mas com predominância dos veículos motorizados, triplicou em fevereiro, passando para 12, alcançou 18 em março e fechou abril com 40 atendimentos, o que gerou mobilização do hospital.

“O patinete atinge velocidade intensa e não tem equipamento de proteção individual, como uso de capacete, luva, cotoveleira. Para as pessoas andarem, é preciso que esses equipamentos sejam obrigatórios, pois as lesões reduzem gigantescamente quando existe o uso do EPI (equipamento de proteção individual)”, afirma Ribeiro.

O próprio médico testou o equipamento e confirmou as dificuldades, principalmente nas calçadas com terreno irregular. Ele afirma que chegou a sugerir à empresa Yellow, uma das duas que oferecem os patinetes em BH, que implementasse um sistema para liberar os veículos apenas com uma selfie tirada pelo usuário, mostrando o capacete e validando a informação com um QR Code, mas não obteve resposta. A boa notícia é que, depois de muita exposição sobre o tema, o médico apontou que entre 1º e 20 de maio ninguém deu entrada no João XXIII por acidente com patinete. De 21 a 31 de maio foram 11 casos relacionados a um conjunto de equipamentos, a maioria os veículos elétricos.


O exemplo de outras cidades


Em São Paulo, a prefeitura publicou decreto provisório proibindo a circulação em calçadas, estipulando velocidade máxima de 20km/h em ciclovias e ciclofaixas e permitindo a entrada nas ruas apenas naquelas vias com velocidade máxima de 40km/h. O uso do capacete é obrigatório e o decreto definitivo foi prometido para um prazo de 90 dias.
As empresas são obrigadas a recolher equipamentos estacionados em locais proibidos, mas, na semana passada, quando a prefeitura começou a fiscalização, 557 patinetes foram removidos em um dia pela administração paulistana. A empresa Grow, controladora da Yellow e da Grin, duas das principais fornecedoras do serviço, questionou o decreto e chegou a entrar na Justiça, mas o pedido de anulação foi negado.

As duas empresas controladas pela Grow fornecem os serviços também em BH. Além dos acidentes, outras situações chamam a atenção, como fraudes no uso desse meio de transporte. A reportagem do Estado de Minas já presenciou patinetes da Grin sendo usados sem propulsão elétrica, como se fossem patinetes convencionais, a partir de avarias feitas no sistema elétrico do veículo. Em um grupo de WhatsApp criado depois que viralizou um convite para uma corrida de patinetes na cidade – que acabou cancelado – mensagens prometiam um contato capaz de desbloquear veículos sem o pagamento pelo uso.

QUESTIONAMENTO Em nota, a Grow informou que a regulação dos patinetes é de competência federal e diz que o município pode estabelecer “certas regras para o credenciamento e fiscalização das empresas”. A controladora da Yellow e da Grin acrescenta que está em contato com autoridades municipais para colaborar no que for possível para a construção de uma regulamentação inteligente, que aumente a oferta de mobilidade segura na cidade. Sobre a segurança, a Grow informa que orienta seus clientes a usar capacete, manter sempre as duas mãos no guidom, respeitar os limites de velocidade e ser maior de 18 anos para usar o veículo elétrico.

A empresa também mantém uma lista de dicas (veja quadro) e orienta usuários a denunciar casos de vandalismo nos próprios aplicativos e para autoridades de segurança pública. Não foram informados dados relativos a depredação. A companhia se limitou a dizer que os patinetes são monitorados por GPS, o que já evitou situações indesejadas e levou à recuperação de equipamentos e à detenção de pessoas envolvidas.

 

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