A combinação entre afeto e alegria garante a qualidade de vida e, muitas vezes, a melhora de crianças que estão internadas no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na área hospitalar de Belo Horizonte. Em tratamento de doenças graves, incluindo oncológicas, elas tiveram ontem uma oportunidade a mais para sorrir, jogar bola e brincar como outras da mesma idade que não estão na mesma corrida pela saúde. Como uniforme para essa disputa especial, elas apresentaram batas customizadas feitas de camisas de times de futebol.
O Hospital das Clínicas recebeu a doação de 77 camisas de clubes, que foram recortadas e customizadas para colorir os dias de meninos e meninas no período de internação. “As crianças que estão aqui têm afastamento do sonho, da família. É importante trazermos esse ambiente de alegria para cá”, afirma a coordenadora do Centro de Terapia Intensiva do HC/UFMG, Adriane Sette, sobre a ala da pediatria.
Vestidos a caráter, meninos e meninas viveram ontem um dia de craques de futebol, entrando em campo com uniformes dos times que fazem bater mais forte milhares de corações. Além da substituição das batas brancas pelas cores de times tradicionais, o ambiente foi decorado de modo que as crianças tivessem a mesma sensação de quem está nos estádios. Com direito a narração, feita pela jornalista e funcionária do HC Maria Valdirene Martins, de 49 anos.
Para a data especial, o setor de Pediatria recebeu painel com a imagem do público que lota as arquibancadas. O que não faltou para esses jogadores, que disputam uma partida pela vida, foi torcida. Todos estavam ali para fazê-los brilhar, incluindo um time de pais, mães, médicos e enfermeiros. “Fazemos tudo em prol da felicidade dos meninos e meninas”, diz a jornalista que se inspirou em narradores famosos para apresentar a turma. A narração teve direito a inspiração no estilo de Mário Henrique Caixa, que transmite jogos do Atlético Mineiro, Alberto Rodrigues, do Cruzeiro, e Ênio Lima, do América.
As camisas foram doadas pelo presidente do Instituto Palestra Itália, Sérgio Santos Rodrigues, dono de acervo pessoal com camisas oficiais de diversos times adquiridas ao longo do tempo em que trabalhou no Cruzeiro. “Pensei em dar para os meus filhos. Mas é bacana demais conseguir distribuir para mais crianças”, contou. Ele se inspirou em ação realizada em hospital infantil na Espanha que recebeu camisas do craque Lionel Messi.
O servente Cleiton Soares, de 29 anos, entrou no clima da brincadeira com a filha Vitória Emanuelly, de 4. Logo depois que nasceu, a menina ficou internada por um ano na unidade, à qual retorna quando tem alguma complicação. “É muito bom. A gente se descontrai. Às vezes, vemos nossos filhos chorando. Nesses momentos de felicidade, a gente esquece tudo. Só vemos a alegria deles, que contagia”, diz o pai da pequena, que vestiu a camisa do América mineiro.
O momento resgatou uma das paixões do adolescente Luiz Henrique da Silva, de 14, que está em tratamento. O diagnóstico de um osteosarcoma, tumor que acomete os ossos, veio em atendimento depois de um tombo quando jogava futebol na escola. Com a camisa do Cruzeiro, seu time do coração, o estudante, que fez cirurgia para retirada do tumor, sonha com o dia em que poderá voltar aos campos. “Se Deus quiser vou voltar”, diz o menino que tem como ídolo o jogador celeste Thiago Neves. A mãe comemorou o fato de a atividade ter “tirado a tristeza do rosto” das crianças. “É muito bacana. Veja a alegria das crianças”, reforçou Luiz Henrique da Silva Borges, também de 14.
Efeito terapêutico
A ala da Pediatria do HC recebe crianças com doenças graves e oncológicas. Muitas passam muitos meses internadas. “Somos um hospital de alta complexidade. São tratamentos pesados. Por isso fazemos de tudo para humanizar a passagem deles por aqui. Torná-la menos estressante”, afirma a diretora-geral, Andrea Maria Silveira.
Os efeitos terapêuticos da alegria na evolução dos pacientes são comprovados. “Não há medicamentos que tenham o efeito equivalente a momentos como este. A dança do pai com a filha no colo é emocionante”, diz a médica Adriane. Ela se referia a Cleiton e à filha Vitória Emanuelly, que dançavam ao som da música Partida de futebol, do Skank. “A música e o afeto são medicamentos poderosos e não têm efeito colateral”, completa.